Negócios ao Sul

PorSara Almeida,14 mai 2023 8:59

Estão em todas as áreas, com destaque para o turismo. São muitos os empresários de origem europeia, em especial de Portugal, Espanha e Itália, que escolhem Cabo Verde para montar as suas empresas ou expandir os seus negócios, e fazer a sua vida. Vêm pela proximidade física, cambial e cultural, mas também pelas oportunidades. No âmbito do Dia da Europa, que se celebrou este 9 de Maio, fomos falar com alguns deles, ouvir as suas experiências e análises sobre a atractividade e as dificuldades encontradas no arquipélago. A evolução do país é destacada, mas problemas persistentes, nomeadamente ao nível das alfândegas, ainda dão algumas dores de cabeça…

Faz já 25 anos que Armindo Ferreira, português de nascimento, pisou Cabo Verde pela primeira vez. Gostou do clima e das pessoas e passados 5 anos regressou.

“Foi um amigo meu que me trouxe”, conta. Esse amigo tinha uma casa de pneus na Praia e Armindo veio trabalhar com ele. Posteriormente, abriu os seus próprios negócios. “Estou cá já há 20 anos”, contabiliza.

Hoje tem várias empresas de sucesso na área da restauração (incluindo o Linha d’água na Prainha e o Bistrô no Plateau) e na venda de produtos alimentares.

É bom ser empresário em Cabo Verde, garante, num discurso sempre muito positivo, e é-lhe fácil gerir os negócios. O ambiente é bom, desde que se saiba o que se está a fazer, não há problemas.

“O grande problema em Cabo Verde é que, às vezes, a entidade patronal não se sabe organizar” e quando assim é, “é complicado”, diz.

Entre as coisas boas que aqui encontrou destaca os funcionários. “São a maior riqueza. Tenho 140 funcionários e não tenho problemas com nenhum”.

Com uma longa experiência no país, Armindo já viu muitos outros empresários portugueses ou de outros países da Europa chegarem e falharem. O principal motivo, acredita, é não conhecerem bem o país nem a oferta existente, aliada a uma falsa ideia de que é fácil ter sucesso em Cabo Verde.

“Como em qualquer país aqui nada é fácil, a gente tem de trabalhar, tem de conhecer o país. Há empresários que chegam e pensam que aqui não há nada, que são mais espertos dos os que cá estão, querem fazer muita coisa e nada sabem fazer. Vêm sem conhecer o mercado”, explica.

Mas não há segredo nenhum para conseguir ter sucesso e uma empresa duradoura. O “segredo é saber e ser bom, mas isso é em qualquer lado”.

Ademais, tendo em conta que o mercado é muito pequeno e toda a gente se conhece e se cruza, é fundamental ganhar a confiança dos outros.

“Cabo Verde tem uma vantagem, só sobra quem sabe trabalhar e faz algo um bocadinho diferente e melhor do que os outros. E se as pessoas se não forem sérias, não forem boas, não conseguem trabalhar porque o mercado é pequeno”, complementa.

Porém, acredita, para quem tem essas qualidades, o país é ainda um bom destino de investimento. “Pode haver facilidade para quem for bom porque aqui há ainda muita coisa para fazer…”

Portugal, Espanha e Itália

Quando falamos em empresas europeias em Cabo Verde, falamos essencialmente de empresas que na realidade são constituídas juridicamente no país, mas cujos accionistas ou capital vêm de países membros da União Europeia (UE). Algumas podem inclusive ter registo em um país europeu.

No universo então dessas empresas, com accionistas, capital ou registo de um país da EU, mais de metade (54%) está relacionada com Portugal. Segue-se Itália (19%) e Espanha (15%). E depois França e Bélgica, com apenas 4% e 3%, respectivamente. Dinamarca corresponde a 2%, Alemanha e Países Baixos, ambos a 1%.

Os dados estatísticos constam do “Mapeamento dos investimentos da UE em Cabo Verde” realizado em 2021 pela Delegação da EU em Cabo Verde, que visou apresentar a presença e o impacto dos investidores europeus no país. E estes mostram também que se Portugal lidera em quantidade de empresas, em termos de investimento, a Espanha (com empresas grandes como a RIU, a Emicela ou a Frescomar) destaca-se: 57% do investimento europeu em Cabo Verde vem de Espanha. Portugal corresponde a 25% e Itália a 18%. Seguem-se França (5%); Dinamarca (0,3%); Bélgica (0,2%) e Países Baixos (0,1%).

Entretanto, os países e governos europeus, pelo menos os de maior expressão empresarial em Cabo Verde, têm geralmente mecanismos e entidades de apoio aos seus empresários nas ilhas. A Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP), por exemplo, é uma entidade daquele país que o faz, promovendo também, amiúde, acções dirigidas empresários que pretendem investir em Cabo Verde. Porém, nem todos os empresários necessitam ou buscam o apoio destas entidades. Alguns olham mesmo com desconfiança as mesmas, considerando o seu trabalho pouco expressivo e sem impacto no sucesso.

“Estão aqui para ganhar o ordenado deles, agora que façam alguma coisa aqui que eu conheça, nunca fizeram”, critica, por exemplo, Armindo Ferreira.

Aliás, mesmo em termos de representação diplomática o apoio aos imigrantes empresários lusos é nulo, acrescenta.

Mas cada caso será diferente e a altura em que os empresários vieram fixar-se em Cabo Verde ditará também a maior ou menor necessidade deste apoio. Para quem vem de novo, essa necessidade é, obviamente, maior.

De referir, voltando às estatísticas da UE, que cerca de metade das empresas europeias (51%) em Cabo Verde estabeleceu-se no país há mais de 10 anos. 36% existe há entre 5 e 10 anos, e apenas 13% tem menos de 5 anos.

Mas o que faz uma entidade pública que presta apoio aos empresários? Com maior ou menor acção, o papel é semelhante entre as várias existentes dos diferentes governos e países.

Jorge Cólogan, delegado em Cabo Verde da Fundação Canária para a Acção Exterior há cinco anos, explica o papel desta entidade do governo canarino: “Uma das funções da nossa delegação é o apoio à internacionalização das empresas canárias. Então, antes que um empresário chegue a Cabo Verde prestamos todo o tipo de informação sobre o mercado e fazemos notas sectoriais, fazemos um estudo de mercado. Depois, quando chega, acompanhamos com uma agenda de reuniões e de encontros, em função dos clientes e do perfil que o empresário precisa e facilitamos toda a informação para a constituição da empresa”.

Há cerca de 60 empresários canarinos, espalhados pelas ilhas, e que operam num vasto leque de áreas, da construção, ao turismo, passando pela agroindústria, etc.

Porquê Cabo Verde? Em primeiro, analisa Jorge Cólogan, devido à proximidade entre os dois arquipélagos. Em segundo, pela afinidade advinda da condição de insularidade de ambos. Em terceiro, por uma questão de facilidade linguística, pelas semelhanças entre o português e o espanhol. E por fim, “pela herança histórica” nas rotas de comércio.

Desde há algum tempo, e como se sabe, os transportes com as Canárias têm sofrido um retrocesso. Contudo, da experiência de Jorge Cólogan, nestes últimos 5 anos o que se nota é uma estabilidade no número de empresas canarinas em Cabo Verde. Ou seja, não têm surgido novas, mas também não têm fechado as que já cá estão.

“Estamos a manter-nos”, diz.

Mesmo com a pandemia não houve encerramentos. Em alguns sectores deu-se inclusive um aumento do volume de negócios. “Curiosamente, no sector de construção algumas empresas tiveram de aumentar os trabalhadores, porque a demanda foi altíssima. As obras não pararam, aumentaram. Penso que, como se limitou o turismo internacional, as pessoas com poder aquisitivo mais alto aproveitaram para investir as poupanças na reforma e remodelação das casas”, analisa.

Uma observação positiva- já falaremos das negativas - que lhe chega dos empresários que recebe é a evolução que tem havido na última década.

“Tem mudado de uma maneira extraordinária. Eu não estava aqui, mas havia muitos cortes de luz e cada vez temos menos, então todos estão de acordo de que as condições melhoraram muito.”

Damià

“Eu tive o privilégio de ver a evolução do país”, corrobora o catalão Damià Pujol, director geral das Águas de Ponta Preta (APP), que chegou a Cabo Verde em 2001.

Veio precisamente enviado por essa companhia espanhola, criada por um grupo de empresários também da Catalunha, na altura em que o primeiro dessalinizador da APP começou a funcionar no Sal e a maior parte dos investidores da ilha turística eram italianos. Hoje, o Sal tem cerca de 40 nacionalidades de todos os pontos do globo.

O ponto de viragem terá sido, acredita, a partir de 2004 quando o grupo espanhol RIU arrancou com o seu primeiro hotel. Começaram, depois, a vir os voos charter da TUI. O turismo expandiu.

“Digamos que o grupo RIU colocou Cabo Verde e a ilha do Sal no mapa no tour dos operadores internacionais”, observa, numa viagem pela história da ilha.

Mas não foi só isso que mudou. Todas as outras questões da ilha e do país evoluíram.

“Tive o privilégio de ver como inauguraram mais 3 aeroportos internacionais - Praia, Boa Vista e São Vicente -; como se fizeram 9 universalidades - quando cheguei não havia nenhuma. E também infra-estruturas como portos, estradas… a nível de telecomunicações está muito bem…”, enumera.

Quanto à ilha do Sal em específico, “a ilha tem um bom aeroporto; um porto mínimo que dá para manter os abastecimentos; a nível de serviços, não estamos como um país da Europa, mas há uma certa continuidade nos serviços de água e energia, e, pelo menos aqui no Sal há rede de esgotos, saneamento. Na saúde, ainda não estamos muito bem, mas já melhorou muito”, diz, num discurso sempre optimista.

As condições vão melhorando, a ilha (e o país) vão-se ganhando atractividade, não só no que toda ao turismo – o principal motor – e seus serviços conexos, como outras áreas, nomeadamente a exploração de sal.

A APP, como referido, opera no Sal há cerca de 22 anos. Desde então já pagou ao Estado de Cabo Verde cerca de 11 milhões de euros em impostos e realizou investimentos superiores a 35 milhões. A empresa conta hoje com 159 funcionários e uma rede de transporte para os mesmos.

Aliás, a questão dos recursos humanos é um item apontado pelos empresários. Embora alguns se queixem da falta de formação, pelo menos ao nível europeu, dos recursos humanos, para outros o cenário é positivo. Damià Pujol destaca aliás o facto de Cabo Verde ser um país escolarizado, com cada vez mais formação técnica como um factor positivo.

“Nós, por exemplo, aproveitamos muito o CERMI - Centro de Energias Renováveis, na Praia, e as universidades daqui, para contratar pessoas. Preparar jovens com valências facilita a vida dos empresários”, aponta, salvaguardando que “há de tudo, evidentemente ...”

Para este director, que não sendo empresário, conhece bem o sector privado, uma das grandes vantagens de Cabo Verde, que o torna atractivo é também a paridade com o euro.

A adesão em 2007 à Organização Mundial do Comércio, é outro.

E outro ainda, é que a banca está “cada vez mais potente e que está mais a acompanhar a economia”.

Na verdade, a questão dos banca nacional é muito importante para os empresários. Novamente as estatísticas: 52% das empresas da EU recorre a bancos e instituições financeiras locais como fonte do seu capital financeiro, enquanto apenas 12% o faz em entidades semelhantes internacionais.

Mas a atractividade não pára na banca e criação de cada vez melhores condições a nível de financiamento e regulamentação económica.

Apesar de cada vez haver mais impostos - “mas se queremos evolução e progresso é preciso pagar impostos”, defende Pujol – os progressos são visíveis.

O director destaca ainda a publicação, em 2019, do novo Código das Empresas Comerciais, que é já um documento muito semelhante a Portugal e Espanha. Um aspecto positivo o alargamento de acordos contra dupla tributação. “Historicamente só tínhamos Portugal, agora já temos Espanha e acho que mais alguns países. Espanha para o bem ou para o mal é o maior investidor do país a nível industrial”, lembra.

Quanto ao número de empresários cabo-verdianos, Pujol considera que “ainda há poucos empreendedores em Cabo Verde” e os que há têm na sua maioria perfil europeu.

“Há poucos empresários, é um país em que, por exemplo, a função pública emprega mais pessoas do que o privado. Isso tem que mudar e acredito que se está no caminho” para tal, conclui.

Luigi

De todos os entrevistados Luigi Zirpoli é o que está há mais anos em Cabo Verde. Engenheiro Civil de formação chegou há 38 anos “para fazer os aeroportos de Maio e Boa Vista”, no distante ano de 1985. Depois veio mais um projecto em Assomada com a cooperação italiana, seguido de outro projecto, agora da UE – Águas de Santa Clara…. E os anos foram andando. “Virei empresário e comecei a trabalhar no ramo das construções e outros”, conta.

Foi cônsul honorário de Itália durante um par de décadas, seguiu e apoiou os seus patrícios numa altura em que estes eram ainda os pioneiros do turismo em Cabo Verde e, mais recentemente foi instituído presidente da Associação Empresarial Europeia em Cabo Verde (AEECV), criada em 2017 e de momento inactiva.

Ao longo destes anos viu muitos empresários virem, irem, muitos fixarem-se. “Empresários chegam de todos os lugares do mundo”, lembra. Mas a maior parte, reconhece, da Europa, entre os quais se destaca Portugal.

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A questão da proximidade será fundamental. Por exemplo, observa, no ramo das importações alimentares. “Há 15 anos não havia fruta, nada, hoje há vários importadores de fruta. São investidores portugueses, não poderiam ser de outro lugar da Europa por causa da distância”.

Distância e conexões marítimas e aéreas, uma vez que é o país com que se mantêm mais ligações. “É o que está ligado”.

Noutras áreas salientam-se outras nacionalidades. Por exemplo, Alemanha nas energias renováveis.

O sector privado e os investidores virão sempre, observa, acompanhando as medidas tomadas pelo governo. E até hoje, tendo em conta a aposta que se fez no turismo – até porque o país pouco mais podia oferecer – este sector foi e continua a ser o predominante.

“O turismo atrai investidores do ramo e não só. Há o ramo dos serviços, de importação para benefício do turismo”, mas não há, por exemplo, “investidores que venham criar fábricas, de componentes para veículos, por exemplo”.

Assim, sublinha, “é sempre uma situação que está ligada à política governamental.”

Porém, lembra, neste momento, além do turismo o governo está apostando nas economias digitais, em centros de atracção para investidores nos ramos dessas economias digitais”, o que poderá constituir um novo mercado.

O turismo, porém, é para Luigi Zirpoli um sector que ainda não tem “as melhores condições” o que afastará muitos investidores. Basta olhar, por exemplo, o caso do Maio, que “é uma grande ilha turística, mas não tem ligações”. “

“Nada que ver com as ligações entre Tenerife e Gran Canaria”, ilustra, e até Cabo Verde chegar a esse nível, perderá oportunidades de desenvolvimento do turismo.

“O eventual investidor quando chega, quer ver essas coisas primeiro. Quem que já investiu, neste momento, no turismo são os grandes operadores, e são até os aventureiros”. Mesmo no Sal, tudo gira à volta da Praia de Santa Maria, onde, aliás, “já não há espaço para construir mais nada”, observa.

Mas então o que tem tornado o país atrativo para novos empresários? Cabo Verde ainda não está num patamar semelhante aos níveis europeus. “Ainda há muito a fazer então é este gap que se tem que fechar e que se vai fechando aos poucos”.

E tem outras qualidades atractivas, algumas das quais também referidas por outros entrevistados.

“É um país estável, com cultura europeia - porque a cultura de Cabo Verde é europeia - e é um país relativamente tranquilo”.

Ademais, e voltando ao incontornável turismo, Cabo Verde é o país com clima quente mais próximo da Europa.

“Alguém que procura um destino tropical próximo da Europa só Cabo Verde”.

Aliás, reconhece, “É sempre o turismo que manda em tudo”.

“Só que o turismo para ser bem desenvolvido. Precisa de serviços em condições e os serviços, como sabemos, são carentes”.

Quanto ao ambiente de negócio, “em palavras é criado”. Os governos, acredita, têm feito o que podem, mas “o problema é que o governo precisaria de muitos investimentos da sua parte para criar as condições, para atrair os investidores que vem de fora, e as condições são sempre estas: os transportes. Já se ultrapassou, por exemplo, a parte das comunicações, o país não tem problemas de comunicações digitais, ou telefonemas, mas a parte de transporte interno...

Andrea

Pausa para estatísticas. A maioria das empresas europeias (52%) estão em Santiago, e só depois surge o Sal, que alberga 27% das empresas. Segue-se São Vicente (12%) e depois Boa Vista (5%). Por fim aparece o Fogo (1%), sendo que a presença nas outras ilhas é residual.

Porém, o turismo domina a nível de sectores. 30% das empresas da UE funciona nesta área. Seguem-se “construção e serviços de engenharia” que representa uns distantes 10% e os serviços de transportes com 9%. Os produtos agrícolas e o pescado representam 7%, tanto a nível de produto fresco como processado. “Energia e serviços ambientais”, apesar da aposta do governo representa 5% e, no digital, os computadores e serviços de IT, apenas 1%.

Andrea Benolli é presidente da Cabo Verde Empresas, uma associação empresarial que “abrange todas as nacionalidades, desde que a empresa seja constituída no território cabo-verdiano”. Entretanto, observa, a maioria dos associados é de origem europeia. Ele próprio é italiano. Veio a Cabo Verde pela primeira vez em 2002, regressou em 2004 e depois em 2015 mudou-se definitivamente para o arquipélago onde tem a sua empresa na área do turismo e imobiliária turística, no Sal.

O momento pós-pandémico agora vivido é bom, reconhece.

“Estamos a sair também ainda das perdas ocorridas durante o período da covid, mas no momento em que o país tem uma indústria do turismo que funciona, também tem outras indústrias que trabalham em paralelo e que também voltam a funcionar. Portanto, neste momento há um crescimento que é favorável à economia de Cabo Verde e aos trabalhadores e penso que vamos continuando neste caminho”, diz.

Mesmo a crise do aumento do custo de vida que estamos a viver não parece afectar muito o turismo.

“Acho que isso não vai afectar. Depois da covid, muitos europeus querem sair, ver outros países, viajar. Em outras áreas, depende...”

“Estamos a falar de um país Estado com um sistema democrático”, destaca como um dos grandes atractivos do país. O aspecto salarial seria outro atractivo para investimentos europeus em Cabo Verde.

Olhar Cabo Verde como uma plataforma é também atractivo e o empresário acredta que esta poderá vir ser uma função do país, “não apenas no âmbito digital, como já é intenção do governo, mas também em termos de transformação dos produtos, porque a mão de obra é bastante formada, então dá para criar esta indústria de transformação.”, considera.

E numa análise alargada, com base da sua vida empresaria e enquanto presidente da Cabo Verde Empresas, aponta outros aspectos positivos e constrangimentos enfrentados, neste particular, pelas empresas europeias, começando pelo diálogo com entre o sector público e privado.

Diálogo

No Mapeamento realizado em 2021 pela UE, cujas estatítisctica temos vindo a citar, o diálogo público-privado insuficiente é apontado pelas empresas como a segunda maior barreira, apenas antecedido por “Política fiscal e procedimentos administrativos”. Em terceiro surge “Regulamentação e política comercial pouco claras”.

Também para Andrea Benolli esta tem sido uma dificuldade experimentada por si e associados da Cabo Verde Empresas.

“Há uma falha na comunicação e na regulamentação do sistema de diálogo. Fala-se sempre do disso, mas depois falta um enquadramento, um conjunto de regras, um negociador, um coordenador desta comunicação”, observa.

Este é aliás um aspecto diferente na Europa. Lá está tudo muito mais regularizado, regulamentado e também digitalizada. “A comunicação entre os empresários e a administração pública já tem regras, tem datas, tem sistemas aos quais os empresários já estão muito bem acostumados”. Em Cabo Verde este diálogo é muitas vezes feito ainda em conversas cara a cara, existindo assim “muitas áreas cinzentas, onde muitas vezes a conversa está um pouco perdida, não há uma regulamentação, não há uma minuta, não há um sistema transparente de diálogo entre o público e o privado”, aponta.

Quanto à política fiscal, pelo contrário, Andrea Benolli avalia que “há um enquadramento fiscal favorável”.

Os impostos sobre os lucros das empresas são mais interessantes do que nos países europeus, admite, porém… se se tiverem em conta os impostos aduaneiros (já iremos às alfandegas) “não sei se haverá vantagem sistema fiscal em Cabo Verde”.

A isso somam-se os serviços. Não haverá grande vantagem em pagar menos se não forem recebidos serviços pontuais e avançados, nomeadamente na justiça, saúde, transporte,

acesos às informações publicas, enfim “toda aquela parte da digitalização da administração que neste momento” ainda está a decorrer.

Tudo somado, “não vou dizer que ter uma empresa aqui é mais fácil ou mais difícil, mas com certeza é diferente de criar empresas na europa...”, resume.

Também Luigi Zirpoli fala das diferenças. Para este empresário a integração é fácil, mas “em qualquer país europeu realizar qualquer coisa é relativamente simples porque há normas estabelecidas, entidades que podem dar apoio, na parte legal, na assistência técnica, etc. Aqui, ainda se estão criando essas condições”.

Na teoria, refere, já há instituições que prestam esse apoio e abertura dos seus funcionários. Porém, quando surgem os problemas práticos – por exemplo um acto de compra e venda – as entidades envolvidas “são demasiadamente lentas” a resolver a questão. “Este é um dos problemas que normalmente qualquer investidor encontra. Cada um deles tem de procurar a própria forma para ultrapassar esses problemas”, diz.

Alfândegas

Entretanto, as alfândegas ainda continuam a ser uma dor de cabeça para a maior parte dos empresários. Muitos queixam-se da excessiva burocracia. Outros do tempo que se leva a, em determinados momentos, conseguir levantar as mercadorias.

Houve investimentos, houve inclusive apoio da União Europeia para a digitalização, houve mudanças, mas ainda há muitas queixas.

“Houve muitos progressos, mas claramente há ainda muita coisa a melhorar sobretudo em termos do controlo do processo por parte de todos os actores na cadeia de despacho, inclusive o importador”, aponta Andrea Benollli. E, mesmo frente às melhorias, põe-se também a questão da falta de pauta aduaneira e taxas de impostos, “assunto que às vezes até ultrapassa o governo”.

Entretanto, algo que tem vindo a exortar junto aos associados da Cabo Verde Empresas é que criem grupos “para negociar preços melhores na Europa e impostos aduaneiros mais baixos. É também por isso que existem associações empresariais”, diz.

Da parte dos empresários canarinos há também queixas. Aliás, a parte alfandegária e sua burocracia é, aliás, o principal problema apontado. “

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“As Canárias fazem parte da EU e o sistema europeu esta mais modernizado, a figura do despachante como figura na Europa não existe porque quase tudo é electrónico, então, digamos que as alfandegas são sempre uma dificuldade”, aponta Jorge Cólogan. Outras dificuldades apontadas são a formação do capital humano e o tamanho do mercado.

“Às vezes os empresários querem procurar aqui pessoas com uma formação parecida à europeia e não é fácil” e mercado “poder ser em algum momento um problema, até porque se também os salários são baixos a capacidade de consumo das famílias é reduzida”, acrescenta.

Conectividade

O mercado pequeno afasta muitas das grandes empresas europeias, mas a perspectiva de intensificar as ligações aéreas e marítimas com os países africanos, que estão mais próximos, pode ser atractiva.

Muito se fala dessa questão. Mas a verdade é que quase metade dos empresários europeus (47%) tem como motivação para o investimento no país, explorar o Mercado local. Quase outros tantos (44%) dizem que o motivo é explorar o mercado internacional, e apenas 8%, talvez conhecedores da falta de conectividade, apontam “explorar o mercado regional” como motivação. Porém, 34% das firmas consideram que esse mercado regional é muito importante. Já o mercado local é muito importante para 64% das empresas.

O mercado regional é, ainda, apenas uma potencialidade. E essa falta de conectividade tem constrangido as áreas de investimento. Andrea Benolli, por exemplo, atribui o facto de o país não possuir grandes fábricas essencialmente a dois factores: 1º, porque é um meio pequeno, não há economia de escala suficiente, e o 2.º, precisamente, porque “não podemos atingir com facilidade aos países da África ocidental, não temos transporte.

Já quando aos problemas de ligações inter-ilhas, o sector turístico é o que mais sofre. Isto porque é um problema que limita também a sua expansão.

É que a maior parte das empresas não trabalha inter-ilhas. A maioria das empresas europeias em Cabo verde são pequenas (39%) e micro (39%, também) empresas e apenas 8% podem ser consideradas grandes empresas – ou seja, empresas que empregam mais de 250 trabalhadores. E, ademais, acabam por estar restritas a uma só ilha, sem alcance nacional.

Porém, quando têm clientes em outras ilhas, a carência a este nível constitui um problema, para empresa e cliente, principalmente até para este último…

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1119 de 10 de Maio de 2023.

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Autoria:Sara Almeida,14 mai 2023 8:59

Editado porJorge Montezinho  em  15 mai 2023 9:46

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