Em conferência de imprensa com uma dezena de órgãos de comunicação social, de balanço dos dez anos como Presidente da República, Jorge Carlos Fonseca descreveu o teor das chamadas que disse ter recebido desde a detenção de Alex Saab no Sal, em Junho de 2020, a pedido dos Estados Unidos, até à sua extradição, em 16 de Outubro passado.
“Presidente Jorge Carlos Fonseca, veja lá o que pode fazer”, descreveu, sobre os telefonemas recebidos de outros chefes de Estado, "sobretudo" africanos.
“Posso fazer como? Posso fazer nada, o que eu posso fazer é zero”, explicou, sobre a resposta que deu.
E descreveu a posição desses chefes de Estado, mas sempre sem concretizar nomes: “Com posições mais ou menos favorável, à partida, para a libertação de Alex Saab, uns até me invocavam que tinham sido contactados pelo Presidente venezuelano”.
Alex Saab, 49 anos, foi detido pela Interpol e pelas autoridades cabo-verdianas em 12 de Junho de 2020, durante uma escala técnica no Aeroporto Internacional Amílcar Cabral, ilha do Sal, com base num mandado de captura internacional emitido pelos Estados Unidos da América - que o consideram testa-de-ferro do Presidente da Venezuela, Nicolás Maduro - numa viagem para o Irão em representação da Venezuela, com passaporte diplomático, enquanto ‘enviado especial’ do Governo venezuelano.
A detenção do empresário, de nacionalidade colombiana, colocou Cabo Verde no centro de uma disputa entre o regime de Maduro, que alega as suas funções diplomáticas aquando da detenção, e a Presidência norte-americana, bem como irregularidades no mandado de captura internacional e no processo de detenção.
Jorge Carlos Fonseca explicou a ausência de intervenção por ser um dossiê que “entrou numa área de avaliação que é uma área judiciária e judicial”, que neste caso passou pelas várias instâncias judiciais, até à recusa do último recurso da defesa de Alex Saab pelo Tribunal Constitucional de Cabo Verde.
“Num estado de direito democrático como é o nosso, um Presidente da República, mas também um primeiro-ministro ou um ministro da Justiça, não pode ter nenhum tipo de influência sobre o destino desse dossiê. Isso eu disse a homólogos meus”, afirmou o chefe de Estado, em funções até à posse em 09 de Novembro do novo Presidente da República, José Maria Neves, eleito em 17 de Outubro.
Washington pediu a extradição, acusando Saab de branquear 350 milhões de dólares para pagar actos de corrupção do Presidente venezuelano, através do sistema financeiro norte-americano.
Alex Saab está agora a ser julgado nos EUA por sete acusações de lavagem de capitais e uma de conspiração para cometer o crime.
Questionado sobre eventuais impactos negativos do processo na imagem de Cabo Verde, Jorge Carlos Fonseca, recusou essa ideia: “Eu tenho dúvidas em relação a isso”.
Admite que nos últimos meses foram muitas as declarações e petições internacionais criticando as autoridades cabo-verdianas pela detenção de Alex Saab, para efeitos de extradição, mas também “no sentido contrário”.
Garantiu que o caso foi abordado em “praticamente todas as reuniões semanais” com o primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, embora sem qualquer poder de intervenção.
“Independentemente da minha posição pessoal em relação à gestão do processo, global, a partir do momento em que o dossiê entra nas instâncias judiciárias, o Presidente da República absolutamente nada podia fazer”, concluiu Jorge Carlos Fonseca.
Um avião ao serviço do Departamento de Justiça norte-americano partiu em 16 de Outubro da ilha do Sal, onde Alex Saab estava detido desde Junho de 2020, com destino aos EUA.
O Ministério da Justiça disse no dia seguinte que recebeu "garantias" dos EUA de que o empresário colombiano terá "um processo justo e equitativo" e que "não será condenado a penas que não existam no ordenamento jurídico cabo-verdiano, designadamente a pena de morte, pena de prisão perpétua, a tortura, tratamento desumano, degradante ou cruel".
Em protesto contra a extradição, que Caracas diz ser um sequestro, o Governo venezuelano suspendeu as negociações com a oposição que decorriam no México, com a mediação da Noruega.
Além disso, poucas horas após a partida de Saab de Cabo Verde com destino aos EUA, as autoridades venezuelanas detiveram novamente seis executivos da Citgo, a filial norte-americana da Petróleos de Venezuela, incluindo cinco cidadãos norte-americanos, que estavam até aí em prisão domiciliária.