Aos 67 anos, e exilado em Espanha, Donato Ndongo, também jornalista, é uma voz crítica do regime liderado pelo mais antigo ditador africano. Sobre a entrada para a CPLP, Ndongo é claro: “não era uma necessidade essencial para o povo da Guiné-Equatorial”.
“Teodoro Obiang, simplesmente, é um fanfarrão. Queria demonstrar que tem amizades e que é reconhecido em todo o mundo e por isso decidiu integrar-se na Comunidade de Países de Língua Portuguesa”, conta ao Expresso das Ilhas, em Tenerife.
“Tantos anos depois da integração, não se promove, sequer, o ensino do português. Para ele, era uma forma de ser aceite num clube, como também fez o possível para se integrar na francofonia e fez o possível para figurar entre os dirigentes do mundo”, comenta.
Aos 67 anos, Donato Ndongo é um dos principais nomes da letras equato-guineenses. Em 1994, terá sido ameaçado de morte “pelo secretário de Estado da Segurança, tio de Obiang”, alegadamente insatisfeito com os artigos que escrevia para a agência EFE, a partir de Malabo, e que falavam sobre a situação social e política do seu país.
Ndongo conhece bem o regime de Obiang e por isso não acredita nas boas-intenções do Chefe de Estado do seu país quando este promete o fim da pena de morte.
“A condição de que lhe puseram para se integrar nessa comunidade [CPLP] foi a abolição da pena de morte. Agora, pede apoio aos países de língua portuguesa, para que o ajudem a abolir a pena de morte. Que apoio necessita um presidente que é um ditador, que tem todos os poderes do Estado e que tem um parlamento em que, de cem membros, 99 são do seu próprio partido? Que apoio necessita para assinar um simples decreto para acabar com a pena de morte?”, questiona.
De olhos postos no futuro, Donato Ndongo ambiciona um “regime de liberdades”, que aproveite os quadros “preparados” que existem, mas que “não estão a fazer barulho”. A pretensão esbarra na vontade do actual Presidente, que procura impor ‘Teondorín’ Obiang, seu primogénito e vice-presidente desde 2012, como sucessor.
“Nem o povo da Guiné-Equatorial e nem os próprios familiares de Teodoro Obiang querem que ‘Teodorín’ seja presidente, porque a sua incapacidade é manifesta”, garante.
Literatura
Entre as obras de Ndongo, que se apresenta como “um escritor comprometido”, contam-se "História e Tragédia da Guiné Equatorial", "Sombras da tua memória negra" ou "Espanha na Guiné. Construção do desencontro: 1778-1986". Em 2017 lançou "O sonho e outros relatos” e um livro de poesia, "Olvidos".
“Desde o início do meu percurso literário, concebi-o como uma forma de conseguir a dignificação do negro, não só o negro africano, mas de qualquer negro que habita no mundo. Desde o século XVI, com a escravatura, que nos tiraram a dignidade. Inclusive a nossa história, as nossas culturas se reinterpretam desde outras culturas para acomodar outros interesses que não são os nossos”, diz.
A Guiné Equatorial aderiu à CPLP em 2014, na conferência de Dili. Timor-Leste, Cabo Verde, Portugal, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, Moçambique e Brasil são os outros membros da organização.
Donato Ndongo está em Tenerife, Canárias, para participar no Campus África, organizado pela Universidade de La Laguna, e que se prolonga até dia 26, com a participação de uma centena de estudantes africanos, entre os quais perto de 60 cabo-verdianos.
O Expresso das Ilhas e a Rádio Morabeza estão em Tenerife e viajam a convite do Campus África.