Como decorre o programa das comemorações do Dia do Município?
Este ano nós temos um programa muito vasto que começou no dia 12 de Dezembro com algumas inaugurações e também com as festas ligadas à terceira idade. Pela primeira vez temos um programa muito variado que abarca muitas inaugurações e lançamento de primeira pedra. Na parte institucional vamos ter aqui a presença de várias câmaras geminadas que têm colaborado connosco em vários domínios. Na verdade, creio que é um dos programas mais ricos que até agora conseguimos implementar. E esta a decorrer da melhor forma possível.
A Feira Agro-Industrial e de Serviços da Ribeira Grande, enquadrada no programa comemorativo do dia do município, arrancou este ano com menos feirantes. Qual a razão?
Não tivemos menos feirantes, mas menos produtos e a razão é óbvia. Santo Antão é das poucas ilhas de Cabo Verde que vai com dois anos de seca consecutivos o que constitui um drama para a própria ilha. 2018 foi um ano extremamente difícil no concernente à produção agrícola que praticamente foi nula, e quando assim é tem reflexos também em termos de apresentação da própria feira. Eu diria que, mesmo com esses constrangimentos, a feira, que já vai na sua 12ª edição, foi um grande sucesso. Basta falar com os feirantes para ver que todos os produtos que trouxeram foram vendidos, quer em termos de produtos de verdura, quer também em termos de produtos agroindustriais com valor acrescentado. Isto demostra que a agricultura a nível de Santo Antão continua a ser um sector vital. Digo Santo Antão porque nós tivemos feirantes dos três concelhos, nomeadamente Paúl, Porto Novo e daqui da Ribeira Grande. Todos são unânimes em dizer que é a maior feira de Santo Antão. É uma feira com características próprias e que continuaremos a preservar.
Qual o impacto de mais um ano de seca em Santo Antão e no seu município?
Podemos considerar este ano como difícil e dramático, porque se 2017 foi um ano de seca, 2016 tinha sido um ano de muita chuva com estragos um pouco por todo o lado. É que o problema da falta de chuva não se reduz à questão da produção, mas advém sobretudo da questão do acesso à água. Aqui no concelho da Ribeira Grande temos neste momento mais de 95 por cento das comunidades com ligação domiciliária que dependem das nascentes que existem por todo o lado, excepto na Cidade de Ribeira Grande e Ponta do Sol que são abastecidos através de furos; e quando não há chuva, há efectivamente diminuição dos caudais com impacto na própria prestação de serviço a nível da distribuição de água às populações. É o que nós estamos a sentir neste momento. Ou seja, há zonas onde estamos a fazer o racionamento em termos de distribuição da água e que até final do ano teremos que encontrar soluções alternativas para o abastecimento público às populações. Daí que a preocupação vai muito além da questão da mera produção agrícola, porque se alguém não tiver milho pode ir comprá-lo a um comerciante. Mas a água não se consegue comprá-la numa mercearia e aqui há que encontrar soluções. A mobilização da água é uma das nossas grandes preocupações. E uma das questões que queremos discutir com o governo nos próximos tempos é a necessidade urgente e efectiva da mobilização de mais água e também de mais recursos para a unificação de alguns sistemas de distribuição da água para que possamos ter alternativas em situações de seca.
Santo Antão tem apostado fortemente no turismo da natureza e quer melhorar esta oferta com a Rota das Aldeias Rurais. Que avanços tem registado este sector na Ilha das Montanhas?
Independentemente da Rota das Aldeias Rurais que é um projecto nascente que ainda não singrou, queria ressaltar que o turismo é uma das grandes apostas e podemos dizer que é uma aposta ganha. Hoje nós sentimos que muitas pessoas que anteriormente não tinham fontes de rendimento, ou tinham alguma dificuldade em termos de sobrevivência, graças ao turismo, essas pessoas têm mudado muitas vezes de forma radical a própria qualidade de vida. O turismo que nós temos em Santo Antão é um turismo que deixa alguma coisa às populações. Não é um turismo de massas que existe noutras paragens, é um turismo ligado à natureza, ligado aos circuitos turísticos que existem um pouco por todos os vales que permite que o turista possa pernoitar nos hotéis ou nas residenciais, mas também a nível das habitações que existem neste momento ao longo dos diversos circuitos. Daí que nós queremos reforçar cada vez mais esse tipo de turismo para que possa, de facto, continuar a deixar cada vez mais recursos às populações das diversas localidades. No ano passado Santo Antão recebeu aproximadamente 27 mil turistas e nós queremos aumentar de forma muito mais acentuada essa cifra para cerca de 50 mil turistas nos próximos dois anos. Mas isso só será possível com a melhoria do sistema de transportes que é um dos grandes handicaps que existem hoje. Santo Antão e Brava são das únicas ilhas que não têm um aeroporto e este facto dificulta a chegada do turista quer ao destino Santo Antão, quer o regresso ao seu país de origem. É por isso que nós temos vindo a discutir essa necessidade efectiva de Santo Antão ter um aeroporto, ter duas portas de entrada e saída seja de barco ou de avião para que possamos receber mais turistas, porque Santo Antão tem potencial que permite acolher muito mais turistas. Esta seria uma das vias para atenuar o maior problema que Santo Antão vive neste momento que é a perda de população. Ribeira Grande é o concelho do país que mais perdeu população na última década. A nosso ver, isso advém de dois factores: do facto de não termos ensino superior aqui em Santo Antão, dos jovens que saem da ilha para estudar noutras paragens e porque não têm perspectiva de emprego aqui são obrigados a procurar alternativas de emprego noutras ilhas. O outro factor tem a ver com a questão do rendimento. Ou seja, devido à seca, por não haver possibilidade de emprego na agricultura e silvicultura nas quais depende mais de 60 porcento da população, então as pessoas são quase que obrigadas a imigrar para outras paragens. É por isso que nós dizemos que havendo um aeroporto, haverá alternativas em termos de emprego, haverá maior confiança da parte dos promotores em fazer os seus investimentos a nível da ilha o que irá gerar mais postos de trabalho e permitirá que os jovens possam ter uma alternativa a nível do concelho e da ilha.
O primeiro-ministro diz que o aeroporto será construído no momento certo. Qual é o momento certo?
O momento certo era ontem. Os sucessivos governos de Cabo Verde têm vindo a falar na questão da construção do aeroporto e na urgência de termos uma infraestrutura que poderá alavancar a própria economia da ilha. É a única solução, porque o resto será a mitigação da situação. Os últimos três governos anteriores foram sempre iludindo as pessoas de Santo Antão que já havia estudos e que o aeroporto iria avançar. Acabamos por perceber que nunca houve um estudo, nem menos foi feita a análise dos ventos o que, segundo os entendidos, deve anteceder em três anos a elaboração do projecto para se poder saber e definir concretamente a direcção dos ventos. E é isso que o actual governo fez e os dados estão sendo levantados há dois anos. Nós estamos convencidos de que em três anos teremos todos esse dados para que possamos avançar de imediato para a elaboração do projecto da construção do aeroporto. Penso que o que está a condicionar neste momento o arranque é a recolha de dados técnicos que são exigidos a nível internacional.
Aí Santo Antão poderia dar a sua quota-parte no esforço para o desenvolvimento de Cabo Verde, como tem afirmado.
Com certeza, a única forma de darmos a nossa contribuição, quer em termos de produção de riqueza a nível nacional, mas sobretudo para a criação de alterativas de emprego a nível da ilha será com a construção de um aeroporto que irá potenciar tudo aquilo que é economia: irá gerar emprego e irá permitir que a agricultura possa crescer e desenvolver. Todos dizem que Santo Antão é uma ilha agrícola, mas uma ilha agrícola altamente penalizada. Há mais de 34 anos que temos sido sujeitos a um embargo que eu considero doentio. Daí que o agricultor de Santo Antão seja altamente penalizado, o agricultor de Santo Antão não está em pé de igualdade com um outro agricultor a nível nacional, porque o mercado de Santo Antão restringe-se exclusivamente a S.Vicente. O produto agrícola de Santo Antão não poderá ir a Santiago, não poderá ir a Boa Vista, nem ou Sal. Ou seja, os nossos produtos não chegam às ilhas que têm maior capacidade de consumo e de aquisição. O agricultor de Santo Antão é altamente penalizado e foi altamente penalizado ao longo dos anos. Isso tem sido, de facto, uma das causas do empobrecimento progressivo de Santo Antão e da diminuição da sua população, o que tem levado muitas vezes ao abandono do sector agrícola. Vemos que muitas áreas que eram antigamente cultivadas estão hoje abandonadas, porque o custo da produção não justifica com todo o trabalho que é necessário investir.
Espera que a regionalização venha a resolver os problemas de Santo Antão?
Espero que a regionalização venha resolver os problemas de Cabo Verde no seu todo. Ou seja, a centralização exacerbada que existe hoje a nível de Cabo Verde, que afecta, entre outros, o tempo de resposta que é completamente diferente de ilha para ilha. Repare, um operador turístico que queira fazer um investimento em Santiago ele tem acesso a todos os serviços que lhe permitem tomar uma decisão. Por isso eu penso que a regionalização não vai servir só Santo Antão, mas vai servir Cabo Verde. Vai diminuir a centralização exacerbada que existe hoje e vai permitir que cada ilha possa dar a sua contribuição em termos da criação da riqueza nacional, especializando-se naquilo em que poderá constituir mais-valia relativamente ao todo nacional. Ou seja, Santo Antão não poderá ir competir com Sal ou Boa Vista em termos de sol e praia, porque sabe que essas ilhas têm maior potencial. Mas já em relação ao turismo de natureza entendemos que temos uma valência que se for efectivamente desenvolvida irá valorizar todo o Cabo Verde e irá valorizar aquilo que será o destino Cabo Verde como somatório de diversos produtos.
Foi reeleito em finais de Outubro presidente da Associação dos Municípios de Santo Antão. Quais são as linhas de força para seu novo mandato?
Santo Antão é o exemplo daquilo que poderá ser a regionalização. Ou seja, desde 1994, com a criação da Associação dos Municípios de Santo Antão, a ilha conseguiu, durante esse período, elaborar quatro planos de desenvolvimento. Em 1994, Santo Antão apresentava os piores indicadores em termos de qualidade de vida. Com a Associação dos Municípios de Santo Antão, com a criação do Gabinete Técnico Intermunicipal, com a elaboração dos planos de desenvolvimento, a ilha de forma global conseguiu desenvolver-se sem beliscar aquilo que é a autonomia municipal. Contrariamente àquilo que muita gente diz, não é verdade que a regionalização poderá pôr em causa aquilo que é a autonomia municipal. Santo Antão é efectivamente um bom exemplo disso. Ou seja, o Gabinete Técnico assumiu aquilo que eram os projectos estruturantes para toda a ilha de Santo Antão nos sectores da educação, saúde, abastecimento de água, etc. E a ilha como um todo cresceu. Os indicadores da Ribeira Grande, do Paúl e Porto Novo cresceram, porque houve sempre essa visão. Daí que a nossa aposta para Santo Antão é permitir que a ilha continue a se desenvolver e a crescer. E vamos continuar a lutar para que infraestruturas importantes, como é o caso do aeroporto, sejam construídas, porque o aeroporto não estará na Ribeira Grande, estará no Porto Novo, mas irá servir a ilha de Santo Antão como um todo. Daí que essa seja uma das nossas apostas estratégicas para a Associação dos Municípios de Santo Antão. Isto é, elaborar o Plano Estratégico da ilha com uma visão de desenvolvimento a médio e longo prazo. O Plano englobará todos os sectores, nomeadamente a agricultura que continua a ser importante; o ensino superior que será fundamental para o crescimento e desenvolvimento da ilha como um todo, sobretudo para alternativas em termos de emprego, entre outros. É esse o nosso foco em termos de Associação. A mesma coisa em relação ao turismo. Falou há pouco sobre a Rota das Aldeias Rurais que ainda é um mero projecto. Nós queremos é que toda a ilha de Santo Antão possa se desenvolver e que as pessoas possam ver que o turismo é, de facto, uma oportunidade independentemente de haver ou não apoios da parte das instituições públicas, mas que as pessoas reconheçam que será um investimento útil a médio e longo prazo e que poderá gerar rendimento para os investidores, para as pessoas, famílias e para toda a ilha.
Texto originalmente publicado na edição impressa do expresso das ilhas nº 894 de16 de Janeiro de 2019.