Há mais de meio século, as nações africanas tornaram-se independentes das suas metrópoles europeias. Quer se queira quer não, este facto deveu-se em grande parte ao apoio político e militar da União Soviética. Foi por sua iniciativa que, em 1960, a Assembleia Geral da ONU adoptou a resolução “Declaração sobre a Concessão da Independência aos Povos e Países Coloniais”, que pôs fim à era do colonialismo. Nessa altura, o nosso país prestou assistência em larga escala aos seus parceiros africanos libertados, ajudou a construir as bases dos Estados e centenas de milhares de africanos receberam formação superior na União Soviética.
Infelizmente, porém, o processo de “descolonização profunda” nunca foi concluído. Os próprios africanos estão cada vez mais insatisfeitos com as condições extremamente restritivas dos empréstimos do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional, que impedem a África de se industrializar em grande escala e de tirar pleno partido dos seus enormes recursos naturais e do seu capital humano.
Vemos a África a despertar e a fortalecer-se como um polo independente e autossuficiente. A Rússia esforça-se por defender os interesses políticos e económicos do continente africano nas plataformas internacionais, defendendo o direito de tomar decisões soberanas e a independência, incluindo a favor da sua representação de peso no Conselho de Segurança da ONU.
A Rússia opõe-se à transformação de África numa arena de confronto e não impõe aos seus parceiros uma escolha a favor de outrem, com base no facto de ser um direito soberano deles. No contexto de mudanças fundamentais na ordem mundial existente, estamos a promover uma linha política unificadora no continente africano. Com base na fórmula “soluções africanas para problemas africanos”, consideramos que a nossa tarefa consiste em assegurar uma abordagem integrada dos problemas em causa.
O impulso para o desenvolvimento de toda a gama de relações entre a Rússia e os países africanos foi dado na Primeira Cimeira Rússia-África (cidade de Sochi, Outubro de 2019), que contou com a presença de representantes de todos os 54 países africanos reconhecidos pela ONU e chefes de órgãos executivos de sete estruturas de integração do continente, incluindo a União Africana.
De 27 a 28 de julho de 2023, um dos principais eventos internacionais do ano ocorreu em São Petersburgo - a Segunda Cimeira Rússia-África e apesar da pressão sem precedentes do Ocidente, participaram representantes oficiais de 48 países do continente africano.
A ideia central da Segunda Cimeira Rússia-África é ajudar no fortalecimento da soberania política e económica dos estados do continente. Durante as discussões, os participantes expressaram o seu compromisso de construir conjuntamente uma nova arquitetura da ordem mundial multipolar e mais equitativa, baseada na igualdade soberana dos Estados e na cooperação mutuamente benéfica.
Como disse o Presidente da Federação da Rússia, Vladimir Putin, as Cimeiras Rússia-África tornaram-se um verdadeiro avanço. O continente africano declara cada vez mais os seus interesses e o seu direito a uma soberania genuína e apoiamos de todo o coração todas estas aspirações.
Como resultado da Segunda Cimeira, foram adoptados 5 documentos principais, que inclui Declaração da Segunda Cimeira Rússia-África, Plano de Acção do Fórum de Parceria Rússia-África para o período de 2023 à 2026.
Estes documentos determinaram as principais direções para o desenvolvimento do diálogo russo-africano - nas esferas política, comercial, económica, científica, técnica, cultural e humanitária, bem como nas questões de segurança. É dada especial atenção à emergência de África como um dos mais importantes centros de poder, ao seu papel crescente no mundo multipolar emergente, bem como à promoção de uma nova ordem mundial baseada nos princípios da não interferência nos assuntos internos, do respeito pela integridade territorial e pelo direito dos povos à autodeterminação, e pela preservação da diversidade cultural e civilizacional. Foi notada a disponibilidade da Federação da Rússia para ajudar a reforçar a soberania e a segurança dos Estados africanos em todas as suas dimensões.
De acordo com a decisão da Segunda Cimeira Rússia-África, foi estabelecido um novo formato de diálogo - conferências ministeriais do Fórum de Parceria Rússia-África com a participação dos chefes dos Ministérios de política externa dos estados africanos e chefes dos Órgãos executivos das associações de integração regionais. O primeiro evento desse tipo acontecerá de 9 a 10 de novembro de 2024 em Sochi.
A Conferência ministerial é realizada com o objetivo de realizar e coordenar eficazmente a implementação dos acordos alcançados durante as reuniões de Cimeira, estabelecendo novas tarefas a fim de fortalecer a cooperação russo-africana nas esferas política, comercial, económica, científica, técnica, humanitária e outras.
As questões mais importantes da actual agenda da Rússia no continente africano são questões de garantia da independência económica e financeira, bem como da segurança alimentar e energética para África. Prestamos especial atenção ao apoio a projectos de instituições internacionais de desenvolvimento em países africanos que visam criar condições para garantir o crescimento económico e a sustentabilidade financeira das economias nacionais. As potências mundiais não deveriam considerar os países do continente como uma base de matéria-prima para as suas próprias economias, ao invés deveriam principalmente desenvolver os mercados internos africanos. África precisa da transferência de tecnologia e conhecimentos especializados, do desenvolvimento da sua própria indústria e de infraestruturas críticas.
Estamos prontos para atuar em áreas estratégicas específicas, incluindo construção e modernização de instalações energéticas, exploração de subsolo, produção, transporte de hidrocarbonetos e outros minerais, desenvolvimento e exploração de estoques de recursos naturais, implementação de projetos de infraestrutura para construção de novas e modernização de existentes instalações industriais, transferência de conhecimentos e educação, soluções na área de medicina, serviços digitais, ampliação da oferta de produtos russos de engenharia mecânica, agrícolas, químicos e farmacêuticos.
Relativamente a uma questão tão importante como a garantia da segurança alimentar em África, o nosso país reafirma por este via a sua reputação como fornecedor internacional responsável de produtos agrícolas. A Rússia está a dar um contributo significativo para garantir a segurança alimentar no continente africano e tomou uma série de medidas concretas para apoiar os seus amigos africanos. Em cumprimento da decisão de fornecer ajuda alimentar, foram enviados cereais russos para o Burkina Faso, o Zimbabué, o Mali, a Somália, a República Centro-Africana, a Eritreia e Madagáscar. Foram implementados fornecimentos gratuitos de fertilizantes ao Zimbabué, Malawi, Quénia e Nigéria.
Pretendemos aumentar a cooperação em temas tão prementes para África como a medicina e os cuidados de saúde, garantindo a segurança biológica e epidémica. Para estes fins, a Rússia está pronta para fornecer aos africanos laboratórios móveis com equipamentos, medicamentos modernos e formar técnicos especializados, assim, foram doadas 50 ambulâncias a Angola em Agosto deste ano.
Aumentaremos a cooperação com os países do continente africano na via humanitária, fornecendo mais bolsas de estudo, abrindo filiais de universidades russas, casas russas e escolas secundárias.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1190 de 18 de Setembro de 2024.