Documentos relevados esta semana apontam para o possível uso indevido de recursos financeiros do Estado angolano em benefício dos negócios de Isabel dos Santos.
“Estas coisas acabam com a narrativa de Isabel dos Santos como uma empresária de sucesso, que fez o seu próprio sucesso, trabalhando com o sector privado, não beneficiando de dinheiros públicos. não beneficiando do facto de ser filha de quem é”, comenta Carlos Rosado ao Panorama 3.0, da Rádio Morabeza.
“O que estes documentos vêem revelar é que os principais empreendimentos de Isabel dos Santos foram feitos com recursos públicos, empréstimos de empresas públicas e privadas, por exemplo a Unitel, de que ela tem apenas 25%”, acrescenta o jornalista.
Um consórcio internacional de jornalismo de investigação revelou domingo mais de 700 mil ficheiros que detalham alegados esquemas financeiros da filha mais velha do ex-Presidente de Angola e do marido desta, Sindika Dokolo.
Ao longo de vários meses, 350 gigabytes de informação, relativos a negócios efectuados entre 1980 e 2018, foram analisados por jornalistas em todo o mundo.
Na quarta-feira, Isabel dos Santos foi constituída arguida em Angola, por alegada má gestão e desvio de fundos da petrolífera estatal Sonangol. O anúncio foi feito pelo procurador-geral, Heldér Pitta Grós. As informações recolhidas pela investigação Luanda Leaks detalham, nomeadamente, um suposto esquema de ocultação que lhe terá permitido desviar mais de 100 milhões de dólares para o Dubai. Também demonstram que, no espaço de algumas horas, no dia seguinte ao seu afastamento da liderança da petrolífera, a conta da Sonangol no EuroBic, em Portugal, ficou com saldo negativo.
Mesmo salvaguardando a presunção de inocência da empresária, Carlos Rosado assinala as consequências das revelações na reputação internacional de Dos Santos.
“A principal consequência é a reputação internacional de Isabel dos Santos. Pode ser verdade, pode ser mentira, tudo indica que seja verdade, mas a informação saiu em todo o lado e, portanto, em todas as geografias onde houver mínimo de compliance, e antes que tudo isto se esclareça, acho que ninguém vai querer fazer negócios com Isabel dos Santos”, antecipa.
"Isto pode ser o princípio do fim de um império que Isabel dos Santos criou”, acredita.
O jornalista angolano não está surpreendido. As revelações dos últimos dias confirmaram uma percepção há muito existente.
“Sabia-se que se o pai de Isabel dos Santos saísse do poder e se entrasse alguém que não fosse uma mera marioneta do presidente anterior, havia uma probabilidade elevadíssimo de isto acontecer”, remata.
Desde que foram conhecidos os dados da investigação Luanda Leaks, a empresária colocou em marcha um plano de venda de activos em Portugal, país onde o Ministério Público está atento ao caso, mas ainda não anunciou formalmente a abertura de qualquer investigação.
Esta sexta-feira, foi anunciada a intenção de venda da participação que detém na Efacec, correspondente a 67,2% do capital. Em curso, estão também as negociações para a alienação dos 42,5% detidos no EuroBic.
Por cá, o banco BIC Cabo Verde é a instituição visada na fuga de informação. Segundo o Consórcio de Jornalistas, Isabel dos Santos terá alegadamente usado o banco para transferir milhões de dólares em pagamentos a empreiteiros chineses e europeus que trabalham em projectos de construção em território angolano. O Banco de Cabo Verde já anunciou que está a analisar a situação.
O ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Filipe Tavares, disse esta quinta-feira que o país está disponível para colaborar com as autoridades Angolanas.
Já na segunda-feira, o primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, tinha dito que as revelações não interpelam o Governo, que tem vários investimentos no país, o mais importante dos quais a empresa de telecomunicações Unitel T+.
A entrevista completa a Carlos Rosado pode ser ouvida esta sexta-feira, às 19h00, na Rádio Morabeza.