Cabo Verde cresce acima da média da África Subsaariana

PorJorge Montezinho,17 jun 2023 11:33

A economia cabo-verdiana vai continuar a tendência positiva – tanto este ano como nos próximos dois – mas agora longe da subida a dois dígitos de 2022, segundo as últimas projeções do Banco Mundial, publicadas este mês. Já o crescimento global deve desacelerar, para 2,1% em 2023, com as perspectivas assombradas pelos riscos financeiros.

Um crescimento económico de 4,8% este ano, de 5,4% em 2024 e de 5,3% em 2025, estas são as projeções do Banco Mundial (BM) para Cabo Verde, como se pode ler no relatório Perspectivas Económicas Globais, publicado este mês. Apesar do aumento histórico do PIB, de 17,7%, os números agora avançados pelo BM acabam por não surpreender.

No passado mês de Maio, os Indicadores Económicos e Financeiros do Banco de Cabo Verde já apontavam para uma evolução menos favorável da actividade económica nacional no primeiro trimestre de 2023, com diminuição da procura interna, bem como a redução do investimento, principalmente por causa do impacto adverso da alta inflação sobre os rendimentos.

Mesmo assim, as projeções do BM estão acima das estimativas do BCV, que apontam para um crescimento de 4,1%, um aumento do PIB que estará, este ano, condicionado “pela desaceleração do crescimento mundial, pelos níveis ainda elevados da inflação, pelo aperto das condições de financiamento, bem como pela retirada gradual das medidas orçamentais implementadas para minimizar os efeitos dos elevados preços da energia e dos produtos alimentares de primeira necessidade”, como explicou o governador do Banco de Cabo Verde.

Óscar Santos que afirmou recentemente – à margem do ciclo de conferências mensais Finanças em Dia, organizado pelo BCV – que “não é possível que uma economia como a cabo-verdiana mantenha uma taxa de crescimento de 15 a 17% por ano, não tem estrutura para isso. O normal é que cresça abaixo ou acima do seu potencial, estimando há alguns anos, de 4,5%”.

Avaliação regional

O crescimento na África Subsaariana, refere o BM, continuou a desacelerar no início deste ano devido a vários desafios específicos de cada país e maiores dificuldades económicas externas. As recuperações de choques económicos e climáticos anteriores, já frágeis e incompletos em muitos países, foram enfraquecidas pela inflação alta e persistente, maior aperto nas condições financeiras globais, pressão nas políticas domésticas e surtos de violência e agitação social em alguns países.

O aumento da inflação agravou as dificuldades económicas dos mais pobres e aumentou acentuadamente a insegurança alimentar.

A África Subsaariana começou este ano com mais 35 milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar aguda do que no início de 2022. Em vários países, especialmente nos países de baixo rendimento, com situações frágeis e afectados por conflitos, secas prolongadas e conflitos armados agravaram estes efeitos. Embora a inflação nominal tenha diminuído recentemente, a inflação anual dos preços dos alimentos permaneceu nos dois dígitos em quase 70% dos países, reflectindo custos mais altos de insumos agrícolas – o elemento ou conjunto de elementos que entra na produção de bens ou serviços –, desvalorizações da moeda e mais interrupções no fornecimento devido à violência intercomunitária e impactos adversos das mudanças climáticas.

Apesar das projeções mostrarem que 13 países da África Subsaariana – num total de 47 analisados – vão crescer mais do que Cabo Verde, o arquipélago apresenta números superiores à média regional, que é de 3,2%.

A República Democrática do Congo será a economia com maior subida, 7,7%, seguida do Níger (6,9%) e do Ruanda e da Costa do Marfim (ambas com 6,2%). Entre os países africanos da CPLP, Moçambique tem um crescimento estimado de 5,0%, Guiné-Bissau de 4,5%, Angola 2,6%, São Tomé e Príncipe 2,1% e a Guiné Equatorial tem o crescimento negativo de -3,7%. Guiné Equatorial, inclusive, é o país que tem piores resultados, assim como o Sudão do Sul (-0,4%) e o Sudão (0,4%). Para as Maurícias prevê-se um crescimento económico de 4,7% e para as Seychelles de 3,8%.

O crescimento nas três maiores economias da África Subsaariana – Angola, Nigéria e África do Sul – abrandou para 2,8 por cento em 2022 e continuou a enfraquecer no primeiro semestre deste ano. A economia da África do Sul – prejudicada por graves cortes de energia – continuou a desacelerar devido à inflação persistente, ao aperto da política interna e à procura externa mais fraca. Em Angola e na Nigéria – os maiores produtores de petróleo da África Subsaariana – o ímpeto de crescimento estagnou devido à queda dos preços da energia e à paralisação da produção de petróleo. A recuperação pós-pandemia no sector não petrolífero da Nigéria esfriou no início deste ano devido à inflação persistentemente alta, escassez de moeda estrangeira e escassez de notas causadas pelo redesenho da moeda.

O Banco Mundial espera que o crescimento na África Subsaariana suba para 3,9 por cento em 2024. A recuperação na África do Sul deverá abrandar para 0,3 por cento este ano, uma vez que os cortes generalizados de energia pesam imenso na actividade e contribuem para a persistência da inflação. Espera-se que o crescimento na Nigéria permaneça um pouco acima do crescimento populacional – muito mais lento do que o necessário para fazer ofensivas significativas no abrandamento da pobreza extrema. As depreciações das perspectivas, no entanto, estendem-se para lá das principais economias regionais, com custo de vida elevado limitando o consumo privado e políticas mais rígidas impedindo uma retoma do investimento em muitos países. Espera-se que o agravamento das vulnerabilidades domésticas, juntamente com as condições financeiras globais difíceis e o fraco crescimento global, mantenham as recuperações moderadas.

Prevê-se que o rendimento per capita na África Subsaariana cresça menos de 1% ao ano, em média, ao longo do horizonte de previsão; enquanto que em mais de um quinto das economias da região, incluindo as três maiores, o crescimento médio do rendimento per capita em 2023-24 não deve exceder 0,5%. Como sublinha o Banco Mundial, as perspectivas de redução da pobreza na região permanecem sombrias, com quase 40% da população da região a viver em países com rendimento per capita mais baixo no próximo ano do que em 2019.

As perspectivas estão ainda sujeitas a vários riscos negativos, uma vez que a actividade global pode desacelerar mais depressa do que o previsto se a reabertura da economia da China não gerar uma recuperação duradoura ou se as condições financeiras globais forem mais apertadas. Se as pressões inflacionárias persistirem por mais tempo do que o actualmente previsto, ou se o stress no sector bancário da economia avançada se espalhar para o sistema financeiro global, as condições financeiras da África Subsaariana poderão deteriorar-se ainda mais, provocando novas desvalorizações da moeda e saídas de capital e elevando os riscos de sobreendividamento.

Muitas economias da África Subsaariana, que já necessitam de espaço fiscal para amenizar novos choques macroeconómicos, estão a lidar com desafios domésticos descomunais, como pobreza persistente, violência e conflito agravados e impactos adversos das mudanças climáticas. Condições meteorológicas extremas mais severas, juntamente com a crescente insegurança em países já afectados pelo aumento da frequência de tais eventos, podem enfraquecer ainda mais o crescimento e resultar em crises humanitárias prolongadas.

Projecções mundiais

Mais de três anos depois do coronavírus ter desencadeado a mais profunda recessão global desde a Segunda Guerra Mundial, a economia mundial continua muito aquém da força necessária para fazer progressos substanciais nas ambições globais de eliminar a pobreza extrema, combater as mudanças climáticas e reabastecer o capital humano.

O crescimento global sofreu desaceleração acentuada e o risco de stress financeiro nos mercados emergentes e nas economias em desenvolvimento está a intensificar-se através da elevação das taxas de juros globais, de acordo com o mais recente relatório do Banco Mundial.

O crescimento global deve desacelerar de 3,1% em 2022 para 2,1% em 2023. Nos mercados emergentes e nas economias em desenvolvimento, com excepção da China, o crescimento deverá desacelerar de 4,1% no ano passado para 2,9% este ano. Estas previsões reflectem depreciações amplas.

“A maneira mais segura para reduzir a pobreza e partilhar a prosperidade é através do emprego – e o crescimento mais lento torna a geração de empregos muito mais difícil”, escreve o Presidente do Grupo Banco Mundial, Ajay Banga. “É importante ter em mente que as projeções de crescimento não representam um destino. Temos a oportunidade de inverter a tendência, mas para isso precisaremos trabalhar juntos”.

Para já, a maioria dos mercados emergentes e das economias em desenvolvimento sofreu poucos danos devido ao recente stress bancário nas economias avançadas, mas agora começam a navegar águas perigosas. Com as condições de crédito global cada vez mais restritivas, um em cada quatro mercados emergentes e economias em desenvolvimento perdeu o acesso aos mercados internacionais de títulos. O aperto é especialmente grave para as economias em desenvolvimento com vulnerabilidades subjacentes, como baixa qualidade de crédito. As projeções de crescimento para essas economias em 2023 atingem menos da metade das projeções de há um ano, o que as torna muito vulneráveis a novos choques.

“A economia mundial encontra-se numa posição precária,” disse Indermit Gill, Economista-Chefe e Vice-Presidente Sénior do Grupo Banco Mundial. “Fora do Leste e do Sul da Ásia, a economia está muito longe do dinamismo necessário para erradicar a pobreza, combater as mudanças climáticas e repor o capital humano. Em 2023, o ritmo de crescimento do comércio será menos de um terço do registado nos anos anteriores à pandemia. Nos mercados emergentes e nas economias em desenvolvimento, as pressões sobre a dívida estão a crescer por causa das taxas de juros mais altas”.

As previsões mais recentes indicam que o triplo choque da pandemia, da invasão russa da Ucrânia e da forte desaceleração criada pelas condições financeiras globais restritivas causaram um forte retrocesso no desenvolvimento dos mercados emergentes e das economias em desenvolvimento, que permanecerá no futuro próximo.

Nas economias avançadas, o crescimento deverá desacelerar de 2,6% em 2022 para 0,7% este ano e permanecerá fraco em 2024, de acordo com o relatório do Banco Mundial. Depois de crescer 1,1% em 2023, a economia dos EUA deve abrandar para 0,8% em 2024, principalmente devido ao impacto persistente do acentuado aumento das taxas de juros no último ano e meio. Na zona do euro, a previsão é de que o crescimento diminua para 0,4% em 2023, em comparação com 3,5% em 2022, devido ao efeito desfasado do garrote da política monetária e dos aumentos nos preços da energia.

A maior parte do aumento dos rendimentos de dois anos do Tesouro dos EUA no último ano e meio foi estimulada pelas expectativas dos investidores em relação à agressiva política monetária dos EUA para controlar a inflação. De acordo com o relatório, esse tipo específico de aumento da taxa de juros está associado a efeitos financeiros negativos nos mercados emergentes e das economias em desenvolvimento, incluindo uma probabilidade mais alta de crise financeira.

O relatório fornece ainda uma avaliação abrangente dos desafios da política fiscal que enfrentam as economias de baixo rendimento. Estes países encontram-se numa situação difícil. O aumento das taxas de juros agravou os estragos fiscais na última década. Actualmente, a dívida pública corresponde, em média, a cerca de 70% do PIB. Os pagamentos de juros estão a consumir uma fracção cada vez maior das limitadas receitas do governo. Os choques negativos, como eventos climáticos extremos e conflitos, têm maior probabilidade de levar as famílias a situações de dificuldade nos países de baixo rendimento do que em qualquer outra nação, devido às limitadas redes de proteção social. Em média, os países de baixo rendimento gastam apenas 3% do PIB com os cidadãos mais vulneráveis, bem abaixo da média de 26% das economias em desenvolvimento.

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Panoramas Regionais

Leste da Ásia e Pacífico: Espera-se que o crescimento aumente para 5,5% em 2023 e depois desacelere para 4,6% em 2024.

Europa e Ásia Central: Espera-se que o crescimento suba ligeiramente para 1,4% em 2023, antes de aumentar para 2,7% em 2024.

América Latina e Caribe: A projeção é de que o crescimento desacelere para 1,5% em 2023, antes de se recuperar para 2% em 2024.

Oriente Médio e Norte da África: Espera-se que o crescimento desacelere para 2,2% em 2023, antes de se recuperar para 3,3% em 2024.

Sul da Ásia: A projeção é de que o crescimento caia para 5,9% em 2023, e depois para 5,1% em 2024.

África Subsaariana: Espera-se que o crescimento desacelere para 3,2% em 2023, e suba para 3,9% em 2024.

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1124 de 14 de Junho de 2023. 

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Autoria:Jorge Montezinho,17 jun 2023 11:33

Editado porSara Almeida  em  13 mar 2024 23:28

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