Pescas : Pescadores querem melhores embarcações. Armadores destacam progressos no sector

PorNuno Andrade Ferreira,13 fev 2021 9:05

Homens do mar renovam apelos. Associação de Armadores confiante no futuro.

“Estratégico”, “fundamental”. Estes são adjectivos habitualmente usados quando o tema é pescas em Cabo Verde. A consciência de que o oceano é a melhor hipótese de Cabo Verde obter riqueza a partir de recursos naturais não é de agora.

Da renovação da frota à melhoria das condições de trabalho, passando pelo aumento da capacidade de captura e processamento de pescado, a lista de desafios do sector pesqueiro está identificada há muito. Mais recentemente, a redução do stock nos bancos mais perto da costa impôs-se como nova preocupação dos homens do mar.

Em São Pedro, São Vicente, existem cerca de 45 embarcações de boca aberta para mais de 300 pescadores. Luís Andrade, presidente da Associação de Pescadores local explica que a falta de cardumes obriga os pescadores a sair à procura de outros bancos de pesca, muitas vezes para lá dos limites de segurança, arriscando a própria vida.

O líder associativo retoma um apelo antigo por apoios públicos que permitam a aquisição de embarcações mais seguras.

“Era útil termos uma embarcação com uma dimensão maior, 25 a 30 metros, onde se pode ir mais longe para pescar, podes levar mais pescadores. Seria mais útil para a associação ou para individuais, criar uma cooperativa ou sociedade. Seria útil para a nossa comunidade, porque são muitas embarcações de boca aberta e ficas no mesmo lugar. Precisamos de explorar outros recursos, noutros bancos, que nos levem a ficar mais dias no mar”, sublinha.

Em Tarrafal de Monte Trigo, no interior do concelho do Porto Novo, Santo Antão, o maior desafio prende-se com a conservação do pescado. Os 120 quilos de gelo, produzidos diariamente por uma única máquina, são insuficientes para as três dezenas de embarcações de boca aberta e três de pesca costeira da comunidade piscatória, que dão emprego directo a quase uma centena de pessoas, garantindo o sustento a muitas mais.

Izaires Pires, líder da Associação de Pescadores, refere numa situação “complicada”.

“A situação é mesmo complicada. Às vezes, os pescadores do Tarrafal com algum pescado têm que deslocar-se a Porto Novo ou fazer uma comunicação para que algumas empresas de gelo possam ir entregar gelo ao Tarrafal, o que já é muito custo. Às vezes, registam perda de pescado devido à falta de conservação. É uma situação muito complicada na comunidade”, alerta.

À semelhança dos pescadores de São Pedro, também os profissionais da pesca de Tarrafal de Monte Trigo esperam pela criação de condições para a aquisição de uma embarcação de maior porte.

“A melhor forma de resolver a questão dos postos de trabalho é tendo uma embarcação de pesca para mais ou menos vinte chefes de família”, sugere Izaires Pires.

No Maio, o principal problema é o mercado limitado, mas os pescadores também se queixam da alegada pesca em locais interditos, por parte de embarcações semi-industriais.

“O pouco pescado que tem aparecido dentro dos portos é apanhado pelos barcos semi-industriais. Há muita lei em Cabo Verde, mas na prática ninguém cumpre, porque é proibido o lançamento dentro de praia”, afirma Vitorino dos Reis, presidente da Associação de Pescadores.

Segurança

No âmbito das comemorações do Dia Nacional do Pescador, sexta-feira, 5 de Fevereiro, o governo entregou aos pescadores da ilha de São Nicolau um conjunto de kits de segurança. A tutela procura, assim, responder a outra reivindicação com vários anos. Foram entregues coletes salva-vidas, GPS, rádios VHF e reflectores de radar. Até final do ano deverão ser abrangidos todos os pescadores e botes do país.

O presidente da Associação de Pescadores de São Vicente, Luís Andrade, dá conta dos riscos corridos durante a faina, por falta de equipamentos adequados.

“Nenhuma embarcação aqui é equipada com a segurança exigida pelas autoridades. Nenhum pescador leva um colete, a maioria das embarcações não tem GPS. [Com os equipamentos adequados], se apanhas uma bruma seca não ficas à toa. Se tens uma sonda, ficas a saber se estás a passar por cima do cardume ou não. Nos últimos anos, Cabo Verde anda a registar o desaparecimento de muitas embarcações de boca aberta. Tens que arriscar a tua vida, porque não consegues pescar perto da costa. Tens que ir cinco a seis milhas e corres muitos riscos”, resume.

Os pescadores de Calheta de São Miguel, em Santiago, também enfrentam o mesmo problema, como explica Francisco Lopes, presidente da Associação de Pescadores e Peixeiras.

“Enfrentamos grandes dificuldades. Há uns três anos consegui entregar a quase todos os pescadores coletes salva-vida, através de uma parceria. Ficaram a faltar alguns pescadores, para que todos possam ter um colete”, comenta.

Armadores

Para o presidente da Associação dos Armadores de Pesca de Cabo Verde (APESC), João Lima, vários problemas crónicos já foram resolvidos e outros estão em vias de resolução.

“Temos em cima da mesa o investimento ao nível da melhoria das frotas. Estamos a trabalhar com o governo, através da Cooperativa [de armadores], para aquisição de um atuneiro pescador, com capacidade para 300 toneladas, para pescar nesta zona económica de Cabo Verde e não só”, avança.

Desenvolver a construção e reparação naval e capacitar os pescadores são outros eixos de acção.

“Estas são questões que há muitos anos estamos a discutir e temos estado a trabalhar com o Ministério da Economia Marítima para tentar, paulatinamente, ir resolvendo esses problemas”, diz João Lima, optimista.

Sobre o pedido de renovação do Acordo de Derrogação das Normas de Origens, entre Cabo Verde e a União Europeia, o responsável da APESC defende que a situação deve ser ultrapassada com um investimento na frota nacional e com o aumento da capacidade de armazenamento, tornando desnecessário o regime de excepção.

“É simples: produzir. Investir nos armadores, melhorar a frota, termos capacidade de captura e, mais importante, termos capacidade de armazenamento para podermos ter stock e fornecer as conserveiras, quando temos dificuldades de entrada de cardumes ou de captura, porque algumas espécies são migratórias”, estabelece.

João Lima recorda que a pesca é fundamental na estratégia de implementação da economia marítima.

*com Fretson Rocha

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1002 de 10 de Fevereiro de 2021. 

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Autoria:Nuno Andrade Ferreira,13 fev 2021 9:05

Editado porAndre Amaral  em  25 set 2021 23:20

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