Em Cabo Verde, este assunto veio à baila muito recentemente, não sob forma de crítica à existência do regime de imunidades ou de discussão doutrinária, como noutros países, mas, pela aplicação efetiva do regime legal relativamente aos poucos casos de autorização de levantamento da imunidade parlamentar pela AN a alguns deputados, para responderem em processos judiciais;
Mesmo que seja incipiente, (na verdade, há noticias de apenas três casos de levantamento de imunidade pela AN), o debate público desta matéria é um sinal muito importante, sobretudo, num momento em que a sociedade civil está atenta, pede reformas e mais transparência.
Os críticos do sistema de imunidades defendem que estão hoje ultrapassados os constrangimentos históricos que estiveram na origem das modernas imunidades parlamentares e que se relacionavam com a necessária defesa da autonomia do Parlamento, perante os poderes executivo e judicial;
As imunidades parlamentares, como instrumento de defesa do Parlamento perante os poderes executivo e judicial, mediatizado na pessoa dos deputados, foram fruto da Revolução francesa e das concretas circunstâncias históricas que a envolveram tendo influenciado o direito constitucional contemporâneo.
As imunidades, actualmente, encontram-se constitucionalmente consagradas em vários países, como um modelo de proteção de uma liberdade estatutária dos deputados e como suporte da independência funcional dos Parlamentos, embora com algumas diferenças entre os diversos regimes nacionais.
Vivemos num tempo em que a relação entre políticos e a sociedade civil parece atravessar um momento de alguma tensão. Pode mesmo dizer-se que, um pouco por todo o lado, existe um clima geral de desconfiança de muitos cidadãos em relação aos titulares dos órgãos de soberania e, por essa razão, a existência de um regime constitucional de imunidades, que protege determinadas pessoas que exercem funções em órgãos políticos de soberania, pode, numa abordagem simplista, fazer crer que tais pessoas possuem um estatuto de privilégio face ao comum dos cidadãos.
Desta forma, a suposta crise das imunidades poderá ter como fator explicativo a atual realidade política, vivida da mesma forma, com maior ou menor dimensão, em toda a parte do Globo.
Por essa razão, tem se questionado se, desaparecidos os fundamentos históricos da sua origem e sendo hoje em dia, nos regimes democráticos mais seguros, inquestionável o princípio da separação de poderes, faz sentido a manutenção das imunidades nos atuais quadros jurídico-constitucionais, enquanto um desvio ao princípio da igualdade consagrado em todas as constituições modernas.
Em CV, o nosso Estado de Direito Democrático encontra no princípio da igualdade um dos seus mais básicos e firmes fundamentos materiais.
Com base no princípio da igualdade, é afirmado que todas as pessoas nascem livres e iguais em direitos e deveres, assente numa ideia fundamental de dignidade da pessoa humana (art. 24.º, da CRCV).
A igual dignidade das pessoas tem como consequência a necessidade de aplicação uniforme do direito. Assim, o ordenamento jurídico cabo-verdiano rege-se por um princípio de obrigatoriedade geral da lei penal. Ou seja, a lei deve ser igual para todos os cidadãos, não devendo existir situações de privilégios pessoais que limitem a aplicabilidade da lei penal.
Contudo, a própria Constituição estabelece algumas situações especiais, em que determinadas pessoas poderão ser objeto de tratamento diferenciador por parte da lei penal em razão das funções político-institucionais que exercem. É o regime das imunidades, consagrado constitucionalmente e que atribui, designadamente, aos membros do Parlamento um estatuto jurídico especial, consubstanciando, assim, uma exceção ao direito comum.
Com o regime das imunidades, tal como está configurado pela CRCV, os referidos membros de órgãos de soberania, em concreto os deputados, não ficam isentos de responsabilidade jurídico-penal, isto é, não beneficiam de um regime de impunidade absoluta. Trata-se sim de prerrogativas que são expoentes da independência e dignidade do Parlamento e regem-se segundo determinados princípios.
Mas porque esse regime excepcional das imunidades parlamentares pode dar aparência de uma situação de privilégio face ao cidadão comum, ele deve merecer especial justificação ou fundamentação.
A posição jurídico-constitucional do Deputado assume contornos complexos e exigentes. Atendendo à estrutura da norma do art. 170.º da CRCV, é percetível que as imunidades parlamentares assumem uma especial «notoriedade», no âmbito dos diversos regimes constitucionais das imunidades, devido às suas características específicas e distintivas das demais imunidades constitucionais. Aliás realça-se, desde logo, que o termo imunidade é utilizado, expressamente, pela CRCV, quando se refere aos deputados;
O que se percebe porque de facto são os deputados “que dão corpo ao Parlamento e exprimem a sua vontade; são eles que determinam, pela votação, o carácter vinculativo das suas decisões; são eles que, em representação do povo, titular da Soberania, determinam os caminhos do seu progresso e do seu desenvolvimento nos espaços e no âmbito das competências próprias do Parlamento.
O Parlamento é o lugar por excelência da legitimação do exercício do poder democrático e, por consequência, a figura do deputado acaba por assumir uma posição primordial na atividade parlamentar, razão pela qual lhe é atribuída, pela própria CR a imunidade.
O conceito de imunidade parlamentar pode ser resumido como sendo um estatuto político-constitucional temporário, precário e não renunciável de que gozam os deputados da Nação e que tem como indispensável missão a proteção e garantia do regular funcionamento do Parlamento face aos restantes poderes do Estado;
Na análise desse conceito, é importante salientar que as imunidades não são privilégios, mas sim prerrogativas destinadas a assegurar as condições para o livre e independente exercício das suas funções. Daí que se afirme que as imunidades não visam proteger direta e imediatamente o deputado individualmente considerado, mas sim o conjunto de atos e condutas por ele realizados no exercício das suas funções;
Uma segunda caraterística é que imunidades têm uma natureza temporária e precária. (concernentes ao exercício do mandato).
Em terceiro lugar, a imunidade assume um carácter irrenunciável para o seu titular, uma vez que ela constitui uma garantia objetiva e funcional do próprio mandato democrático. (neste aspeto, a inviolabilidade pode divergir nesta característica, em certos casos).
Por último, quando falamos na indispensável missão de proteção e garantia do regular funcionamento das instituições democráticas face aos restantes poderes do Estado, pretende-se sublinhar dois aspectos:
1. a imunidade é estabelecida no interesse da autonomia, estabilidade e dignificação dos órgãos de soberania, enquanto instituições democráticas legitimadas pelo voto;
2. a imunidade visa preservar a independência dos órgãos políticos de soberania perante outros órgãos como é o caso dos Tribunais (enquanto órgão não político de soberania), sobretudo quando estes administram a justiça penal.
Repare-se que este segundo aspeto vem, no fundo, reafirmar que o estatuto de imunidade, teoricamente, mantém hoje, como no passado, um propósito de preservação e defesa do princípio da separação de poderes, prevenindo intromissões indevidas.
Em sentido restrito, as imunidades parlamentares tal como previstas na norma do art.º 170 CRCV desdobram-se em duas figuras: a irresponsabilidade e a inviolabilidade, todas elas reguladas pela citada norma constitucional e pelos Estatutos dos Deputados Lei n.º35/V/97 de 25 de Agosto, embora estes, no capitulo da imunidade, estejam desatualizados e em desconformidade com a CRCV.
O ED, no capítulo a seguir ao consagrado para as imunidades prevê, (“Condições de exercício do mandato”) na secção dos direitos regalias e prerrogativas, consagra no seu art.º 12 a necessidade de autorização da AN ou da Comissão permanente, se esta não estiver em funcionamento, para os deputados participarem em tribunais como testemunhas, declarantes, peritos, jurados, arguidos … (esta norma levanta questões jurídicas importantes que, oportunamente, podemos identificar).
Tendo em conta a desconformidade do regime previsto para as imunidades, no art.º 11 do ED, com o texto constitucional, aplica-se obviamente, a CRCV.
Diz o n.º 1 do art.º 170 da CRCV que: “Pelos votos e opiniões que emitirem no exercício das suas funções, os Deputados e Grupos Parlamentares não respondem civil, criminal ou disciplinarmente”.
Trata-se da imunidade parlamentar no sentido de irresponsabilidade – um direito de liberdade de expressão qualificada, em razão da especial posição que ocupam os parlamentares, o que constitui uma verdadeira causa de exclusão de punibilidade, justificada pela necessidade de especial proteção da liberdade de expressão do deputado, que é o mediador da vontade do órgão democraticamente eleito.
A irresponsabilidade do deputado é inerente ao exercício efetivo do mandato, no período temporal em que a lei o define, ou seja, está compreendido no período de tempo em que se inicia com o empossamento e termina com a posse dos deputados eleitos no sufrágio seguinte, nos termos da norma do art.º 1 do Regimento da Assembleia Nacional.
Esta prerrogativa não se aplica, portanto, a um deputado suspenso das suas funções parlamentares;
O deputado, no exercício das suas funções, dentro e fora do hemiciclo deve poder falar sem receio de represálias provenientes do exterior, de forma a dar voz ao Parlamento. (contudo, existem divergências de entendimento sobre esse limite externo).
Porém, um pressuposto importante desta prerrogativa é que as opiniões sejam emitidas durante e por causa de uma atividade parlamentar.
Isto significa que deve existir um nexo funcional direto entre a atividade parlamentar e a expressão da vontade do órgão. Ou seja, a irresponsabilidade abrangerá as declarações emitidas pelo deputado dentro e fora do Parlamento, desde que sejam imputáveis à AN;
É, por isso, uma garantia do parlamento, com caracter objetivo e não um privilégio subjetivo do deputado.
A liberdade de opinião do deputado transparece no uso da palavra nos termos referidos no artº 102 do RAN nomeadamente, a) Tratar dos assuntos de antes da Ordem do Dia; b) Apresentar projectos de lei, de resolução e de moção; c) Participar nos debates; d) Exercer o direito de defesa, e) Interpelar o Governo; f) Invocar o Regimento ou interpelar a Mesa; g) Fazer requerimentos; etc e também quando o deputado se encontra a exercer as suas funções junto dos eleitores, quando integra comissões de inquérito ou ainda quando está perante a comunicação social, no exercício das funções representativas. (divergências).
A irresponsabilidade do deputado é, assim, uma forma de promover a amplitude do debate político das questões de interesse nacional;
Relativamente à limitação concernente ao conteúdo das declarações emitidas pelo deputado, vale a regra que a irresponsabilidade tutela o uso e não o abuso da palavra.
Isto significa que não abrange declarações difamatórias ou injuriosas.
Neste prisma deve-se distinguir as seguintes situações:
a) As declarações emitidas no exercício da função, dentro dos limites admissíveis estão a coberto da responsabilidade. O juiz, confrontado com uma acusação contra um deputado que tenha produzido tais declarações deve arquivar o processo;
b) As afirmações injuriosas ou caluniosas produzidas pelo parlamentar, em abuso das suas funções representativas, são plenamente puníveis e os cidadãos ofendidos poderão reagir judicialmente. Nesta situação, terá que ser pedido à AN que autorize o julgamento, levantando a imunidade (inviolabilidade), só então se for levantada a imunidade poderá o tribunal julgar o caso;
Há quem defenda que nestes casos se o deputado num intuito claro de esclarecimento da opinião publica sobre um facto politicamente relevante e estiver seriamente convencido de que os factos imputados são verdadeira estará ainda protegido pela prerrogativa.
c) As declarações proferidas pelo deputado enquanto cidadão comum não está abrangidas pela irresponsabilidade. O deputado, nestes casos, está sujeito ao direito comum como qualquer cidadão;
A inviolabilidade é a outra forma de que reveste a imunidade parlamentar.
Diferente da irresponsabilidade, a inviolabilidade, a par da vertente objetiva (de preservação da independência e da composição do órgão) a presenta uma vertente subjetiva que é a proteção da liberdade física do parlamentar, salvando-o de perseguições arbitrárias, na qualidade de deputado.
Por causa dessa vertente subjetiva justifica que o deputado possa invocar, se houver uma necessidade fundamentada, o direito a uma tutela jurisdicional efetiva, isto é, o direito de renunciar pontualmente à inviolabilidade, por motivos pessoais imperiosos, de forma a afastar duvidas sobre a sua conduta numa determinada situação.
A imunidade parlamentar na forma de inviolabilidade está consagrada nas normas dos números dois e três do art.º 170 CRC;
O número quatro desse preceito constitucional trata da atribuição da competência aos tribunais de segunda instância (Tribunais da Relação) para julgar os deputados, pelos crimes cometidos no exercício das suas funções.
Pela sua redação o citado artigo constitucional as normas previstas no art.º 11 do ED encontram-se revogadas por estarem em divergência com o comando constitucional;
Reza a norma dos números dois e três do art.º 170 CRCV que:
n.º 2 “Nenhum deputado pode ser detido ou preso sem autorização da Assembleia Nacional, salvo em caso de flagrante delito por crime a que corresponda pena de prisão, cujo limite máximo seja superior a três anos.”
Esta norma refere-se ao procedimento que conduz à emissão da autorização pela AN para proceder à detenção ou prisão preventiva de um deputado fora de flagrante delito; (nos casos previstos no CPP). Deve-se referir que de uma interpretação sistemática entre esta norma e a do número seguinte, conclui-se que a prisão a que se refere esta norma do número dois é a prisão preventiva (detenção = medida cautelar; prisão preventiva = medida de coação).
Trata-se de uma situação de discricionariedade de decisão da AN.
Art.º 170º n.º 3 “Movido procedimento contra um Deputado e pronunciado este, a Assembleia Nacional, a requerimento do Procurador Geral da República, decidirá se o respetivo mandato deve ou não ser suspenso para efeitos de prosseguimento do processo, sendo obrigatória a suspensão quando se trate de crime a que corresponda pena de prisão, cujo limite máximo seja superior a oito anos”.
Este preceito tem a ver com a deliberação da AN em momento posterior à pronúncia e que leva à suspensão do deputado. E impõe a obrigatoriedade da suspensão quando se trata de crimes de gravidade considerável.
Nota-se neste preceito constitucional a ausência do estabelecimento de um prazo para o cumprimento do procedimento de autorização pela assembleia, o que poderá acarretar um risco de arrastamento da decisão, prejudicando a administração da justiça e tendo em conta que se trata a uma exceção do princípio da igualdade, pensamos ser uma questão a se ter em conta numa futura reforma.
A ausência do estabelecimento de um prazo expresso justificaria a consagração de um mecanismo de autorização tácita, de forma a dar valor positivo a um eventual silêncio por parte da Assembleia.
Nota-se ainda a falta de estipulação regimental de critérios por que se deve reger a Comissão Permanente, competente para a decisão sobre a eventual concessão de autorização.
Perante esta omissão, e de forma a se evitar o risco de a Assembleia pretender conhecer o fundo da questão dos casos e se investir no papel da atividade de judicatura devem ser tidos em conta, na analise da decisão de autorização caso a caso, a seriedade e a lealdade do processo judicial movido contra o parlamentar, a gravidade dos motivos, a existência ou não de escândalo publico que mais atinja a AN do que o próprio deputado e demais circunstancias concretas, no sentido de salvaguardar a composição e a independência do Parlamento e impossibilitar as intenções persecutórias relativamente ao deputado.
Em suma, na análise concreta do caso deve se ter em vista sempre os objetivos e as razões subjacentes da existência as imunidades e evitar qualquer tipo de manobra ou manipulação externa ou interna.
Ainda sublinha-se a não previsão de uma forma de controlo desse ato da AN que concede ou não a autorização de levantamento das imunidades, poderá ter consequências perniciosas, nomeadamente, deixar desprotegidos outros valores, como a tutela dos direitos fundamentais dos cidadãos, também com guarida constitucional, quando se deva conceder a autorização e não é concedida, por outro lado, pode violar o direito (também ele constitucional) ao exercício do mandato em casos inversos, de concessão injustificada da autorização ou, ainda, quando o deputado tem legitimo interesse em responder em juízo e não lhe é dada a autorização necessária.
Pensamos que nestes casos, o mecanismo de reação adequado a eventuais violações dos direitos será a interposição de um recurso de amparo para o TC, previsto na nossa legislação para salvaguardar os direitos fundamentais.
Chegado o momento de concluir, veremos que o tema impõe uma reflexão critica enquadrada nos novos parâmetros e realidades sociais dos regimes democráticos modernos.
A irresponsabilidade continua a fazer sentido em função da ideia de independência da expressão de vontade dos representantes do povo, contudo, se repararmos, os parlamentos modernos são organizados por partidos e grupos parlamentares, com as regras e disciplina de voto, rígida ou flexível, impostos aos deputados da respetiva bancada. Embora o deputado mantenha a sua liberdade.
Se esse facto, não faz desaparecer a expressão individual de cada deputado, não deixa, na prática, por um lado de influenciar o sentido de voto individual de cada um, deixando esse de ser a expressão da opinião individual para ser, até, com frequência, a expressão do acordo a que as negociações entre os partidos conduziram.
Esta realidade, na qual se verifica uma tendência crescente para a assunção da liderança da vida parlamentar por parte dos grupos parlamentares, que são o novo expoente por excelência da formação da vontade politico -partidária nas assembleias, vem retirar algum sentido à irresponsabilidade, pois esta pressupõe uma liberdade de expressão não compaginável com a vinculação partidária.
É a evolução dos tempos, quiçá a exigir novas reformulações do conceito.
Por outro lado, a inviolabilidade parece também perder força tendo em conta a sua justificação com base na defesa do princípio da separação de poderes, reforçada ainda pela independência do poder judicial dos tempos de hoje.
Tudo isso, aliada à ideia, referida inicialmente, sentida um pouco por todo o lado, da perda da credibilidade da classe política e uma tendência para a redução dos seus privilégios provocam uma certa controvérsia a essa figura da inviolabilidade.
A inviolabilidade continuará a fazer sentido na vertente subjetiva, de proteção da liberdade do deputado em face de ataques motivados pela sua atuação como representante popular e nomeadamente como instrumento de salvaguarda das minorias parlamentares.
Contudo, por constituir uma derrogação ao princípio da igualdade, colocando o deputado (provisoriamente) fora do alcance da justiça, o seu uso deve ser restringido ao mínimo de situações, sob pena de desmoralizar as instituições políticas e os seus titulares.
Deve-se, por isso, na análise dos casos referentes ao levantamento ou não das imunidades aos parlamentares não perder de vista a fundamentação que é, sobretudo, defender o deputado de qualquer perseguição ou intimidação das autoridades, garantindo a sua liberdade física, moral e politica; impedir que outros órgãos do estado possam influir sobre a composição da Assembleia através da prisão do deputado, de onde decorre que a imunidade não deve ser levantada quando a assembleia detecte que, subjacente ao pedido de levantamento, existem intuitos persecutórios, objetivos políticos ou queixas arbitrárias.
Subjacente a essa análise deve estar a preocupação de conciliar dois tipos de valores: o da garantia da efetividade do mandato de deputado, em nome da legitimidade da representação democrática e da autonomia e estabilidade do funcionamento do Parlamento, por um lado, e o do direito de todos os cidadãos à tutela jurisdicional efetiva, em nome dos principio da igualdade e da separação dos poderes, por outro.
Finalmente, deve ser dito que, embora faça sentido manter as imunidades parlamentares, enquanto garantias de liberdade e de que a função legislativa será exercida de forma idónea sem manipulações antidemocráticas, todo o cuidado deve ser tido relativamente á sua efetivação prática, com base na análise criteriosa de cada caso concreto e sempre com base nos fundamentos jurídico-constitucionais de cada uma, só assim se conseguirá o desejado equilíbrio entre a tutela do funcionamento e liberdade dos deputados com outros valores também essenciais no nosso Estado de Direito Democrático.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1023 de 7 de Julho de 2021.