Em conversa com o Expresso das Ilhas, o presidente da Associação Mar e Terra, Miguel Barros, sublinha que o concelho de São Miguel, no interior da ilha de Santiago, tem grandes potencialidades a explorar, que podem impulsionar a economia local e gerar emprego para os jovens do concelho que sofrem com a falta de oferta de trabalho e encravamento de actividades geradoras de rendimento.
“Calheta tem um grande potencial a explorar que são as praias balneares. Somos uma comunidade que vive basicamente da pesca, pecuária e agricultura, mas hoje essas actividades já não são tão atraentes para os nossos jovens que sonham em montar a sua própria empresa, criar um diferencial que possa gerar emprego e contribuir para o desenvolvimento económico de Calheta.”
Miguel Barros aponta o desporto como uma das grandes apostas para criar um diferencial no município, gerar economia e impulsionar o empreendedorismo jovem.
A Calheta tem grandes talentos e por ser uma região de praia, apostar nos desportos náuticos traria benefícios inúmeros para o município, afirma.
“Temos jovens que cresceram praticamente no mar. Sabem nadar e surfar muito bem, então, porque não explorar os desportos náuticos? Apostar na natação, futebol de praia, surf, bodyboard, até mesmo voleibol de praia.São desportos que se reparamos bem, o nosso município tem potencial para explorar e, ao mesmo tempo, seria um diferencial que chamaria atenção dos cabo-verdianos e dos turistas para a comunidade de São Miguel. Criar infraestruturas para que essas áreas sejam exploradas. Temos jovens no concelho, capacitados com formação superior, que almejam uma oportunidade para fazer conhecer o município de São Miguel com outros olhos.”
Miguel Barros é um jovem formado em Economia e Gestão de Empresas, do concelho de São Miguel, que preocupado com a dinâmica do concelho apostou numa associação para motivar os jovens a participar em actividades que proporcionam melhorias para a comunidade e contribuir para desencravar o emprego jovem e a economia local.
Associação Mar e Terra
Miguel Barros, presidente e co-fundador da Associação Terra e Mar, diz que o objectivo de criar uma associação de cariz voluntário no município de São Miguel é unir forças e aproveitar o que o concelho já tem, tanto no mar como na terra, para transformar a comunidade e criar oportunidades de desenvolvimento a nível económico, desportivo e social.
A Associação, recém-criada, já actua há aproximadamente cinco meses e vem desempenhando diversas actividades para auxiliar na transformação ambiental, paisagística e cultural de Calheta. Essas actividades vão desde limpeza das praias balneares, monitoramento e fiscalização nas praias, consciencializarão ambiental, protecção animal e até mesmo vigilância e combate a extracção ilegal de areia.
“Temos neste momento a monitorização das tartarugas marinhas que estão na época da desova, então montamos um posto nas praias mais procuradas por estes animais para assegurar uma desova tranquila e auxiliar na protecção destes animais. Também mantemos os postos de vigilância para tentar conter a apanha de areia que há muito prejudica a nossa comunidade, até já vivenciamos casos em que as tartarugas procuram a praia para desovar, mas com o efeito da apanha excessiva da areia, acabam por ficar desorientadas em cima das pedras, à procura de um lugar para desova, o que aumenta o tempo de exposição e o risco de ser caçado”.
Patrick Tavares é um dos membros da Associação Mar e Terra, e testemunha que a praia de mar de Calhetona tem sido o maior campo de actuação da associação. É uma praia balnear, bastante procurada pelas tartarugas marinhas nesta época de desova. Ali já realizaram campanhas de limpeza e têm um posto de monitoramento permanente.
A praia de Calhetona tem uma paisagem bastante marcada pela apanha de areia e uma das sequelas desta actividade, é o excesso de pedras que dificulta as tartarugas marinhas no acesso à parte arenosa para fazerem os seus ninhos. A associação está constantemente a realizar campanhas de retirada das pedras para impedir que esses animais fiquem desorientados no momento da desova. Na praia de Veneza também já foram realizados trabalhos de limpeza e algumas horas por dia monitorando o local.
Valter Silva é um dos 12 membros fixos da associação, e conta que a Calheta nunca beneficiou de uma associação que se dedicasse a construir um novo olhar sobre a comunidade, protecção animal ou até mesmo de apoio aos jovens.
Este membro da associação sublinha que o trabalho voluntário que a associação vem realizando no município de São Miguel, atrai muitos jovens. Segundo Valter Silva, são jovens formados, com vontade de pôr em prática o que aprenderam nas universidades, mas que a falta de apoio tem criado barreiras e feito com que estes jovens acabem optando por abandonar o município e se aventurem na emigração.
“O nosso objectivo é trabalhar no sentido de promover o turismo para a Calheta, São Miguel. Temos potencial para apostar no turismo, temos belas praias de mar, sol o ano inteiro, e é nisso que a nossa associação quer apostar para desencravar a economia local. Explorar o potencial de jovens, principalmente os jovens com formação superior. Infelizmente a falta de oportunidades e a nossa economia, até agora encravada, não proporcionam aos jovens (condições) para explorar e criar o seu próprio emprego”.
Como investir nos jovens
Magda Rebelo é uma jovem da comunidade de Ponta Verde, Calheta, que se congratula com a iniciativa da Associação Mar e Terra. Esta jovem, que trabalha em outro concelho do interior da ilha de Santiago, lamenta o facto de tantos jovens capacitados e com grandes talentos se sentirem obrigados a estabilizarem as suas vidas em outros concelhos por conta da falta de emprego e oportunidades no município.
“Calheta tem um grande potencial a ser explorado, além de belas praias de mar, temos jovens capacitados e preparados para contribuir para o desenvolvimento da nossa cidade. É de lamentar o facto de muitos jovens desperdiçarem o seu potencial ao se aventurarem na emigração. Penso que se o foco for voltado para ajudar o jovem a criar o seu próprio negócio, capacitá-lo com formação, ainda que de curta duração, facilitar crédito para investimentos locais, estas manobras vão incentivar estes jovens a investir no município e além de gerarem a sua própria renda, vão criar postos de trabalhos”.
Na mesma linha, Patrick Tavares indica que a capacitação e a valorização é o melhor caminho. Este jovem sublinha que muitos no concelho possuem um nível baixo de escolaridade, mas que são excelentes profissionais. Este representante da Associação acredita que se estes jovens forem auxiliados para concluírem os estudos, “o município só tem a ganhar”.
“Nesta altura, por exemplo, os trabalhos agrícolas estão em alta por conta das chuvas, temos jovens com experiência no combate às pragas, que podem perfeitamente colaborar com as autoridades ligadas ao sector da agricultura, mas não são notados, muitas vezes, pela baixa escolaridade, e vem técnicos de outros pontos do país para fazer um trabalho que poderia ser feito por um jovem local".
Prioridades
Miguel Barros, presidente da Associação Mar e Terra, informa que o maior obstáculo é a falta de apoio. Os membros realizam o trabalho voluntário. Além do grupo se dedicar à protecção das tartarugas, limpeza das praias, campanhas de limpeza no perímetro urbano, auxiliam as famílias mais vulneráveis na agricultura, nesta época de cultivo.
A Associação tem projectos a serem executados como aulas de apoio para as crianças do concelho, que vão abarcar todas as disciplinas e vão ser ministradas pelos jovens com formação superior. Em curso tem campanhas de recolha de materiais escolares para apoiar os alunos mais vulneráveis.
“Temos ideias também para o sector da agricultura, melhorar a produtividade e a qualidade dos produtos locais. Não temos muito, mas, por exemplo, nesta época formamos um grupo de voluntários que auxilia no trabalho no campo, na sementeira, monda e outros. Temos uma equipa de jovens preparados para actuar no combate às pragas, temos jovens na plantação de árvores, como guias turísticos, trabalhamos na consciencialização e divulgação de informações sobre espécies marinhas e conservação de areia no nosso concelho. Também temos jovens com vasta experiência na proteção das tartarugas e no combate à apanha da areia. No concelho de São Miguel é a primeira vez que um grupo de voluntários se dedica à proteção ambiental, e queremos fazer mais pela nossa cidade”.