António Vitorino, que intervinha numa conferência em Paris, considerou que "as clivagens nas políticas migratórias dos Estados-membros da União Europeia se tornaram fraturas".
"Quando há clivagens nos Estados-membros, caso não haja uma resolução eficaz, elas tornam-se fraturas. Na crise da zona euro, houve clivagens que felizmente conseguimos conter, mas em termos de asilo demorámos demasiado tempo a tomar certas decisões e as fraturas já existem", disse António Vitorino.
O ex-comissário europeu participou hoje de manhã na capital francesa numa conferência organizada pela delegação da Fundação Calouste Gulbenkian em Paris e pelo instituto Notre Europe - Jacques Delors sobre o tema "Pensar em conjunto as migrações e o desenvolvimento".
Para Vitorino, familiarizado com a política a nível nacional e a nível europeu, há uma culpabilização dos Estados em relação à Europa que tem de ter limites já que "é normal mandar tudo para as costas de Bruxelas e culpar as instituições por tudo o que se passa", mas a competência de regular sobre os imigrantes económicos pertence inteiramente a cada país.
"Os tratados são claros quando dizem que a imigração económica é uma competência exclusiva dos Estados-membros, portanto, cada Estado tem o direito de adoptar as regras que quiser em relação a estes imigrantes e, a única coisa que pedimos, é que coordenem as suas políticas. É o mínimo", disse o também ex-governante português.
E é este desconhecimento de competências e de coordenação, que segundo António Vitorino estão a alimentar politicamente o populismo anti-imigração não só na Europa, mas em todo o Mundo.
"Há um sentimento crescente, em diferentes países, da rejeição da imigração. Se acreditarmos nas sondagens, e é preciso ter em atenção que nem tudo o que vemos nas notícias corresponde à realidade, nalguns países europeus, a seguir à crise migratória de 2015, há uma rejeição da imigração mais elevada do que antes", destacou.
"No entanto, se virmos também o que passa do outro lado do Atlântico, há um movimento político populista anti-imigração que cresce nos Estados Unidos e no Canadá", indicou, acrescentando que nos países do Sul há também "números muito elevados de rejeição dos imigrantes" citando o México, a África do Sul, a Nigéria ou o Quénia.
A solução para a Europa, segundo Vitorino, é "restabelecer a capacidade de diálogo entre os Estados-membros" já que "nenhum país, nem mesmo as grandes potencias, são capazes de resolver sozinhas os fluxos migratórios".
E, a longo prazo, o codesenvolvimento, adiantou.
"Mesmo os países europeus mais reticentes às políticas europeias de imigração, concordam que é preciso uma estratégia que faça ligação entre a imigração e o desenvolvimento. [...] Para mim, o maior capital para o desenvolvimento é a educação e aí têm de ser os países de origem a apostar nos seus sistemas de educação e na formação profissional", disse o antigo comissário europeu.
António Vitorino tentou ainda desconstruir alguns mitos, partilhando com a plateia que a maior parte dos fluxos migratórios acontece entre países do Sul, nomeadamente entre países africanos, e que a melhor forma de fazer chegar mão de obra qualificada à Europa e contribuir para a integração dos migrantes é começar a trabalhar nos países de origem com formação na língua dos países para onde querem ir e reconhecimento de capacidades profissionais.