Orlanda Amarílis, nascida no seio de uma família com tradição na literatura, foi membro da Academia Cultivar, tendo iniciado a sua carreira literária na Folha da Academia Certeza (1944-1945). Contista com preferência por histórias melancólicas protagonizadas por mulheres, são de sua autoria os titulos Cais de Sodré té Salamansa (1974), Ilhéu dos pássaros (1983) e A casa dos mastros (1989), todos editados em Portugal.
Já Johann Wolfgang von Goethe foi uma das mais importantes figuras da literatura alemã e do Romantismo europeu, entre finais do século XVIII e inícios do século XIX, tendo uma vasta obra composta de romances, peças de teatro, poemas, escritos autobiográfico e ainda reflexões teóricas nas áreas de arte, literatura e ciências naturais.
Sobre a escolha destes dois autores para a homenagem do Festival Literatura-Mundo do Sal, Filinto Elísio, da Rosa de Porcelana, uma das organizadoras do evento, explica ser Orlanda Amarílis uma escritora “muito marcante na trajectória da prosa cabo-verdiana” e que especialmente marca “com pleno direito a grande contribuição das mulheres nas letras cabo-vercadianas. Claro, esta contribuição é muito pouco conhecida mas há uma grande trajectória do feminino nas letras cabo-verdianas e Orlanda Amarílis é essa figura, por isso nós resolvemos este ano homenageá-la”.
Como já é tradição, a homenagem inclui um autor cabo-verdiano e um de outra nacionalidade. E este ano os organizadores escolheram, “por várias razões”, Goethe.
“Goethe é de Frankfurt”, diz Filinto Elísio lembrando a participação da Rosa de Porcelana na célebre Feira do Livro dessa cidade alemã, o ano passado. “Mas ele marca toda a referência de literatura alemã e o próprio conceito de literatura-mundo que ele criou. Achamos que fazia sentido que a homenagem internacional fosse Goethe. Também para sairmos um pouco desse registo de ter apenas autores lusófonos”.
Caberá ao antropólogo Manuel Brito-Semedo e à diretora do Goethe Institute Portugal, Susanne Sporrer, conduzir a sessão de elogios aos dois homenageados.
Curadoria científica
A grande novidade desta edição, conforme o editor da Rosa de Porcelana, é contar com a curadoria científica da professora e investigadora sãotomense Inocência Mata.
“Dada a ausência de José Luis Peixoto, que está neste momento a finalizar o seu novo romance, em torno de José Saramago”, explica, adiantando que será dado mais destaque à parte científica do evento do que à literária e a temática será mais centrada na ciência literária do que na arte literária.
O forte pendor científico do evento estará também reflectido na participação da Universidade de Cabo Verde, havendo a possibilidade de futuramente se criar na academia os Estudos de Literatura-Mundo.
O programa do evento tradicionalmente divide-se em conferências e paineis temáticos. As primeiras, nesta edição, terão como oradores Inocência Mata, com o tema “Literatura-Mundo Comparada: uma ponte para outras culturas e línguas”; Carlos Quiroga, que irá abordar “A suave pátria que cria a escrita ou o cânone dos afetos” e Jorge Tolentino, a versar sobre “Duas notas críticas sobre a Literatura Cabo-verdiana. Ou talvez três”.
Nos paineis com a participação de escritores, professores, investigadores e tradutores convidados, perfilam como temas Literaturas dos Países de Língua Portuguesa I - ensino e formação de leitores, Literaturas dos Países de Língua Portuguesa II – crítica e divulgação, Toda a literatura é universal?, Tradução, divulgação e circulação internacional, A língua da (minha) escrita: particularismo e pluriversalidade da língua de criação, Literatura (d) e resistência e ainda Literaturas em português no sistema-mundo.
Serão onze os participantes de Cabo Verde, entre escritores e professores cabo-verdianos, destacando-se a presença do veterano Osvaldo Osório e de Domingos Landim, vencedor do Grande Prémio Corsino Fortes – Prémio BCA de Literatura 2018. Outros 15 convidados oriundos da Alemanha, Angola, Brasil, Espanha, Moçambique, Nigéria, Portugal, São Tomé e Príncipe e Vietname abrilhantam o leque de participantes desta edição, que contará ainda na plateia “mais de uma dezena de interessados em literatura” que virão de várias universidades brasileiras assistir ao Festival de Literatura-Mundo do Sal.
Uma vez mais, caberá ao Presidente da República, o escritor Jorge Carlos Fonseca, a abertura do evento que acontece no auditório do Hotel Belorizonte, para além de actividades paralelas em outros pontos da ilha.
Tendo por patrono a Câmara Municipal do Sal, o FLMSal visa “consolidar a ilha do Sal como centralidade literária em Cabo Verde e inscrevê-la como Ilha Literária reconhecida internacionalmente, assim como promover a reflexão e o debate sobre o tema da Literatura-Mundo e, através de parcerias institucionais, circular e fazer dialogar autores e suas obras numa plataforma internacional”.
Texto originalmente publicado na edição impressa do expresso das ilhas nº 914 de 5 de Junho de 2019.