Mano Preto considerou positivo esses 31 anos de Raiz di Polon e falou dos projectos que a companhia tem feito ao longo desses anos. “O balanço é muito positivo com actividades intensas e esses anos passaram rápido. Começamos em 1991e de lá até 1997 foi quase uma preparação e participamos em dois grandes projectos internacionais”.
“A primeira com a Clara Andermatt e Paulo Rebelo que era para Lisboa Capital da Cultura, onde três bailarinos de Raiz di Polon foram seleccionados num leque de 80 bailarinos. Estivemos dois meses em São Vicente, depois fomos para Portugal conquistamos o prémio Madalena Perdigão da Fundação Calouste Gulbenkian”, conta.
Mano Preto conta que estiveram num segundo projecto chamado “CVSabe”, “o que nos deu muita bagagem em termos de aprendizagem da dança. De 1991 a 97 estivemos em vários projectos com formação, preparamos o grupo, pois em 1997 foi a nossa primeira saída para Portugal. Depois disso nunca mais paramos. Em 1997 entramos num outro projecto de Clara Andermatt com João Lucas que neste momento está a fazer uma homenagem ao Pantera e temos um bailarino lá”.
O bailarino confessa que durante esses anos foi quase entre treinamento, fazer peças e muita aprendizagem. “A partir de 2000 até 2008, antes da crise imobiliária não parávamos praticamente em Cabo Verde. Num período de oito anos estivemos em mais de 50 países e em mais de 100 cidades, foi intenso. Depois da crise imobiliária continuamos a fazer saídas pontuais, participámos em vários projectos, realizamos demos e recebemos formações, viajamos e realizamos muitos espectáculos, foi algo muito marcante.”
O fundador do Raiz di Polon recordou que já participaram em quase todas as edições do Festival Mindelact, e que também já foram homenageados neste evento. “E a nível internacional recebemos vários prémios e condecorações – destaco aqui o prémio Prestígio, na gala RDP África 25 anos, na Categoria Dança”.
Novos bailarinos
Mano Preto disse que Raiz di Polon tem estado a preparar bailarinos para dar continuidade aos trabalhos. “Esse trabalho tem sido automático, nós nos últimos espectáculos que realizamos em São Vicente, no âmbito do Festival Mindelact, tínhamos pessoas de quatro gerações. Isso é muito bom, porque há grupos que surgem e depois de algum tempo desaparecem. E nós temos estado a trabalhar na continuidade de Raiz di Polon”.
A dança em Cabo Verde
Para Mano Preto, a dança em Cabo Verde não está mal, mas que já esteve melhor.
“São Vicente teve um boom nos anos 80/90 que foi quase muito inspirador para todas as ilhas de Cabo Verde. Se temos uma dança organizada, acho que a ilha de São Vicente contribuiu muito para isso, temos que reconhecer”.
O bailarino confessou que começou a fazer dança um pouco influenciado pelos bailarinos de São Vicente, e deu exemplo de António Tavares “que é um grande mestre da dança”.
“Agora estamos com melhor qualidade na dança, como bailarino sinto que cresci muito e a companhia Raiz di Polon está a passar pela sua melhor fase, com bailarinos que já passaram dos 40 anos, então sinto que estamos com mais maturidade e com trabalhos com mais qualidade”.
Em termos de qualidade, disse que realizaram recentemente um workshop de dança ministrado pelo professor português da Escola Superior de Dança, João Fernandes. “Graças a uma parceria entre o Ministério da Cultura e Universidade de Cabo Verde e o Instituto Politécnico de Lisboa, tivemos que encerrar as inscrições porque houve muita procura, as pessoas querem fazer dança e há muitos bailarinos que fazem dança. Mas em termos de grupos organizados há poucos”.
Em relação a outros grupos, disse que sabe da existência de um projecto de dança que é o Freestyle, “em há neste momento muita procura. É um projecto com muita qualidade, que acontece todos os finais de mês, e fazem eventos no Palácio da Cultura Ildo Lobo. No ano passado fizemos um evento e foi incrível”.
“Cabo Verde nunca esteve com tanta base de ensino formal de dança. Sei que estão vários projectos em curso, e mesmo nas universidades estão a ser ensinado dança. Temos uma bailarina que foi para Portugal fazer medicina, mas acabou por fazer dança, há muitos jovens que estão a acreditar que a dança é uma profissão como as outras e isso é muito bom”.
Quanto aos apoios indicou os vários editais do Ministério da Cultura e da Câmara Municipal da Praia que têm ajudado nesse sentido. “O que é muito importante, acho que isso está a fazer muita diferença. Há também o programa Bolsa de Acesso à Cultura (BA- Cultura) onde muitas escolas de dança estão a ser apoiadas”.
Já a nível de apoio das empresas, quer públicas quer privadas considera que tem havido um decréscimo. “E ali acho que o Estado, as empresas e as instituições públicas devem reforçar ainda mais os apoios que têm estado a dar. E com o programa BA-Cultura, editais e projectos da CMP acho que daqui cinco anos teremos dança de qualidade e quantidade no mercado”.
Por outro lado, Mano Preto acredita que tem que haver um certo controlo nesta área, em termos de qualidade, pedagogia e que com a entrada da formalização do ensino nas universidades e nas escolas será possível melhorar. “Então a perspectiva é muito boa, pois os bailarinos passam por muitas dificuldades”.
O bailarino sublinhou que precisam de mais espaços para ensaio. Conforme indicou, a falta de espaços de ensaios, neste momento é o grande calcanhar de Aquiles. “Temos também que incentivar as pessoas, nós que temos mais experiência, porque espaços para dança é fácil de criar e podes até ensaiar sem som. É nessa parte que acho que se deve melhorar”.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1063 de 13 de Abril de 2022.