Alda Lopes, uma cabo-verdiana em Londres

PorAntónio Monteiro,11 ago 2019 7:30

Alda Lopes
Alda Lopes

Esteve de visita a Cabo Verde a presidente da Associação “Cultura Cabo Verde/UK”, uma ONG que trabalha com crianças e adultos filhos de país cabo-verdianos. Em conversa com o Expresso das Ilhas Alda Lopes recorda a sua caminhada até à capital do Reino Unido e apresenta a nossa pequena, mas ambiciosa comunidade radicada naquele país europeu.

“O meu nome é Alda Pereia Lopes. Sou de origem cabo-verdiana. O meu pai era natural da ilha de Santiago e a minha mãe da Ilha Brava. Descobri há pouco tempo que a minha avó era da ilha de Santo Antão”, assim começa por se apresentar a cabo-verdiana que reside em Londres e que por estes dias esteve em Cabo Verde a convite do líder comunitário residente na Argentina, Marcelino Santos, para participar no acto constitutivo da Associação das Mulheres Emigrantes da Boa Vista.

Alda Lopes vive na capital do Reino Unido há 23 anos. Licenciou-se em sociologia e trabalha numa instituição governamental na área da reinserção social ao mesmo tempo que dirige o grupo “Cultura Cabo Verde/UK”, uma ONG que trabalha com crianças e adultos descendentes de cabo-verdianos.

A caminhada

Alda Lopes nasceu em Benguela, Angola, numa vilazinha que se chama Catumbela, onde viviam muitos cabo-verdianos. “Cresci numa comunidade em que havia muitos cabo-verdianos à volta e muitos deles da Ilha Brava. Saí de Angola aos 8 anos e fui para Portugal, em 1979, acompanhada da minha mãe que depois de três anos faleceu com um cancro. Cresci e estudei em Portugal e depois emigrei para a França em 1987. Vivi em França 7 anos, depois voltei para Portugal. Vivi mais três anos em Portugal e resolvi outra vez reemigrar. E fui para a Inglaterra onde estou há mais de 20 anos”, conta.

Depois de todos esses anos Alda Lopes continua apaixonada pelas suas raízes. Por isso agora da sua segunda vinda a Cabo Verde, trouxe consigo seus dois irmãos mais velhos. “Mais uma vez lá vou eu à procura das minhas raízes na Ilha Brava a ver se encontro familiares meus. Consegui que a minha irmã e o meu irmão que são mais velhos viessem, que sabem mais histórias”. Só dois dias depois da conversa com o Expresso das Ilhas é que Alda e os seus irmãos partiram para a Brava à procura de parentes remotos. Não sabemos o desfecho da história, mas na nossa conversa mostrou-se esperançada. Antecipando um eventual fracasso na procura, disse-lhe que se não encontrasse raízes certamente que encontraria flores, ela respondeu, sorrindo ‘gosto de flores, mas espero que encontre algum parente da minha mãe’.

Do Reino Unido para Cabo Verde

Viver no Reino, como nos revelou Alda Lopes, foi um sonho desde muito jovem. Contou que ela e uma prima sempre diziam ‘e depois vamos viver para Inglaterra”. O sonho inglês de Alda concretizou-se já lá vão 23 anos. Nesse meio tempo licenciou-se em sociologia, mas nunca esqueceu-se das suas raízes africanas e crioulas. “Lembro-me que quando estava a fazer a minha licenciatura cujo tema era o desenvolvimento do terceiro mundo, escolhi especificamente esta área por querer perceber o porquê dos problemas que temos em África e porque era jovem, cheia de sonhos pensei que poderia fazer a diferença e mudar um pouco o percurso da nossa África, de Cabo Verde, Angola, etc. Então escolhi Cabo Verde para fazer meu voluntariado”, recorda.

Alda Lopes chega à Praia, em 2008, para o que seria a primeira visita ao país dos seus ancestrais. “Nesta altura, quando eu vim para Cabo Verde, eu estava completamente apaixonada pelo meu povo e por aquilo que conseguiam-me transmitir”. Alda Lopes fez o voluntariado na Fundação Infância Feliz durante quatro meses, antes de regressar para Londres.

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De Cabo Verde para Londres

“Quando regressei a Londres reparei que havia uma lacuna, pois Londres é uma cidade muito grande e os cabo-verdianos estão muito dispersos”, recorda a activista social, acrescentando que era necessário fazer qualquer coisa. E o primeiro impulso chega de Cabo Verde. Como Alda tinha trabalhado com a Fundação Infância Feliz, a presidente da Fundação convidou-a a organizar no Reino Unido o concurso “Vozes da Diáspora”. O concurso realizou-se em Junho de 2012 e foi um enorme sucesso, recorda. Com isso Alda Lopes apercebeu-se que era possível dinamizar a comunidade cabo-verdiana no Reino Unido e na sequência ela e um grupo de amigos fundaram a associação “Cultura Cabo Verde/UK”. “A partir de então não mais paramos e continuamos o nosso trabalho. A comunidade cresceu e depois deste festival fizemos um outro evento que foi um workshop sobre temas cabo-verdianos em Dezembro de 2013. Foi um absoluto sucesso”.

A partir dali a lista dos associados cabo-verdianos foi crescendo e o grupo Cultura Cabo Verde/UK conta hoje com mais de 16 membros adultos que formam o núcleo duro da organização.

“Trabalhamos com crianças e jovens essencialmente. Eles são o coração do nosso grupo. O que nós fazemos é ajudá-los a ter esse sentido de identidade e a estarem fora do mundo do crime, pois a criminalidade em Londres é extremamente alta entre os jovens. Tem sido essa a nossa missão. É claro, nós os adultos temos ganho imenso, não só pelo impacto que temos feito na vida das crianças, mas pelo impacto que temos tido nas nossas vidas, porque a cultura cabo-verdiana passou a ser a nossa família extensiva. Para mim pessoalmente tem sido uma caminhada de reencontro às minhas raízes, de reencontro com aquilo que eu sou, de onde venho”, revala com orgulho Alda Lopes.

Para Alda Lopes o impacto do seu trabalho comunitário tem sido gratificante e uma forma de reencontro consigo própria.

“Eu percebi o porquê que muitas vezes tenho certas atitudes, o porquê que eu educo muitas vezes as minhas filhas da forma como eu as educo. Porque isto me foi passado pela minha mãe, pela minha avó. Então esta tem sido a minha caminhada”.

O Brexit

Neste momento a maior preocupação da activista social é o anúncio da saída do Reino Unido da União Europeia. “O factor Brexit tem tido realmente um impacto muito negativo na sociedade londrina e no resto do Reino Unido por razões óbvias. A minha luta tem sido para que todos os cabo-verdianos que estejam em contacto com a cultura de Cabo Verde que se apercebam da necessidade de fazerem a residência permanente, porque até agora não era necessário porque até agora o Reino Unido pertencia à União Europeia e não havia essa necessidade”.

O grupo Cultura Cabo Verde/UK até agora já ajudou 72 pessoas a conseguirem a residência permanente, mas a partir de agora o cenário irá complicar-se mesmo para a residência temporária. Por isso Alda Lopes apela a todos os cabo-verdianos que vivem no Reino Unido que façam o pedido de residência permanente, por forma a evitar problemas com as autoridades.

“Nação Global”

Além do trabalho comunitário, Alda Lopes, incentivada por Marcelino Santos, participa todos os domingos no programa da RCV Nação Global no qual fala dos problemas e de casos de sucesso da nossa pequena comunidade no Reino Unido.

“Tenho tentado fazer o meu melhor, mas não sei se tenho realmente conseguido”.

Aliás, foi a convite de Marcelino Santos que Alda Lopes esteve durante 20 dias em Cabo Verde para participar no acto constitutivo da Associação das Mulheres Emigrantes Reformadas da Boa Vista, que decorreu na localidade de Bofareira, no dia 3 de Agosto. A referida Associação tem como objetivo a defesa e promoção dos direitos das mulheres emigrantes, o apoio no processo de retorno a Cabo Verde e o desenvolvimento de projetos e atividades das emigrantes reformadas nas áreas empresarial, cultural e recreativo.

Texto originalmente publicado na edição impressa do expresso das ilhas nº 923 de 7 de Agosto de 2019. 

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Autoria:António Monteiro,11 ago 2019 7:30

Editado porFretson Rocha  em  5 mai 2020 23:21

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