A quarta-feira de Cinzas traz consigo a tradição de um prato especial, mas este ano muitos praienses enfrentam dificuldades para manter a tradição devido aos altos preços, especialmente do peixe seco.
Eurídice, residente na Praia, admite que não fez as compras para a refeição de Cinzas.
“Não há dinheiro. Por acaso o preço nem está assim tão exagerado, mas não há dinheiro. As verduras estão num preço super acessível, mas o peixe não está barato, o mais barato que podemos encontrar é por 1.300 escudos o quilo. Ir para o interior a comida de Cinzas, não é uma opção, até porque não tenho lá ninguém”.
Eurídice admite que, se o preço do peixe tivesse diminuído na Feira de Cinzas da Praia, poderia até comprar nem que fosse um quilo.
“O máximo que pude comprar foi o mel para comer com cuscuz porque se comprasse os ingredientes do prato de Cinzas ia afectar a minha compra para o resto do mês”, reflecte.
José também quer manter a tradição, mas sente o peso dos preços no bolso.
“Sim, vamos fazer a comida de Cinzas. As verduras estão num bom preço: mandioca e batata inglesa de terra. Compramos na Feira de Cinzas onde o preço é mais acessível que no mercado, mas o peixe mandamos vir da nossa ilha, Santo Antão”, diz.
Para Lena, a preocupação com o preço é ainda maior, já que tem uma família numerosa para alimentar.
“Eu quero fazer a comida de Cinzas, mas o peixe está muito caro. O mais barato que pudemos encontrar foi 1.300 escudos o quilo. O mel está entre 500, 600 e 700 escudos. Tenho muitos netos em casa, nem sequer posso carregá-los para levar para o interior comer Cinzas, então vamos fazer em casa. Mas em casa também somos muitas bocas e vamos gastar um bom bocado para fazer a comida de Cinzas”, conta.
Vendedoras falam em preços acessíveis, com excepção do peixe
A tradicional Feira de Cinzas da Câmara Municipal da Praia, que reúne comerciantes de várias regiões do país que encerra esta quarta-feira, oferece uma variedade de produtos frescos a preços acessíveis.
Cizina, rabidante da Cidade da Praia e vendedora de couve, participa pela primeira vez na Feira e tem boas expectativas para até o final do dia.
“Espero que os clientes apareçam, porque até agora a venda está mal. Espero que as pessoas venham para a feira e comprem. No ano passado não participei porque não sabia, mas este ano fizeram um convite para a inscrição, fiz e participo. A couve está a cinquenta escudos”, diz.
Maria, também da Cidade da Praia, que participa todos os anos, garante que as verduras estão num preço acessível a todos os bolsos.
“Tudo está barato, num bom preço e fresco. Estamos à espera apenas de clientes”, diz.
Segundo Maria, a cebola de terra está por 140 escudos o quilo, a batata do Fogo, 200 escudos; tomate, 100 escudos; mandioca, 200 escudos; banana-verde, 200 escudos; couve entre 100 e 120 escudos; repolho, 100 escudos; e cenoura de terra a 120 escudos.
“A papaia, que custava 300 escudos, estou a vender agora por 100 escudos o quilo”, exemplifica.
Segundo esta vendedora, este ano os produtos estão mais baratos relativamente ao ano passado.
“No ano passado não havia batata-de-terra e muitos produtos estavam mais caros, entre 140 e 160 escudos. Mas este ano, o produto mais caro é a batata-doce e o pimentão, o resto está tudo barato. Eu vendo frutas no mercado, mas todos os anos participo na Feira de Cinzas porque acho interessante, bonito e faço-o com todo o amor. Faço muito dinheiro e tudo que eu trago, graças a Deus, vende”, relata.
Ana, que vende peixe seco, está optimista, mas reconhece que os preços estão elevados devido à escassez do produto.
“O peixe está a custar entre 1.200 e 1.300 escudos o quilo porque este ano não há peixe. O mar esteve muito agitado e encontramos o peixe num preço mais elevado, por isso temos de vender assim. Mas o preço de verduras está mais baixo do que no ano passado e esperamos vender mais”, complementa.
Santinha veio da Ribeira Grande de Santiago e trouxe produtos tradicionais, como mel e calda de cana.
“Todos os anos participamos na feira e vendemos o mel a litro, bem como a calda, a 500 escudos. Trouxe cerca de 100 litros de mel, a mesma quantidade dos anos anteriores e costumo fazer um bom negócio aqui”, acrescenta.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1214 de 5 de Março de 2025.