Novo compacto da MCC para Cabo Verde visa a integração económica regional

PorJorge Montezinho,24 dez 2023 8:52

Não há duas sem três, depois dos pacotes de 2005 e 2012, há mais um financiamento da agência norte-americana a caminho do arquipélago. Depois dos apoios para aumentar o crescimento económico do país e reduzir a pobreza – o primeiro – e para melhorar infra-estruturas e fazer reformas políticas e institucionais para fortalecer os direitos de propriedade e aumentar o acesso à água potável e ao saneamento – o segundo – este terceiro compacto tem por objectivo a integração económica regional.

“Ainda não há montantes, no momento próprio serão definidos, agora teremos de fazer as fases que são necessárias para podermos identificar bons projectos de âmbito nacional e regional africano, termos uma boa equipa e depois iniciar as negociações”, disse o Primeiro-ministro, quando se soube que o país tinha sido escolhido para receber mais um compacto da Millennium Challenge Corporation (MCC), agência independente, criada pelo Congresso dos EUA em 2004 e separada do Departamento de Estado.

“O que significa que nos próximos tempos iremos trabalhar no sentido de fazer as fases seguintes, que é indicar um coordenador nacional do programa que irá trabalhar directamente com o Millenium Challenge Corporation e toda a preparação de projectos para podermos apresentar”, explicou Ulisses Correia e Silva.

Em comunicado, o Conselho de Administração da MCC avançou que, na reunião trimestral de 13 de Dezembro “seleccionou Cabo Verde, antigo parceiro do compacto, como elegível para desenvolver um pacto regional em reconhecimento ao claro compromisso do país com a governação democrática e os seus significativos desafios de desenvolvimento e redução da pobreza”. Com esta nova parceria, a MCC vai apoiar Cabo Verde na geração de crescimento económico através de uma integração mais profunda com a região da África Ocidental.

O MCC também seleccionou a Tanzânia e as Filipinas para desenvolver programas mais pequenos, concebidos para apoiar reformas políticas e institucionais que tratam as restrições ao crescimento económico.

MCC I

Os compactos da MCC – nome dado aos programas da agência – financiam e dão assistência, por tempo limitado, a países que cumprem padrões rigorosos de boa governação, combate à corrupção e respeito pelos direitos democráticos.

Em Julho de 2005, a Millennium Challenge Corporation (MCC) e o Governo de Cabo Verde assinaram um pacto de cinco anos no valor de 110 milhões de dólares. Na altura, o Conselho de Administração da MCC escolheu Cabo Verde devido ao seu “forte compromisso com os princípios democráticos, a governação estável e responsável e o crescimento económico”.

O compacto MCC-Cabo Verde de 2005 foi concebido para melhorar o clima de investimento do país e reformar o sector financeiro; reforçar as infra-estruturas para apoiar o aumento da actividade económica e proporcionar acesso aos mercados, emprego e serviços sociais; aumentar a produtividade agrícola e aumentar o rendimento da população rural; e realizar as reformas políticas necessárias para o crescimento económico sustentado. Centrou-se nas ilhas de Santiago, Santo Antão, Fogo e São Nicolau.

Estradas, portos e navios inadequados dificultavam o acesso aos serviços sociais e às oportunidades de emprego em Cabo Verde e restringiam severamente as actividades económicas, como o turismo, a indústria transformadora e a produção agrícola. A rede rodoviária de Cabo Verde cobria 1.350 km, em nove ilhas. A falta de investimento deixou a rede básica incompleta e a ausência de manutenção adequada levou à deterioração.

O Porto da Praia era o porto mais movimentado do país, representava cerca de 50 por cento do volume total do tráfego portuário, mas sofria de operações de movimentação de carga ineficientes, graves congestionamentos nos terminais e serviços inadequados. Estes problemas eram um constrangimento ao desenvolvimento económico e à circulação eficiente de pessoas e bens em Cabo Verde.

No final do período de cinco anos obrigatório do pacto, o Projecto de Infra-estruturas financiou a construção de quatro pontes na ilha de Santo Antão, reabilitou duas estradas muito movimentadas e reconstruiu uma estrada rural que ligava uma comunidade agrícola e piscatória isolada à principal rede rodoviária de Santiago. Foram também realizadas melhorias no Porto da Praia para modernizar as instalações e aumentar a capacidade, reabilitando o Cais 2 e construindo uma nova zona de carga e estrada de acesso. A segunda fase de melhorias portuárias, financiada pelo Governo de Cabo Verde, incluiu uma extensão do Cais 1 e um pátio de contentores, dragagem do porto e edifícios adicionais de áreas de carga.

Já dentro do Projecto de Gestão de Bacias Hidrográficas e Apoio Agrícola, foram construídos 28 reservatórios para servir 101,2 hectares de terras aráveis irrigadas por sistema gota-a-gota e foram construídos 48 diques de captação, retenção e controlo para captar água, recarregar lençóis freáticos e diminuir a erosão do solo. Além disso, foi levantado o embargo de 25 anos às exportações agrícolas inter-ilhas de Santo Antão porque, juntamente com a investigação sobre controlo de pragas, o pacto financiou a formação de 31 inspectores fitossanitários e zoossanitários.

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Trata-se de uma grande vitória para a Nação cabo-verdiana no seu todo e, em particular, para o Governo” - José Maria Neves, Presidente da República

O projecto também construiu e equipou um centro pós-colheita na ilha de Santo Antão, prestando serviços de formação agrícola, embalagem, refrigeração e inspeção; e construiu três centros de extensão rural que deram aos agricultores acesso à Internet e materiais de formação técnica com informações de mercado e orientação sobre práticas agrícolas melhoradas.

O compacto treinou ainda 553 agricultores de subsistência que produziam culturas hortícolas e frutícolas de alto valor; e ajudou 225 agricultores e pequenas empresas do agronegócio a obter crédito.

Finalmente, os investimentos reforçaram a capacidade das instituições de microfinanciamento e lançaram as bases para a primeira agência de crédito privada do país.

MCC II

Em 2012, a Millennium Challenge Corporation associou-se outra vez a Cabo Verde, para implementar um novo compacto de cinco anos, no valor de 66,2 milhões de dólares, concebido para reduzir a pobreza através do crescimento económico. Este compacto combinou melhorias de infra-estruturas com reformas políticas e institucionais para fortalecer os direitos de propriedade e aumentar o acesso à água potável e ao saneamento.

Para cumprir os objectivos do acordo, o Governo de Cabo Verde aprovou com sucesso mais de 50 leis, fechou instituições ineficazes e criou novas agências baseadas em princípios comerciais sustentáveis, empreendendo reformas políticas e institucionais, tentando novas abordagens e dimensionado intervenções.

Ao desenvolver este compacto, a análise das restrições do país ao crescimento económico revelou duas questões principais: acesso deficiente a água e saneamento e a falta de uma fonte fiável de informação sobre os direitos de propriedade. Atenuar estes dois constrangimentos era fundamental para o crescimento do sector do turismo em Cabo Verde e ambos eram componentes importantes da agenda de transformação económica do Governo, que visava reduzir a dependência do país da ajuda externa e das remessas, aumentar a mobilização do investimento do sector privado e melhorar a gestão dos recursos internos.

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É um grande acontecimento, uma distinção para o país e a sua democracia, desempenho económico e credibilidade externa - Ulisses Correia e Silva, Primeiro-ministro

No Projecto de Abastecimento de Água, Saneamento e Higiene, durante o desenvolvimento compacto, o Governo e a MCC determinaram que o sector sofria de supervisão fragmentada, prestação de serviços ineficiente e fraco planeamento e implementação de infra-estruturas. Para enfrentar estes desafios, o Projecto de Água, Saneamento e Higiene foi concebido para estabelecer uma base institucional financeiramente sólida, transparente e responsável para a prestação de serviços de água e saneamento às famílias e empresas cabo-verdianas. A abordagem do projecto para melhorar o desempenho do sector baseou-se numa estratégia tripartida: (1) reformar as instituições políticas e reguladoras nacionais; (2) transformar serviços públicos ineficientes em entidades empresariais independentes que operam numa base comercial; e (3) melhorar a qualidade e o alcance das infra-estruturas de água e saneamento.

No final do compacto, onze dos 12 objetivos foram cumpridos. O compacto sensibilizou 49.119 pessoas sobre as melhores práticas de higiene sanitárias e excedeu a sua meta de 24.000 pessoas. Foram feitas 3.557 ligações de água, de um total de 3.739 previstas. Foram efectuadas 2.277 ligações sanitárias, canalizações e fossas sépticas e foram construídos mais de 200 quilómetros de condutas de água e saneamento, bem como 33 reservatórios e 48 estações elevatórias.

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Este novo compacto será um catalisador para acelerar o nosso progresso de desenvolvimento - Vanuza Barbosa, Secretária-Geral Adjunta do MpD

Já o Projecto de Gestão de Terras para Investimento surgiu porque, antes do compacto, Cabo Verde não tinha um arquivo central de informações fundiárias, o que levava a uma confusão generalizada sobre a propriedade e os limites dos prédios, que muitas vezes resultava no atraso ou cancelamento de projectos de investimento públicos e privados. O Projecto de Gestão de Terras para Investimento da MCC teve como objectivo melhorar o clima de investimento de Cabo Verde, apoiando a criação de uma fonte única e definitiva de informações sobre direitos e limites fundiários. Ao melhorar o ambiente jurídico, institucional e processual, o compacto procurou criar condições para uma maior fiabilidade da informação fundiária, maior eficiência na administração e transacções fundiárias e reforço da protecção dos direitos fundiários.

O processo de clarificação de direitos e limites no Sal demorou cerca de dois anos a ser concluído e resultou na inscrição de todas as parcelas da ilha numa base de dados de terras (ou seja, num cadastro). Isto representou quase 19.400 parcelas de terra incluídas no LMITS – o Sistema de Informação e Transacção de Gestão de Terras (LMITS), foi um software desenvolvido, na altura, pela NOSi.

No final do compacto, os direitos sobre mais de 11.000 parcelas, de um total de 11.250 elegíveis, tinham concluído o processo de registo no Registo Predial (Registo de Propriedade). Depois do projecto-piloto bem-sucedido no Sal, a actividade expandiu-se para outras três ilhas. Embora tenham sido feitos muitos progressos no mapeamento dos direitos fundiários nas outras ilhas, as metas de registo não foram cumpridas devido ao tempo insuficiente para concluir todas as actividades, por causa de atrasos na implementação do piloto do Sal.

Em São Vicente, 16.000 parcelas foram alvo de mapeamento, 12.000 elegíveis para registo. No final do compacto, 4.105 parcelas foram mapeadas e incluídas no LMITS, mas apenas 2 parcelas foram registadas.

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É razão de satisfação porque Cabo Verde anda atrás de financiamento para melhorar a qualidade de vida dos cabo-verdianos - Rui Semedo, Presidente do PAICV

Na Boa vista, mais de 6.400 parcelas foram alvo de mapeamento, das quais pouco mais de 4.800 eram elegíveis para registo. No final do compacto, 5.290 parcelas foram mapeadas e incorporadas ao LMITS e 50 parcelas foram cadastradas.

No Maio, 8.000 parcelas foram alvo de mapeamento, 6.000 elegíveis para registo. No final do compacto, mais de 8.700 parcelas foram mapeadas e incorporadas ao LMITS e 298 parcelas foram cadastradas.

Em 2017, no encerramento do II compacto, Robert Blau, então vice-presidente da Millennium Challenge Corporation, disse que o projecto tinha sido implementado com “elevado padrão de qualidade” e alcançara resultados que iam para além dos que tinham sido previstos.

A MCC está presente em 51 países, 26 deles em África, e em 4 que fazem parte da CPLP: Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Moçambique e Timor-Leste. 

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1151 de 20 de Dezembro de 2023.

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Autoria:Jorge Montezinho,24 dez 2023 8:52

Editado porAndre Amaral  em  8 mai 2024 23:28

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