“Que haja a coragem política para dar início a uma verdadeira reforma do ensino em Cabo Verde”

PorAntónio Monteiro,12 jan 2025 9:50

Fausto do Rosário, professor e activista cultural
Fausto do Rosário, professor e activista cultural

Fausto do Rosário perspectiva que 2025 será um ano pontuado por confrontos e debates acesos, apelando, entretanto, aos actores políticos que se cinjam aos parâmetros da ética e da cidadania. Condecorado, em 2019, pelo Presidente da República com a Medalha de Mérito – Primeira Classe - pelos 40 anos dedicados à docência, Fausto do Rosário aplaude o novo PCFR dos professores alegando, porém, que só terá relevância significativa “se se atender a remoção doutras “pedras no caminho”, como a progressão na carreira, os incentivos e outras compensações que vemos noutras classes e que nos fazem sentir como se fossemos filhos de um deus menor”. Instado a antecipar a escolha da Palavra do Ano 2025, Fausto do Rosário não hesitou muito: SOLIDARIEDADE. “Foi assim que chegamos até aqui e, para mim, este é o maior valor do nosso povo”.

Enquanto cabo-verdiano e munícipe como perspectiva o ano de 2025?

Será um ano difícil e desafiante, marcado desde já pelas recentes eleições autárquicas e pela proximidade das legislativas. Nesse contexto não será difícil imaginar que seja pontuado por confrontos e debates acesos. Que, todavia, devem cingir-se aos parâmetros da ética e da cidadania. Por outro lado, o mundo global em que vivemos também se mostra conturbado e difícil. Que 2025 seja, como desejei na minha página nas redes sociais, de muita paz e também com muita saúde. Se se me perguntassem qual a imagem forte que guardo de 2024, responderia ser a de centenas de pessoas, diariamente, a porta do Banco de Urgência e do Laboratório do Hospital Regional São Francisco de Assis, afectadas pela “Dengue”.

E enquanto professor e activista cultural?

Enquanto professor, que a burocracia que tanto tem afectado a classe docente quer no seu processo de progressão como no da reforma seja aligeirada permitindo um exercício profissional mais digno e melhor reconhecido. Que haja a coragem política para, efetivamente, dar início a uma verdadeira reforma do ensino em Cabo Verde, num debate envolvendo toda a sociedade. Como activista cultural espero ver, da parte das entidades locais e nacionais, o reconhecimento das “Festas de Bandeira” como Património Nacional e um Regulamento que, sem cercear ou entravar o desenvolvimento da Cidade de São Filipe, permita defender e preservar o Centro Histórico. Como está, e assim continuando, dificilmente poderemos justificar e continuar a merecer tal estatuto. E gostaria de ver retomado o processo de candidatura de Chã das Caldeiras a Património da Humanidade.

O PCFR dos professores foi aprovado na generalidade, em finais de Dezembro com um aumento médio de 16%. Esta medida é suficiente para serenar a conflitualidade social da classe docente com o governo?

É um aumento significativo que deve ser aplaudido, mas que só terá efectivo significado se se atender a remoção doutras “pedras no caminho”, como a progressão na carreira, os incentivos e outras compensações que vemos noutras classes e que nos fazem sentir como se fossemos filhos de um deus menor. Será um longo e continuado processo de redenção para corrigir um não menos longo processo de décadas de olvido ou menor atenção. Nessa perspectiva, a conflitualidade continuará a existir, saudando-se até desde que as partes tenham a capacidade de diálogo e flexibilidade suficientes para encontrar consensos que as satisfaçam.

Nesta conflitualidade a classe docente põe o foco mais na questão salarial e menos na qualidade do ensino que, como afirmou um conferencista em finais de Outubro: Cabo Verde arrisca-se a ter analfabetos com a sexta classe. Acha que no contexto actual, caracterizado por rápidas transformações tecnológicas, sociais e culturais torna-se necessário repensar o sistema educativo cabo-verdiano?

Não é só necessário, como imperativo. De outro modo ficaremos, se é que já não estamos, na estação da aldeia global, vendo passar o comboio do futuro. Gualberto do Rosário, num elucidativo artigo recente, aflorou de forma muito inteligente e clara esta questão. Subscrevo as grandes linhas por ele propostas. Citando algumas passagens: “É preciso apostar numa verdadeira reforma pedagógica e dos conteúdos científicos da educação. (…) Neste domínio e num país como o nosso, espacialmente fragmentado, a educação à distância deveria ser prioridade, como forma de se conseguir o salto pedagógico…”; “É preciso e urgente promover a descentralização, deixando às instituições descentralizadas do Estado (digo descentralizadas e não desconcentradas) a competência para gerir as escolas…”; “É fundamental que o Estado aposte, promova e assuma a educação privada como vector fundamental da política do desenvolvimento do sistema educativo, caminho seguro para a melhoria da qualidade…”.

Qual será, para si, a Palavra do Ano 2025?

Com toda a certeza, SOLIDARIEDADE. A nossa capacidade de resistir como “Flagelados do Vento Leste” de pouco ou nada teria servido se à mesma não tivéssemos juntado a de sermos solidários. Foi assim que chegamos até aqui e, para mim, este é o maior valor do nosso povo: SER SOLIDÁRIO!

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1206 de 08 de Janeiro de 2025. 

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Autoria:António Monteiro,12 jan 2025 9:50

Editado porJorge Montezinho  em  12 jan 2025 15:18

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