Ainda cedo, por volta de 1920, o pai, Gregório António Lopes, natural da aldeia de Estância de Brás, na ilha de S. Nicolau, emigra para a zona da Costa Oeste da América do Sul, nas imediações da República do Chile, durante algum tempo, e “tenta entrar nos Estados Unidos da América, mas sem sucesso”. Volvidos cinco anos sobre a data da primeira expatriação, em 1925, o pai reemigra, desta feita, para o Brasil, estabelece-se no Rio de Janeiro, até 1930-31, data em que regressa definitivamente à ilha natal, e casa com D. Josefa Arsénia Lopes, de profissão doméstica, mãe de Pedro Gregório, também natural de S. Nicolau, mais concretamente da zona das Queimadas.
Unidos pelo casamento, para toda a vida, os progenitores rumam para São Vicente, no limiar da década de 30, e, ali, o chefe do agregado familiar incorpora-se na Polícia, durante pouco tempo, pois recusa-se a ser transferido para a Praia, numa altura em que a capital do país, por sinal, se via a braços com uma crise de paludismo que a assolara. Definitivamente fora da instituição policial, por opção própria, Gregório Lopes dedica-se ao pequeno comércio naquela ilha e, em 1939, regressa a S. Nicolau, onde viria a falecer na década de 60 aos 64 anos de idade. Filho de pais católicos praticante, Pedro, ainda cedo, apropria-se da religião em casa, que o “molda para a vida, de uma determinada maneira”, passa a ir à missa com assiduidade e desenvolve“um sentido de ver e de consciência”. Desde a sua tenra idade, é baptizado na Igreja, primeiro, e crismado, depois, na linha, aliás, da tradição fortemente religiosa que herdara dos pais. Ainda na fase escolar da instrução primária, faz a 1ª classe com o professor e racionalista cristão, João Miranda, na ilha que o vira nascer, de resto “um homem com ideias avançadas para o tempo”.Posteriormente, em 1939, vai para S. Nicolau prosseguir os estudos primários e, ali, é aluno do professor Norberto Miguel Gomes, da 2ª à 4ª classe, na escola das Queimadas, a 2 (dois) quilómetros da Fajã de Baixo (Chã de Barata), onde morava Pedro Gregório, e a cerca de 17 (dezassete) da Vila da Ribeira Brava. Considerado “bom professor, que não utilizava a violência na sala de aula” para impor a disciplina, Norberto Gomes era, no entanto, “irascível, tinha um feitio terrível. Tínhamos medo dele, principalmente quando se vestia de branco e punha capacete branco na cabeça, rezávamos quando o víamos a descer lá da Fajã para Queimadas, onde tínhamos aulas”.
Concluída a 4ª classe, em 1942, Pedro interrompe os estudos, por razões alheias à sua vontade, e, durante algum tempo, em S. Nicolau, trabalha no campo, como o faziam, os colegas da mesma faixa etária, virado essencialmente para a aprendizagem da vida. Naquele tempo de dificuldades e sacrifícios enormes,“as crianças tinham de aprender a fazer qualquer coisa e essa aprendizagem não correspondia, de forma alguma, àquilo que se conhece hoje como trabalho infantil”. Curiosamente, essa interrupção forçada da actividade escolar de Pedro Gregório com recurso ao trabalho não forçado e não de enxada coincide, no tempo, com a época da fome em S. Nicolau, entre 1939 e 1942, cuja imagem deprimente que ainda lhe perdura é a de “ver crianças e adultos esgravatarem na cinza um grão para comer. A maior parte dos meus colegas, nessa altura, morreu de fome, na ilha”.
A despeito da fome declarada em toda a ilha, mas particularmente na zona da Fajã de Baixo, ou Chã de Barata, onde vivia, “a minha família não passou dificuldades (…), o meu pai guardava milho em casa das nossas hortas, em tambores metálicos, que terão vindo da América, e comprava algum milho”, sempre que se revelasse absolutamente necessário. Em 1944, antes do término da II Guerra Mundial, que, coincide com o fim da fome, na ilha, Pedro Gregório e três colegas da mesma geração - João Quirino Spencer, da Vila, Zé Herculano e Serafim, ambos de Água das Patas, todos já falecidos - entram no Seminário-Liceu de S. Nicolau, que, no ano precedente, acolhera Os Salesianos, e ali permanecem apenas durante escassos meses.
Fora do Seminário, Pedro Gregório, em fins de 1944 e princípios do ano seguinte, vai para S. Vicente estudar a admissão aos liceus com o professor João Miranda, pela primeira vez, e fica hospedado, em Chã de Alecrim, “em casa de um primo do meu pai, casado com uma senhora de Santo Antão”. Comodamente instalado, depois de ter passado dificuldades no meio rural próprias daqueles tempos, descobre a bola, em vez de estudar, “jogo um ano inteiro, sem pegar no livro e, é claro, sem bases, acabei por apanhar um chumbo de primeira no exame da admissão, pela primeira vez, na prova oral, no Liceu Gil Eanes. O meu pai, que tinha um feitio especial, ficou furioso e regressei imediatamente a S. Nicolau”. Entretanto, em finais de 1945, apesar da fúria, o pai resolve mandá-lo para a Vila da Ribeira Brava estudar a admissão, pela segunda vez, com o explicador Vicente Gominho e, em finais do mês de Maio do ano seguinte, vai para S. Vicente, consegue, finalmente, aprovar o exame, entra no Liceu Gil Eanes e fica hospedado na Pensão Rosarinha, “uma espécie de República, a um preço mais acessível, perto do Palácio e do Salão Mimoso e propriedade de uma senhora de S. Nicolau, tia de Adolfo Osório, pai de Victor Osório”.
Em 1953, termina, no Liceu Gil Eanes, o então 7º ano, com notas normais e prossegue os estudos em Portugal, na Escola Superior de Belas Artes, graças a uma bolsa do Fundo Pedagógico do Liceu Gil Eanes que lhe é oferecida, “quiçá, em reconhecimento da minha habilidade para o desenho que nasce ainda criança e antes da escola primária”. Seis anos depois, em 1959, Pedro Gregório termina a Arquitectura, devendo, no entanto, apenas preparar e defender a respectiva monografia, através de estágio. Assim, de regresso a Cabo Verde, nesse ano, estagia no Serviço de Obras Públicas, e, em 1962, vai ao Porto a fim de defender a monografia preparada durante o estágio. Definitivamente licenciado, volta à Praia e trabalha no Serviço Federativo das Câmaras Municipais, durante algum tempo, o único arquitecto cabo-verdiano, na altura.
Perante a falta de professores no Liceu Adriano Moreira, Pedro Gregório, mediante contrato firmado com aquele estabelecimento de ensino liceal, em 1960, lecciona a cadeira de Desenho, durante cerca de 11 anos intercalares, até 1971, ano em que ano abandona definitivamente a actividade docente. A 22 de Abril de 1968, é vogal do Conselho Legislativo da Província de Cabo Verde, ao mesmo tempo que se dedica à sua actividade profissional principal, a arquitectura. Entretanto, em Novembro de 1969, é nomeado Vice-Reitor desse mesmo estabelecimento de ensino liceal e, um ano depois, “não continua no cargo”, na sequência de um incidente que se verificara na abertura solene daquele ano lectivo, na presença do Governador da Província, Sacramento Monteiro, “que se retirou da sala, em protesto do tom crítico da minha intervenção”.
A partir de 1971, trabalha, de forma intercalada, no sector privado, por conta própria, e no Estado, até 2014, quando se aposenta. Apesar da sua actividade profissional virada essencialmente para a arquitectura e a docência, partilhada entre os sectores público e privado, durante várias décadas, Pedro Gregório, casado, por procuração, com D. Maria Alzira Dias Correia, natural do Porto, de ascendência luso-cabo-verdiana,e pai de 7 (sete) filhos, sempre manifestou interesse pela literatura (poesia e contos) e, de forma especial, pela música, expressa na arquitetura, enquanto forma de arte visual, através do seu evidente sentido rítmico, melódico e harmónico.
Texto originalmente publicado na edição impressa do expresso das ilhas nº 889 de 12 de Dezembro de 2018.