“Esta classificação diz-nos que estamos a construir a nossa preparação para o futuro”, diz ao Expresso das Ilhas Pedro Lopes, secretário de estado para a inovação e formação profissional, numa primeira reacção à pontuação de Cabo Verde. “Antes de mais, é importante dizer que entramos pela primeira vez neste índex eisso é o reflexo de uma série de passos que têm sido dados para reforçar o papel das tecnologias de informação e para preparar o país para o futuro”.
Os resultados e as classificações da última edição do Network ReadinessReport (NRI) foram divulgados pelo PortulansInstitute, um thinktankcom sede em Washington, que, em 2019, substituiu o Fórum Económico Mundial na publicação deste ranking anual, que avalia a fase em que estão os países em termos de fomento de tecnologias da informação e de prontidão para o futuro.
O relatório, cujo título é “Acelerar a Transformação Digital numa Economia Global pós-COVID”, analisa 134 economias, mais treze do que no ano passado e Cabo Verde está entre as novas adições. O modelo NRI reconhece a disseminação das tecnologias digitais no mundo ligado de hoje e tem como base quatro dimensões fundamentais: Tecnologia, Pessoas, Governança e Impacto. Esta abordagem significa que o NRI cobre questões que vão desde tecnologias do futuro, como Inteligência Artificial (IA) e Internet das Coisas (Iot), ao papel da transformação digital no alcançar dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Isto num total de 60 variáveis que são examinadas.
E o que nos diz o NRI2020? Que a Suécia, a Dinamarca e Singapura são as sociedades mais preparadas para o futuro, isso faz da Europa, com três países no top4 global (o quarto é os Países Baixos) e com oito nações entre as dez primeiras, a região líder do mundo.
Os Estados Unidos permanecem o líder global em termos de Tecnologias do Futuro; o país está classificado no top 10 em cada um dos cinco indicadores do sub-pilar (ocupando o primeiro lugar em dois deles); e a China é agora um competidor global em áreas-chave, como IA, e-commerce e 5G.
Economias avançadas e economias atrasadas
África continua atrás das outras regiões, especialmente no que se refere a acesso, acessibilidade e uso dasTICs. Com o efeito cascata da COVID a começar a atingir o comércio internacional e os fluxos de investimento, oafastamento entre economias preparadas para trabalhar em rede e as atrasadas pode aumentar.
“O futuro vai passar pelo digital e temos de estar preparados para não sermos apenas espectadores, mas simactores deste mundo em mudança”
Pedro Lopes Secretário de estado da Inovação
Uma questão que também está a preocupar o governo cabo-verdiano, como refere o secretário de estado Pedro Lopes.“Temos soluções pensadas que passam por dotar a nossa juventude com ferramentas para que tenham uma literacia digital cada vez mais reforçada. Nesse âmbito, começamos o curso de formação profissional em programação, para reconverter jovens desempregados em programadores, que vai dar oportunidade aos jovens de fazerem um curso de altíssimo nível, em conjunto com uma instituição internacional, a Academia de Código, jovens de todas as ilhas puderam candidatar-se, e quem é de fora de Santiago pode vir, porque vamos apoiar na estadia e na alimentação e queremos que esta primeira turma, de 22, esteja preparada para o futuro. Além disso, os nossos WebLab já formaram mais de 12 mil jovens cabo-verdianos nas áreas da programação e robótica”.
“A Covid”, continua o governante,“veio mostrar que há a necessidade de uma transformação digital, que cada vez mais precisamos de estar ligados às tendências do mundo.Acredito que o mundo vai ficar dividido entre países que vão poder dominar tecnologias, como a inteligência artificial, a robótica, a impressão 3D, ou seja, os países que estão a preparar os seus jovens para as necessidades do futuro serão os que estarão na linha da frente da mudança. Os outros, ficarão para trás. Nós não queremos ficar para trás e para isso temos tomado uma série de medidas para dar resposta a esta necessidade de futuro e encontrar respostas às questões: que jovens queremos ter? Que habilidades queremos desenvolver em dez anos?”
Mais do que investimento em tecnologia
O que o relatório NRI 2020 também sublinha é que em todos os tipos de economia, os investimentos em tecnologia, por si só, não garantem níveis mais elevados de prontidão na rede. A capacidade das economias nacionais em suportar esforços para permitir a requalificação e o desenvolvimento da sua força de trabalho e talentos locais é a chave para o futuro.
“É importante não pensar só na tecnologia por si”, sublinha Pedro Lopes, “temos também de reforçar o pensamento crítico, ensinar os jovens a ter pensamento crítico, ensinar colaboração, comunicação, ensinar a aprender, todas estas características são fundamentais para que a tecnologia tenha impacto na vida das pessoas. Acima de tudo, um dos desafios do futuro será a forma como vamos colaborar entre nós e também como vamos ter um pensamento criativo, algo que as máquinas ainda não conseguem. Mas é preciso dominar as máquinas, saber como é que os computadores nos podem servir e como é que nos podemos servir dos computadores e esse é um desafio grande para vários países. Em termos de conectividade, somos o país africano com mais acessos à internet por 100 habitantes, 80, temos mais de 120 praças digitais de acesso gratuito espalhadas pelo país. Estamos a ver os preços da internet a descer e a velocidade a subir. Mas certamente haverá mais passos a dar”.
As estratégias relacionadas com a COVID e o confinamento aceleraram a transformação digital. Isso cria oportunidades, mas também desafios. O relatório NRI2020 chama a atenção para o facto desta transformação digital poder também criar novas formas de desigualdade digital.
“Por isso é preciso criar condições para que todos se possam formar nestas áreas”, explica o secretário de estado para a inovação. “Hoje, todas as escolas do país têm um WebLab, onde os jovens aprendem robótica, aprendem programação, a construir drones, lá está, não só aprendem a dominar a tecnologia como a criar tecnologia e esta dinâmica é importante quando falamos na 4ª revolução industrial. Em Cabo Verde temos de preparar os jovens para o que aí vem”.
Cabo Verde no NRI2020
Ao ocupar o 86º lugar, com 42.01 pontos (Suécia, que lidera o ranking, tem 82.75), Cabo Verde é o quinto país africano que aparece no índex, depois das Maurícias (61º, com 49.83 pontos), da África do Sul (76º, 45.26), do Quénia (82º, 43.22) e do Egipto (84º, 42.56).
Numa análise mais detalhada, o arquipélago obtém piores notas em variáveis como a adopção de tecnologias emergentes, empresas com site na Internet, ferramentas digitais para negócios, cibersegurança, qualidade da regulação, exportação de tecnologia e cidades e comunidades sustentáveis. As qualificações mais positivas são atribuídas ao acesso à Internet nas escolas, à legislação para o e-commerce e à protecção de dados.
“Temos de dar passos mais acelerados na nossa vontade de sermos um hub tecnológico no Atlântico e uma porta de entrada segura para o continente no que toca às TIC”, reforça o secretário de estado para a inovação. “A pandemia mostrou-nos a necessidade de diversificação da nossa economia e o digital assume esta posição, de oferecer ao país uma possibilidade de diversificar a sua economia. É por isso que temos vindo a fazer estes investimentos nos últimos tempos, que são relevantes. No Parque Tecnológico, cerca de 40 milhões de euros, no cabo ELLA LINK, cerca de 25 milhões de euros, para além de todo o investimento feito em termos de capacitação dos nossos jovens. Queremos apoiar 100 jovens a criarem 50 start-ups por ano. Já apoiamos 50 jovens, quando acabar a primeira turma vamos apoiar mais 50. O programa de formação em programação, são 22 jovens agora e o objectivo é chegar aos 100 por ano. E os resultados estão aí, pela primeira vez entramos no top100 do ranking mundial de ecossistemas de inovação para start-ups e top10 do continente. Pela primeira vez entramos também no top100 do ranking do índice global da inovação da Organização Mundial de Propriedade Intelectual e agora esta entrada também no NRI, na posição 86. Não é a posição onde queremos estar, queremos subir ainda mais, mas é importante realçar a entrada e as conquistas que este ano foram alcançadas e que permitiram a Cabo Verde, pela primeira vez, figurar neste ranking internacional”.
Os países da CPLP no NRI2020
31º Portugal, 64.40 pontos
59º Brasil, 50.58 pontos
86º Cabo Verde, 42.01 pontos
128º Moçambique, 24.18 pontos
131º Angola, 20.96 pontos
Um ano de Cabo Verde Digital
2020 assinala um ano do Cabo Verde Digital, a plataforma que tem juntado os jovens, as universidades, os talentos, o governo e todas as pessoas que querem utilizar a tecnologia como uma alavanca para o desenvolvimento do país.
Esta semana, para comemorar esse primeiro aniversário, vão decorrer uma série de iniciativas, a começarpelo lançamentodo programa de nómadas digitais.“Um programa”, explica Pedro Lopes,“que permite a pessoas que trabalham de forma descentralizada possam fazê-lo em Cabo Verde. Queremos atrair pessoas do mundo inteiro que não precisam de trabalhar num local fixo. Estas pessoas costumam ficar entre 3 a 6 meses e ao ficarem aqui não só contribuem para a nossa economia, mas sobretudo podem conectar-se com o nosso ecossistema”.
Também esta semana, pela primeira vez, o líder de um país dos PALOP vai ser um dos oradores na Web Summit (que decorre 2 a 4 deste mês, de forma virtual e já conta com mais de 100 mi inscritos). “O Primeiro-Ministro recebeu este convite”, avança o secretário de estado para a inovação. “Eles só convidam líderes que deram contributos para a transformação digital dos seus países e o Primeiro-Ministro Ulisses Correia e Silva tem apoiado desde o início estas iniciativas. Por isso, esta semana, vamos ter o nosso Chefe do Governo a falar sobre as conquistas e os desafios de Cabo Verde”, conclui Pedro Lopes.