Operadoras confiantes no futuro

PorAndre Amaral,23 jan 2022 7:27

As duas operadoras de telecomunicações existentes no mercado nacional estão confiantes para o futuro próximo. CVTelecom e Unitel T+ apostam no digital para encontrar novos clientes e expandir mercados.

O novo contrato de concessão do sector das telecomunicações surge “numa altura em que o país aposta da economia digital” e “é sem dúvida um dos grandes desafios” que Cabo Verde enfrenta, começa por dizer Inoweze Ferreira, Director-Geral da UNITEL T+, em entrevista ao Expresso das Ilhas.

“Acredito que os decisores políticos tenham tido o cuidado de preservar a concorrência leal do mercado das telecomunicações. A UNITEL sempre defendeu que não é aceitáveis atitudes proteccionistas num mercado que se pretende dinâmico, inovador e indutor de uma transição para o Digital. A concorrência traz inovação, traz preços competitivos e acima de tudo traz desenvolvimento”, acrescenta Inoweze Ferreira avisando que, no entanto, a empresa que dirige “já não tem condições de continuar no mercado caso não se assuma de facto um ambiente verdadeiramente concorrencial”.

“Cristalizar atitudes proteccionistas nesta altura colocaria em causa a ambição Digital de Cabo Verde. Economia Digital não rima com Monopólios “de facto”. O mercado tem mostrado desequilíbrios nos últimos anos que claramente afectaram a nossa empresa. Os próximos meses serão decisivos para entendermos realmente o impacto do contrato recentemente renovado”, aponta Inoweze Ferreira.

“Este contrato traz mais responsabilidades à CVT do que vantagens”, afirma por seu lado o PCA da CVTelecom (CVT), João Domingos Correia, “mas nós olhamos para essas responsabilidades como um desafio e uma oportunidade de negócio”.

O contrato agora assinado entre a empresa e o Estado prevê que a CVTelecom faça investimentos elevados na rede de telecomunicações existente, “porque parte substancial da rede vai ter de ser substituída e nós vamos ter de trocar cobre por fibra. Hoje em dia a comunicação é internet e dados, não é telefone fixo e voz”, lembra João Domingos Correia.

O novo contrato de concessão tem uma vigência de 20 anos estabelece que a CVT tem “de criar uma unidade autónoma grossista para servir os operadores tanto internos como os de fora, em pé de igualdade”.

“Muita coisa muda neste contrato”, reforça o PCA da CVTelecom que lembra que aquando da privatização, em 1995, o “Estado não quis criar uma empresa para tomar conta daquilo que são as suas responsabilidades e decidiu concessionar, na altura, as infraestruturas básicas. E o que eram essas infraestruturas? Um conjunto reduzido de rede de cobre que ligavam 25 mil telefones fixos com postes, centrais telefónicas, satélite para transmissão de voz a nível internacional e meio anel interilhas. Era isso que havia”.

Desde então, aponta João Domingos Correia, a empresa investiu “cerca de 35 bilhões de escudos na rede”.

“Essa rede completamente renovada deveria passar para o Estado no fim da concessão caso nós não continuássemos com essa concessão. Mas para além daquilo que investimos distribuímos ao Estado 42 bilhões de escudos de receitas sob forma de renda, de dividendos e taxas”, aponta.

5G

Há pouco mais de dois anos Cabo Verde anunciou a entrada da tecnologia 4G no país após quase uma década de vigência das comunicações de terceira geração.

Qualquer das operadoras entende que ainda é cedo para que o passo para o 5G seja dado.

“O 5G não é um próximo passo da CVT, vai ser o próximo passo do país”, começa por explicar João Domingos Correia que defende que “o 5G é algo mais industrial, não é para o utilizador comum é, sobretudo, para a indústria”.

Nessa perspectiva, em termos de rentabilidade, “ainda não se justifica avançar para o 5G” tendo em conta a dimensão da nossa economia e “dado o reduzido tempo que temos relativamente ao investimento feito no 4G”.

No entanto, aponta o PCA da CVT, cabe “ao governo uma palavra a dizer”.

“Nós dizemos que é importante para o país e convém que o governo decida. No âmbito dessa decisão do governo nós iremos avaliar porque não terá retorno imediato e as operadoras existentes em Cabo Verde são operadora privadas. Sendo privadas não podem arriscar investimentos onde não há retorno”.

Para João Domingos Correia o executivo tem de definir um conjunto de condições “para que as operadoras se possam associar ao governo nesse desiderato, porque é muito para o desenvolvimento do país”.

O PCA recorda que as “conversações já existem, já houve uma abordagem no passado sobre a vontade de se querer fazer, mas ainda não há dados sobre a mesa”.

Inoweze Ferreira também tem o mesmo ponto de vista. “É nosso entendimento que Cabo Verde ainda está numa fase embrionária de exploração do 4G. Acreditamos que os próximos 5 anos serão de consolidação do 4G no mercado cabo-verdiano”.

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Para o Director-geral da UNITEL T+ “o próprio 5G ainda se encontra numa fase de muitas expectativas, mas os “casos de uso” disponíveis ainda não são os que realmente poderão introduzir mudanças estruturais em Cabo Verde”. Para a UNITEL “apostar em 5G nesta fase somente fará sentido para projectar a ambição de Cabo Verde rumo ao digital. Nesse contexto, a UNITEL entende que apostar nesta tecnologia teria que necessariamente ser enquadrada numa estratégia Nacional onde um ecossistema de incentivos teria que estar disponível para o efeito”.

Inoweze Ferreira defende, por isso, que “há que garantir que o ciclo de investimentos adequados à realidade do país. Há que dar tempo às empresas para recuperarem os investimentos feitos para que possam ter fôlego financeiro e assim terem sustentabilidade para novos investimentos”.

Peso das telecomunicações no PIB

Recentemente o primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, defendeu o objectivo de a Economia Digital contribuir com 25% do Produto Interno Bruto (PIB), no âmbito da “ambição” de transformar o arquipélago numa plataforma digital em África.

“Na Economia Digital a nossa ambição é forte”, disse Ulisses Correia e Silva, ao intervir no Palácio do Governo, na Praia, na sessão de assinatura do novo Contrato de Concessão do Serviço Público de Comunicações Electrónicas por 20 anos, com o grupo estatal Cabo Verde Telecom.

Destacando que Cabo Verde quer ser líder na implementação da rede móvel 5G em África, depois de já ter concluído em 2021 a transição das emissões de televisão do sinal analógico para o digital (TDT), Ulisses Correia e Silva apontou, sem mencionar prazos, a meta de a Economia Digital gerar tanta riqueza como actualmente o turismo (25% do PIB do país), tendo em conta os vários investimentos públicos na instalação de uma plataforma digital e uma zona económica exclusiva para o sector, nas ilhas de Santiago e de São Vicente.

“Passarmos dos 6% da participação da Economia Digital no PIB para 25%. Nós temos possibilidade de o fazer, desde que tenhamos foco, assertividade e haja compreensão também da sociedade sobre a importância da Economia Digital na vida das pessoas, no crescimento e no desenvolvimento da economia”, frisou.

“É uma meta ambiciosa, mas eu costumo dizer que o prémio é reservado àqueles que são ambiciosos”, comenta João Domingos Correia.

“Podemos lá chegar se o Hub digital vier a funcionar em pleno e eu acredito que teremos concorrência, sabemos que estamos num mercado aberto. O problema maior é quando não se trabalha cá e se consomem recursos de Cabo Verde como acontece com as operadoras OTT (Over the Top). Não trabalham cá, não pagam impostos cá, mas levam recursos de cá. Cabe ao governo e ao regulador encontrar esses mecanismos”.

“Eu diria que o primeiro-ministro tem boa vontade e que havendo um esforço conjugados dos operadores, do regulador e do governo podemos fazer com que o sector venha a contribuir muito mais para o PIB do que aquilo que tem feito.

Hoje em dia já temos vários players e estou em crer que a era digital, com o contributo do Ella Link, poderá trazer muito mais recursos a Cabo Verde”, acrescenta o PCA da CVT.

Já Inoweze Ferreira defende que a afirmação de Ulisses Correia e Silva “foi uma evidência clara da vontade política de abraçar o Digital”.

“É nosso entendimento que esse sinal aponta inequivocamente para um sector de telecomunicações vibrante e inovador. São estas mensagens que nos estimulam a prosseguir a nossa batalha por um ecossistema adequado às ambições de um Cabo Verde digital”.

“Com um mercado realmente nivelado e com políticas que permitam aos operadores de Telecomunicações realmente canalizar os seus esforços para contribuir para a digitalização do país, apoiando startups no seu processo de afirmação do sector TIC e introduzindo tecnologias inovadoras, acreditamos que realmente podemos ajudar a materializar a visão de um Cabo Verde Digital”.

Impacto da pandemia

A pandemia colocou fortes condicionantes a todos os sectores de actividade e o sector das telecomunicações não foi excepção.

O PCA da CVT aponta que num ano a empresa registou perdas de “cerca de 80% daquilo que são as receitas empresariais”.

Quantificando, João Domingos Correia aponta que a CVT perdeu “120 mil contos num ano. Estamos a falar essencialmente do sector hoteleiro no Sal e Boa Vista. Como esse sector fora do Sal e da Boa Vista tem pouca expressão não fizemos questão de quantificar”, o que indica que os prejuízos terão sido um pouco maiores.

Inoweze Ferreira também destaca que a sua empresa perdeu “uma grande fatia da nossa receita, especialmente no sector Turístico”.

No entanto, destaca, a “Unitel fez um grande esforço pra preservar postos de trabalho, instituiu o teletrabalho e não recorremos ao lay-off. A área comercial não parou...reinventou a sua abordagem comercial, a sua forma de fazer chegar as nossas ofertas aos nossos clientes residenciais e empresariais, adequados a esta nova conjuntura”. 

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1051 de 19 de Janeiro de 2022. 

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Autoria:Andre Amaral,23 jan 2022 7:27

Editado porA Redacção  em  16 out 2022 23:28

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