"O que sentimos é que estamos a falhar, o sistema de protecção está a falhar e tem de haver cada vez mais um trabalho de prevenção, de 'djunta mon' ('união'), em que os jornalistas e os diversos comunicadores devem fazer parte desta frente de um trabalho preventivo que é fundamental", disse a presidente do ICCA.
A responsável institucional falava aos jornalistas, na cidade da Praia, no ato de apresentação de um guia para cobertura jornalística em matéria de violência sexual contra crianças e adolescentes.
Maria José Alfama enalteceu os "ganhos" do país, mas fez 'mea culpa', salientando que na temática da proteção de menores, o sistema "falhou" e agora está a corrigir os erros.
Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o sistema de protecção dos direitos da criança e do adolescente integra instituições dos sectores público e privado e de carácter comunitário, nomeadamente o ICCA, os Tribunais e o Ministério Público, a Comissão Nacional para os Direitos Humanos e a Cidadania (CNDHC), Comités Municipais de Defesa dos Direitos das Crianças e dos Adolescentes (CMDDC), Organizações Não Governamentais (ONG) e Associações Comunitárias de Base (ACB).
O mesmo estatuto diz as crianças e os adolescentes têm direito à vigilância e protecção em qualquer lugar público ou privado e que os organismos competentes do Estado têm a responsabilidade especial de supervisionar, recolher e acolher todas as crianças de e na rua, nos termos da lei.
"Quantas mais actividades pudermos fazer no âmbito da prevenção do abuso e da exploração sexual das crianças e dos adolescentes melhor", prossegui a presidente do ICCA, que também falava aos jornalistas no primeiro ano em que Cabo Verde assinala o Dia de Luta contra o abuso e exploração sexual de menores.
"Existem datas que são assinaladas, que, a nosso ver, fazem-nos pensar muito e fazer 'mea culpa'. O dia 04 [de junho] faz-nos pensar o quanto também não cumprimos bem o nosso papel", enfatizou Maria José Alfama, que disse ter o "sonho" de um dia a data ser retirada do calendário.
Para se "fazer a mudança" e garantir todos os direitos da criança e do adolescente, a presidente pediu uma "política integrada" e "reforço da articulação" entre as 17 instituições que trabalham com o ICCA na execução do plano nacional de combate ao abuso e exploração sexual de menores.
Segundo a presidente do ICCA, no primeiro trimestre do ano houve uma redução em metade (36) das denúncias de abuso sexual de crianças, em relação ao mesmo período do ano passado (72).
Elaborado pelo ICCA e pela Fundo da ONU para as Crianças (Unicef) em Cabo Verde, o guia para cobertura jornalística em matéria de violência sexual contra crianças e adolescentes apresenta conceitos, principais leis, glossário, tópicos de reportagens, dicas de abordagem ética em texto e imagem, entre outros pontos.
Maria José Alfama disse que o guia está aberto a sugestões e poderá servir de suporte para o país produzir mais materiais pedagógicos sobre a matéria e na língua cabo-verdiana, o crioulo.
A representante adjunta da Unicef em Cabo Verde, Ilaria Carnevali, disse que o guia é um instrumento de apoio que irá reforçar a atuação dos jornalistas, mas pediu também um "compromisso" de toda a sociedade para "tolerância zero" para os abusadores.
Mesmo opinião teve o ministro da Cultura e das Indústrias Criativas cabo-verdiano, Abraão Vicente, que presidiu a cerimónia de apresentação do guia, para quem é preciso uma "estratégia nacional" para "criar um ambiente em que a impunidade seja banida".
"Temos de agir junto dos agentes legisladores para que a sensação de passividade e normalização desses actos seja impedida através de leis que façam com que todo o sistema judicial responda a tempo útil para a criança, suas famílias e para a sociedade", apelou o ministro, entendendo que também são precisas "acções concretas" para empoderar as famílias e da sociedade.