Ao Expresso das Ilhas, o académico explicou que ter especialistas locais permite ao país integrar-se em redes internacionais, receber as tecnologias mais avançadas e formar a próxima geração de cientistas e profissionais qualificados.
Hugo Tavares apontou que a matemática não se limita a conceitos abstractos, estando presente em múltiplas actividades do quotidiano e em diversas profissões. “Se estiverem a ler isto num telemóvel ou num computador, estão a usar matemática. Toda a transmissão de informação na internet é feita com base em criptografia, que permite trocar mensagens em segurança. Cada pagamento com cartão de crédito online é seguro graças a métodos matemáticos que codificam os dados”, explicou.
O docente deu também exemplos da área da saúde, em que muitos matemáticos colaboram com médicos, por exemplo, estudando o fluxo sanguíneo e doenças cardiovasculares.
“Podemos testar medicamentos em simulações computacionais, usando modelos matemáticos, e ajudar no tratamento de pacientes reais sem recorrer a testes pouco éticos”, esclareceu.
Inserção internacional e redes colaborativas
Segundo o académico, ter bons matemáticos no país cria redes colaborativas com todo o mundo e permite receber o state of the art, ou seja, a melhor matemática e as melhores aplicações possíveis.
“Para ter acesso à melhor ciência, é preciso haver pessoas que consigam percebê-la e também produzi-la”, disse.
Nesse sentido, Hugo Tavares sublinhou a importância de formar cientistas locais para assegurar a continuidade.
“Só tendo bons cientistas e matemáticos num país é que se consegue formar a próxima geração. Boas pessoas geram outras pessoas ainda melhores, eventualmente”, afirmou.
Programas que motivam os jovens
Durante as Jornadas, o especialista incentivou os estudantes a perceberem que a matemática está presente em situações do dia-a-dia, desde nas antenas parabólicas e faróis de carros até à gestão de colheitas e operações financeiras básicas. “Pequenos exemplos ajudam os jovens a compreender que a matemática está em todo o lado. Pode ser aplicada para calcular juros, organizar vendas, gerir recursos e analisar dados em situações como pandemias”, afirmou.
Hugo Tavares salientou que programas como as Jornadas, promovidas pela Universidade de Cabo Verde, ajudam a quebrar preconceitos e a aproximar os alunos de experiências internacionais.
“Estes programas ajudam a pessoa a sair da sua bolha, comunicar com colegas e professores de outros países e perceber as aplicações reais da matemática.”
Matemática como motor de inovação
O académico sublinhou que a matemática é fundamental para lidar com os desafios modernos, como a inteligência artificial, a ciência de dados e a estatística aplicada.
“Cada vez mais, as equipas em empresas e instituições científicas incluem matemáticos. Para tratar grandes volumes de dados, criar modelos de previsão ou desenvolver tecnologias complexas, é indispensável o suporte teórico da matemática”, exemplificou.
Para consolidar o desenvolvimento, Hugo Tavares evidenciou a necessidade de investimento contínuo em educação e investigação.
“É importante trazer conferencistas internacionais, permitir que docentes viajem e investiguem, e incentivar a ida de mais cabo-verdianos para Portugal e vice-versa. Isto reforça a comunidade científica e coloca Cabo Verde no mapa mundial da matemática”, concluiu.
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Número de estudantes de Matemática cresce com incentivo do Governo
O curso de Matemática da Universidade de Cabo Verde (Uni-CV) tem registado um aumento no número de alunos, ultrapassando os 30 inscritos este ano, fruto de um incentivo do Governo que atribuiu bolsas a quem optasse pelo curso.
“Há um aumento porque o Governo de Cabo Verde fez este ano um incentivo ao atribuir bolsas. Temos constatado enormes lacunas no ensino, sobretudo entre os professores de matemática. Portanto, o Governo decidiu conceder bolsas a quem escolhesse este curso”, explicou aos jornalistas Robert Sousa, coordenador do programa “Vocações para a Matemática” da Uni-CV.
O coordenador reconheceu desafios na atracção de novos estudantes, principalmente devido a lacunas provenientes do ensino secundário.
“A maioria dos estudantes vem com falhas na preparação em matemática, mais concretamente nas áreas que estamos a trabalhar neste momento. Mas aos poucos começam a perceber que a matemática não é um bicho de sete cabeças; é apenas uma questão de a compreender e de entender que, sem a matemática, praticamente nada neste mundo se consegue entender na sua essência”, afirmou.
A Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCT) da Universidade de Cabo Verde realizou, entre os dias 1 e 3 de Setembro, as “Jornadas das Vocações para a Matemática”, no Campus do Palmarejo Grande. Integrado no programa “Vocações para a Matemática”, o evento visou promover a tutoria, a valorização e o estímulo ao estudo da matemática por meio de conferências, comunicações, mini-cursos, seminários e debates.
Organizadas para aprofundar temas científicos e incentivar o diálogo interdisciplinar, as Jornadas reuniram docentes, estudantes e investigadores em torno de metodologias participativas.
Ao longo de três dias, o programa incluiu conferências temáticas, comunicações de docentes e discentes, mini-cursos e seminários, estruturados para estimular o pensamento crítico, a colaboração e a autonomia de estudo.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1240 de 3 de Setembro de 2025.