Aposta na Saúde - Um desígnio nacional

PorPaulo Veiga,28 fev 2025 11:26

Os casamentos são para a saúde e para a doença, mas é um direito de todos que a vida seja vivida em saúde e que a doença seja o inimigo principal de uma sociedade evoluída, justa e igualitária. Desde o princípio da História que é uma prioridade das civilizações encontrar curas para doenças, tratar essas doenças e criar condições para que as suas populações cresçam saudáveis, sendo esse acesso aos cuidados de saúde um direito fundamental de todos os seres humanos e uma responsabilidade inquestionável de todos aqueles que servem a Causa Pública.

O Povo costuma dizer que mais que tudo “é importante é ter saúde”. No entanto ter saúde não é apenas uma obra do acaso. A aposta na prevenção, em cuidados básicos de saúde, em sensibilização, em equipamentos e recursos humanos que atuem em proximidade e de forma eficiente, são um garante inequívoco que a sorte de crescer saudável dará lugar à garantia de envelhecer saudável. Há diagnósticos que necessitam de equipamentos muito especiais para se tornarem visíveis. A extrema prioridade que a saúde deve ter nos planos governativos de Cabo Verde é um diagnóstico que, não só, necessita de equipamentos de análise, mas assume-se como uma prioridade absoluta e que não permite adiamentos ou hesitações.

A importância dos números

Acredito que todos concordamos neste “diagnóstico” inicial. Não obstante, é importante realçar alguns dados que demonstram o caminho longo percorrido nas nossas ilhas. De acordo com os últimos censos de 2021 relativos à mortalidade, o nosso país registava 13 mortes infantis por cada 100.000 nascimentos, e 47 óbitos maternos por cada 1.000 nascimentos, uma das mais baixas taxas da região africana. Estes números que registaram descidas significativas desde os valores conhecidos de 1990, representam um dos melhores registos da África Subsariana e resultado de políticas de vacinação e no investimento forte em cuidados de saúde para mulheres.

A nossa esperança de vida disparou dos 55 anos em 1980 para os 74,5 anos em 2010 e continua a subir. Esta é uma prova do trabalho realizado pelo país na melhoria de cuidados de saúde e garantia que esta se prolongar por muitos mais anos. Somos conhecidos por ser um país de jovens, mas orgulhamo-nos de chegarmos cada vez mais a velhos.

Estes números dão-nos uma falsa sensação de satisfação, porque se isto é verdade, não é uma sensação que a saúde precisa rapidamente de “tratamento”. As infraestruturas são insuficientes ou esgotadas, as necessidades de equipamentos são gritantes e áreas como a oncologia tem de sofrer fortes investimentos. Neste momento, anemias e cancros são responsáveis por cerca de 70% das mortes e isso não pode ser ignorado. E se equipamentos são necessário, o mais crítico são recursos humanos. Mais uma vez, insisto em algo que já reforcei em artigos anteriores: as políticas só fazem sentido de pessoas para pessoas e, neste caso mais que em outros, precisamos de pessoas. Precisamos de profissionais qualificados e disponíveis.

Cabo Verde apresenta o desafio da consequência do seu sucesso. O nosso país, praticamente, dobrou a sua população nos últimos 50 anos, tendo crescido em cerca de 100.000 habitantes neste século. Atualmente, somos, orgulhosamente, uma nação de mais de 520.000 habitantes, reforçada com mais de 1.000.000 de turistas anualmente. Perante estes números, a nossa capacidade hospitalar há muito que está esgotada. Precisamos de mais camas, de mais unidades de saúde, de mais médicos, em suma, precisamos de mais saúde e precisamos para hoje.

O futuro e a tecnologia como solução

Apesar do investimento que foi feito desde 2016, a oferta hospitalar necessita melhorar, em especial numa componente extremamente importante numa nação composta por ilhas e onde o transporte entre elas nem sempre é fácil: a proximidade. O parque hospital atual é insuficiente e não cobre de forma eficiente o nosso território. Por outro lado, as nossas debilidades orçamentais apresentam restrições relevantes na aposta em novas unidades convencionais, onde as infraestruturas e construção, representam uma carga financeira extrema.

Mais uma vez, a visão que tenho é de futuro, de procurar novas soluções e tecnologias e de colocar essa inovação ao serviço de Cabo Verde. Atualmente, o Mundo já conhece a possibilidade de implementação modelar de hospitais, infraestruturas totalmente equipadas e modernas, que apresentam a capacidade única de ser adaptadas às realidades locais, criando unidades hospitalares de pequena dimensão e proximidades, mas com todas as valências com mais impacto na vida das populações.

A tecnologia modular apresenta enormes vantagens como o tempo de implementação e a sustentabilidade. Com durabilidade e qualidade de materiais semelhantes aos da construção tradicional, a tecnologia modelar garante uma maior flexibilidade no processo construtivo, uma vez que os edifícios são compostos por módulos, e a sua construção é bastante mais rápida, podendo uma pequena unidade de 600 metros quadrados estar pronta em pouco mais de seis meses.

Este tipo de Unidades Modulares de Saúde ou Hospitais de Proximidade, são unidades de saúde concebidas para responder de forma eficiente e humana às necessidades de cuidados médicos de uma comunidade específica, com enfoque nos serviços de saúde primários, de urgência e de especialidades básicas, permitindo, de uma forma rápida, inovadora e com enorme qualidade, dar resposta às necessidades das populações e cobrir um território tão diferenciado como o nosso.

Uma unidade de proximidade permitiria oferecer às populações serviços de urgência, pequenas e médias cirurgias (incluindo partos), consultas e tratamentos de especialidade (como pediatria, ginecologia e obstetrícia, cardiologia ou traumatologia), análises e exames de diagnóstico, capacidade de hospitalização e áreas de suporte como farmácias ou reabilitação. A possibilidade de toda a população, independente da sua localização, poder aceder a métodos de diagnóstico como análises laboratoriais de forma simples, rápida e sem necessidade de se deslocar, seria um progresso relevante na estratégia da saúde.

Esta tecnologia já está a ser implementada em alguns países africanos e asiáticos e são uma solução de futuro, financeiramente mais acessível e com um tempo de implementação de meses e não de anos, ou de décadas.

Não existe futuro sem Pessoas

A construção de uma rede de Hospitais de Proximidade, em tecnologia modelar e totalmente equipados, cobrindo a totalidade do nosso território é algo ambicioso, mas que eu tenho a certeza que Cabo Verde pode alcançar. No entanto, de nada servirá ter os mais inovadores centros de saúde se não existirem recursos humanos para os operar. Cabo Verde necessita de Pessoas. A capacitação de profissionais, a valorização de carreiras e a capacidade de atrair e reter talento, são, provavelmente, o maior desafio de Cabo Verde e transversal a todos os sectores.

No futuro imediato, temos de ter a capacidade de atrair o regresso de profissionais da nossa diáspora e de daqueles que possam olhar para Cabo Verde como uma combinação de carreira e de serviço às populações. Temos de reforçar a nossa capacidade de ensino e de formação, e não podemos descurar a valorização daqueles que ao longo da nossa história e no momento atual são o pilar do nosso serviço de saúde.

O país necessita de uma visão que crie legislação e um ambiente político que coloque as pessoas como prioridade e dê espaço a que parcerias possam ser desenvolvidas com um único objetivo: permitir a implementação de uma rede de cuidados de saúde de proximidade e das suas equipas de profissionais. Um modelo em que a aposta é, mais uma vez, uma política de regulação e incentivo para que todos possam beneficiar de um verdadeiro sistema de saúde universal, de qualidade, próximo de todos e para todos. 

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1213 de 26 de Fevereiro de 2025.

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Autoria:Paulo Veiga,28 fev 2025 11:26

Editado porAndre Amaral  em  28 fev 2025 11:26

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