Tanto a 64ª reunião da Comissão Regional Africana (CRA) da OMT, dia 2, como o segundo Fórum Global de Turismo para o Investimento em África, dia 3, estiveram de olhos postos no futuro. 21 ministros e cinco embaixadores juntaram-se a empresários e especialistas nacionais e internacionais, para um debate sobre o papel reservado a África no mercado global.
Presente no evento, o secretário-geral da OMT, Zurab Pololikashvili, deu o mote para a jornada, estabelecendo o vínculo entre turismo e desenvolvimento.
“O continente está unido na sua determinação de usar o poder do turismo para impulsionar o desenvolvimento e as oportunidades para todos. Com coordenação e investimento, o turismo africano pode finalmente realizar o seu potencial único”, referiu na abertura da reunião da CRA.
Os entraves à concretização do potencial africano estão identificados e passam muito por falta de infra-estruturas e conectividade.
Do lado de Cabo Verde, o vice primeiro-ministro e ministro das Finanças, Olavo Correia, está convencido que “sem investimento no turismo” dificilmente será possível vencer a pobreza e o desemprego. Também por isso, chama os privados ao centro do debate, esperando maior parceria e mais investimento, não só nas áreas tradicionais, como também nos processos de infra-estruturação e, de forma especial, na melhoria dos transportes.
“Os privados nacionais e os Estados de todos os nossos países estão convocados a trabalharem para que possamos resolver os problemas dos transportes no nosso continente e também em Cabo Verde”, frisou na intervenção que fez no Fórum de Investimento.
Já antes, o chefe de governo, Ulisses Correia e Silva, tinha evidenciado o papel do Estado na criação de um ambiente de negócios favorável.
“O investimento privado pode suprir muitos défices de infra-estruturação e criar mercado, desde que tenha um ambiente favorável, a nível de segurança jurídica, da protecção de investimentos, da regulação económica, financeira e técnica, da segurança de pessoas e bens e a nível de incentivos competitivos”, comentou na manhã de quinta-feira.
Foi também nessa ocasião que Zurab Pololikashvili afirmou ser necessário libertar todo o potencial multiplicador do turismo, garantindo o empenho da organização que dirige.
“Investimentos certos podem estimular o empreendedorismo, criar emprego e impulsionar a transformação verde do turismo, em África e no mundo”, expressou.
Mas porque a pandemia baralhou e complicou todas as contas, a vacinação contra a covid-19 esteve presente na agenda, a partir da ideia de que não há retoma sem protecção da população.
A cobertura vacinal africana continua longe de níveis considerados razoáveis, com pouco mais de 2% de população totalmente imunizada. A urgência da aceleração do processo foi tema unânime, destacado por Olavo Correia.
“Temos que conseguir, no continente africano, nos próximos meses, atingir a imunidade de grupo. É fundamental que todos os nossos países possam atingir esse patamar a nível da vacinação”, declarou.
O número dois do governo apelou a mais vacinas, a partir da ideia de que a segurança sanitária, quando em pandemia, é um assunto global, que exige respostas ao mesmo nível.
“Não podemos avançar para terceira dose de vacinação nos países desenvolvidos, quando muitos cidadãos africanos não conseguiram a primeira dose”, acrescentou.
A concretização da marca (ou das marcas) África e a importância da projecção da imagem de um continente seguro também cruzaram a jornada dupla, em Santa Maria.
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“Temos condições para reiniciar o nosso turismo”
Segurança sanitária, desenvolvimento sustentável, governança. Estes são os três pilares de futuro, em matéria de turismo, definidos pelo ministro da tutela, Carlos Santos.
“Nenhum turista, daqui para a frente, irá escolher o destino sem ter em conta a questão da segurança sanitária”, relembra.
“Não podemos almejar um crescimento do turismo, um turismo resiliente, cada vez mais de qualidade, se não pensarmos e não estruturarmos o nosso produto tendo como elemento central a sustentabilidade”, complementa.
Sobre a governança, o ministro do Turismo e Transportes ambiciona o reforço da parceria entre sector público e privados.
Carlos Santos também recorda que, como país pequeno, Cabo Verde deve apostar na diferenciação.
“Na apresentação daquilo que é só nosso, no nosso DNA, a nossa Cultura, a nossa gastronomia, o património ambiental que temos”, elucida.
A valorização do capital humano é entendida como “estratégica” para a contínua melhoria da actividade turística.
“Temos condições para reiniciar o nosso turismo. Todos juntos, poderemos fazer deste país um excelente destino, porque, ao fazê-lo, estaremos a alavancar outras actividades económicas, a diversificar a nossa economia”, deseja.
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“Há confiança dos investidores”
O presidente da Cabo Verde TradeInvest (CVTI) observa uma mudança de perfil de investimento em Cabo Verde. Para José Almada Dias, o país segue “o percurso normal”, com uma passagem da aposta em hotéis, para uma outra, em resorts.
“O turismo hoteleiro, digamos assim, é que cria o destino, mas há uma tendência, dos destinos turísticos, para além de hotéis, começarem a ter resorts, que são investimentos maiores e mais complexos”, explica.
Esta tendência, assinalada pelo responsável da agência responsável pela captação de investimento directo estrangeiro, acrescenta valor ao destino e revela a sua maturidade.
Almada Dias acredita que a pandemia não abalou a confiança dos investidores.
“As obras no Mindelo e mesmo em outros sítios só pararam naquele tempo que foi imposto por lei e reataram na segunda-feira seguinte. Isto mostra a confiança dos investidores em Cabo Verde, tanto internacionais como nacionais”, comenta.
Além do investimento externo, o presidente da CVTI indica a aposta reforçada do empresariado nacional, com a construção de unidades hoteleiras de dimensão média, dando como exemplos os hotéis Ouril (120 quartos) e Cruzeiro (70), em São Vicente.
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“Vai-se dar mais atenção à segurança”
O Presidente da Câmara de Turismo de Cabo Verde, Gualberto do Rosário, considera que “os fundamentos para se fazer turismo no mundo permanecem”. O líder associativo entende que as pessoas continuam disponíveis para visitar outros países e viver novas experiências, motivo pelo qual acredita que as mudanças trazidas pela pandemia são apenas conjunturais. O que muda é o peso da segurança na escolha do destino.
“Cerca de 40% dos turistas, antes da pandemia, davam muito valor à questão da segurança nas suas decisões de viagem. Hoje, praticamente, é o mundo todo. Vai-se dar mais atenção à segurança, de forma geral, e à segurança sanitária, em particular”, afiança.
Gualberto do Rosário entende que Cabo Verde deve apostar na diversificação turística e criar resiliência no sector, conquistando outros mercados emissores, para lá da Europa.
“Inclusive, o mercado africano, que embora pequeno, quando comparado com outros mercados mundiais, é importante para Cabo Verde. Mesmo os 5% do turismo de África [N.R.: peso no mercado global] representam muito para Cabo Verde”, sublinha.
O presidente da Câmara de Turismo vaticina uma mudança no tipo de turismo feito em Cabo Verde, para um modelo de circulação, com o turista a usufruir de diferentes experiências, em diferentes ilhas.
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“Estamos relativamente confiantes”
Um dos pioneiros do turismo em Cabo Verde, o grupo Oásis Atlântico continua a apostar em Cabo Verde. CEO do grupo desde 2017, Alexandre Abade tirou algumas lições da pandemia.
“Normalmente, não estamos à espera daquilo que não sabemos que vai acontecer. Portanto, a pandemia traz a lição de estar sempre preparado para algo que pode acontecer e que não é previsível que aconteça”, declara.
Durante o último ano e meio, a estratégia baseou-se na protecção do negócio.
“Claro que impacta a estratégia, porque se temos um ano e meio, praticamente, em que estamos parados, sem actividade, a despender recursos financeiros para manter um conjunto de postos de trabalho, a infra-estrutura hoteleira, etc., evidentemente que isso vai ter que ser recuperado mais à frente. Portanto, aquilo que é a perspectiva de investimento sustentado pelo próprio grupo tem que ser reajustada à realidade da pandemia”, assume.
Incorporar mais flexibilidade na gestão passou a ser imperativo, o que permite preparar a retoma, mas sem esquecer que pode ser necessário dar um passo atrás.
“Estamos relativamente confiantes de que já podemos ter ultrapassado o ponto mais negativo”, revela.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1032 de 8 de Setembro de 2021.