Endividamento das empresas à banca é um risco, diz o BCV

PorJorge Montezinho,11 mai 2024 9:55

Apesar do sector bancário mostrar um crescimento contínuo – análise do Banco Central – são oito os riscos e as vulnerabilidades identificados e que podem ter impacto na estabilidade financeira do país.

Enquadramento externo, preço das matérias-primas, dupla concentração na estrutura do sector bancário, maior diferencial de taxa de juros com a Área Euro, estes são alguns dos riscos reconhecidos pelo boletim de estabilidade financeira, de Abril, publicado pelo Banco de Cabo Verde.

Risco a risco, o BCV explica que um enquadramento externo marcado por uma fraca dinâmica do crescimento económico global constitui um factor de vulnerabilidade da economia nacional; já um eventual aumento dos preços das matérias-primas, devido a choques geopolíticos e climáticos, poderá constranger o rendimento disponível das famílias e a actividade das empresas nacionais, representando um risco à sua capacidade de servir a dívida; também referido é o facto da estrutura do sector bancário evidenciar dupla concentração: do lado do activo, exposição elevada ao risco de crédito (concentração sectorial e a grandes riscos) e do lado do passivo, expressiva concentração institucional do funding.

Continuando a análise, o Banco Central refere ainda como risco a elevada exposição dos bancos à divida soberana, principalmente através de empréstimos a empresas, públicas e privadas, com garantias públicas; o maior diferencial de taxa de juros com a Área Euro constitui um aumento do risco de saída de capitais do sector bancário nacional; os desafios relacionados com a agenda climática designadamente o climate finance (uma vez que as acções de adaptação e mitigação dos efeitos climáticos colocam pressão adicional nas finanças públicas) e o Climate Information Architecture (que pressupõe a disponibilidade de dados climáticos e sua divulgação); a crescente digitalização dos serviços financeiros oferece inúmeras oportunidades, mas também apresenta desafios para a estabilidade financeira; e a exposição do sistema financeiro ao risco cibernético, justifica as acções de proteção contra eventos de cibercrime e a implementação de medidas de segurança robustas, essenciais para garantir a resiliência do sistema financeiro e manter a confiança.

Sector bancário evidencia um crescimento contínuo

Segundo os dados do boletim, o activo total do sector bancário representou cerca de 126,7% do PIB no final de Novembro de 2023. O crédito total evoluiu positivamente (representou 44,4% do total de ativos), as aplicações em instituições de crédito cresceram (representando 22,5% do total de activos), as aplicações em títulos de dívida aumentaram (com um peso de 21,7% do total de activos).

O aumento dos depósitos de clientes indica, segundo o BCV, a manutenção da confiança dos depositantes na solidez do sector bancário. Os recursos dos bancos, sobretudo depósitos de clientes, evoluíram positivamente (representam mais de 80% dos depósitos totais). Os recursos do Banco Central (4,3% do total do financiamento) e das instituições financeiras (5,1%) diminuíram ligeiramente no balanço dos bancos.

Os indicadores demonstram um fortalecimento da capacidade de solvência do sector bancário. O rácio de solvabilidade – que indica o grau de estabilidade financeira de uma empresa – atingiu 22,6%, no final de Novembro de 2023, devido ao crescimento dos fundos próprios, permanecendo significativamente acima do mínimo regulamentar de 11,25%, o que, sublinha o Banco Central, confirma a robusta capacidade de absorção de perdas do sistema bancário nacional. O aumento dos fundos próprios foi transversal às maiores instituições do sistema, e resultou em grande parte da geração orgânica de capital (via retenção de lucros).

Carteira de crédito

O BCV detectou sinais de deterioração da qualidade da carteira de crédito no terceiro trimestre e de aumento do risco de incumprimento, mas o rácio NPL melhorou no final do ano [os créditos não produtivos (non‑performing loans – NPL) reduzem os rendimentos dos bancos e geram perdas, o que afeta a sua solidez].

A evolução menos favorável da qualidade da carteira de crédito nos três primeiros trimestres do ano, refletiram aumento do crédito em incumprimento e com imparidade. Os sectores de imobiliária e construção, mais fortemente afetados pela crise pandémica, antes beneficiários do regime das moratórias públicas, foram aqueles em que se registaram maiores dificuldades com o cumprimento do serviço da dívida.

Houve redução do nível de cobertura do risco de crédito pelas provisões e imparidades, mantendo-se, no entanto, em patamares confortáveis [Imparidades são perdas de valor que as empresas podem registar na sua contabilidade quando percebem que o valor de um activo diminuiu. Por outras palavras, quando um ativo deixa de ter o valor que a empresa esperava que tivesse, devido a mudanças no mercado ou outras circunstâncias, a empresa pode reconhecer esse custo na sua contabilidade. A imparidade reduz o valor contabilístico do activo e afeta negativamente os resultados e a saúde financeira da empresa. Em contrapartida, a provisão é uma estimativa de uma despesa ou perda futura que a empresa pode enfrentar. No fundo, é uma reserva de recursos financeiros para cobrir possíveis perdas ou despesas futuras].

O BCV regista ainda o aumento dos grandes riscos e ligeira redução da concentração bancária no mercado de crédito. Segundo o boletim, há a assinalar um aumento nos créditos considerados de alto risco, isto é, aqueles com montantes superiores a 10% dos fundos próprios das instituições, os quais representavam 15,3% do crédito total no final de Setembro. Observa-se também uma tendência de ligeira diminuição da concentração bancária no mercado de crédito até o final do terceiro trimestre de 2023, embora o nível de concentração ainda permaneça elevado.

Dados do boletim evidenciam ainda que o sector segurador mantém-se sólido; o contributo positivo do mercado de capitais para o financiamento à economia, apesar da ligeira redução de emissões; e que o índice de estabilidade financeira aponta para o reforço dessa mesma estabilidade financeira, graças à robustez do sector bancário.

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1171 de 8 de Maio de 2024. 

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Autoria:Jorge Montezinho,11 mai 2024 9:55

Editado porAntónio Monteiro  em  6 set 2024 23:24

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