Os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) apontam que os autocarros em Cabo Verde somaram quase 4,9 milhões de passageiros no terceiro trimestre de 2022.
Segundo o INE, em nove meses de 2022, os autocarros transportaram 15.686.201 passageiros em Cabo Verde, essencialmente nas duas maiores cidades do arquipélago, Praia e Mindelo.
“No 3º trimestre de 2022, o número de passageiros transportados nos autocarros em Cabo Verde, aumentou 1,5% em relação ao igual período do ano de 2021. Em termos absolutos, nesse mesmo período, registaram-se 4.862.666 passageiros transportados nos autocarros em Cabo Verde, 72.011 passageiros transportados a mais do que em igual período do ano de 2021”, lê-se no relatório do INE sobre estatísticas dos transportes, 3º trimestre 2022.
Os dados apontam que no 3º trimestre de 2022, a extensão de percursos de autocarros em Cabo Verde aumentou 23,8% em relação a igual período do ano de 2021. O número de lugares oferecidos (passageiros sentados ou em pé), aumentou 0,4%, em relação a igual período do ano de 2021.
Numa ronda pela Cidade da Praia, o Expresso das Ilhas abordou vários passageiros dos transportes coletivos urbanos a fim de conhecer a realidade que enfrentam todos os dias nas suas viagens urbanas para cumprir os compromissos do dia.
Reclamações
Numa paragem de autocarro na zona de Fazenda, um dos maiores pontos de ligação entre os bairros da capital, abordámos um grupo de estudantes universitários que estavam à espera do transporte, aparentemente apreensivos porque o autocarro de que precisam para chegar à universidade chega “sempre atrasado” e lotado de passageiros.
“Os autocarros, sem excepção de nenhuma linha, ultimamente estão a deixar muito a desejar. Chegamos à paragem de autocarros e somente meia hora depois vem o único autocarro da linha 15 que, para piorar, chega sempre abarrotado de pessoas. Entendemos que na hora de ponta a situação é mesmo complicada”, relatou Eça Fernandes, um dos estudantes entrevistados.
Melissa, Arthur e Léo são três estudantes que confidenciam também algumas reclamações referentes ao serviço dos autocarros. Estes adolescentes contam que o que mais os incomoda nos autocarros é a falta de trocos e a demora nas paragens.
“Penso que, se aumentassem o número de autocarros, pelo menos nos horários de entrada e saída das escolas, isso ajudaria e muito. O horário de encerramento precisa ser melhor estipulado. Em algumas zonas as linhas são encerradas antes das 21 horas, o que se torna muito complicado para nós que dependemos dos autocarros, uma vez que optamos pelo cartão passe. Há também a questão da segurança, mas penso que se formos informado atempadamente, no caso de encerramento mais cedo, poderemos planear as nossas viagens e também proteger-nos da onda de criminalidade do país”, conta Arthur.
Na mesma situação, está Hélida Lopes, uma doméstica que trabalha na zona de Palmarejo Grande, que testemunhou a “injúria” que é conseguir um autocarro para chegar ao trabalho.
“Saio todos os dias de São Pedro, minha residência, já planeando chegar à zona de Fazenda com uma hora de antecedência, porque se chegar uma meia hora antes de o autocarro, linha 12, corro o risco de o encontrar lotado e ter que esperar mais meia hora, no mínimo, para o próximo chegar. É uma injúria todos os dias, se o autocarro demorar além do esperado ou chegar lotado, tenho que apanhar a linha 10 de autocarro, que passa perto da zona onde eu trabalho e completar o trajecto a pé para poder tentar chegar na hora”, testemunhou.
Qualidade de serviço
Na paragem de autocarro de Achada de Santo António, o terminal, alguns utentes, portadores de cartão passe de autocarro, avaliam negativamente a qualidade do serviço prestado pelos autocarros. A maioria dos utentes do transporte coletivo urbano estão insatisfeitos com a qualidade do serviço prestado. Ana Paula, doméstica de 46 anos, conta que não tem gostado do serviço prestado e que se sente refém do cartão passe.
“Eu considero a qualidade do serviço precária, começando pelo atraso excessivo dos autocarros. A falta de troco é a desculpa de todos os dias e ainda temos que lidar muitas vezes com a grosseria dos funcionários ao serem questionados. Por esses motivos é que considero o serviço precário, mas isso acontece porque não têm concorrência e sabem que não podemos pagar todos os dias por um táxi ou até mesmo pelos carros que fazem o mesmo serviço clandestinamente. Somos obrigados a carregar o passe por conta da falta de condições financeiras e assim nos tornamos refém dos autocarros”, avaliou.
Sónia Carvalho e Leandro, mãe e filho, ambos utentes e portadores do cartão passe, dizem que nas horas de ponta, é sempre mais complicado e em algumas situações tiveram que lidar com empurrões para garantir um lugar na viagem.
“No geral as viagens são tranquilas, mas como em todo o lugar, às vezes temos que lidar com pessoas de mau humor, no final do dia todos estamos stressados e algumas vezes acabam por haver desentendimentos entre passageiros e funcionários. Temos ainda que levar em conta que trabalhar com o público não é fácil, principalmente com os adolescentes. Na minha opinião a parte mais stressante acontece nos horários de saída e entrada das aulas. Somos conscientes de que o comportamento de algumas pessoas deixa muito a desejar. Eu considero o serviço razoável, tendo em conta que não depende só da empresa e dos funcionários, todos temos que colaborar”, disse.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1105 de 1 de Fevereiro de 2023.