Em Cabo Verde o ano de 2022 foi fortemente influenciado pelos impactos da guerra na Ucrânia, pelas alterações climaticas e pela Covid-19

PorAntónio Ludgero Correia,31 dez 2022 8:59

António Ludgero Correia - Analista político
António Ludgero Correia - Analista político

A guerra na Síria deu espaço para os russos – agora liderados por Putin – mostrarem ao Mundo que estavam de volta e que teriam de ser levados em conta em quantas situações de crise surgissem.

Que balanço faz do ano de 2022, particularmente a nível dos impactos que a guerra na Ucrânia e o aumento da inflação tiveram na vida das pessoas?

Quando se passou um certificado de óbito à Guerra Fria, não passou pela cabeça de ninguém que ela era preferível ao clima de paz pobre que foi se instalando um pouco por todo o mundo. Uma escaldante guerra fria se iniciou desde então. Não com as caraterísticas daquela que colocava frente-a-frente o social imperialismo soviético e o imperialismo americano, o Pacto de Varsóvia à NATO, mas, na mesma, uma luta encarniçada para a manutenção e ampliação das respetivas esferas de influência. O facto de os americanos terem ludibriado Gorbatchov, levando-o a desmontar a URSS, fez com que os USA se tornassem na única verdadeira potência militar e deixou os russos e outras nacionalidades afins bem ressabiados.

A guerra na Síria deu espaço para os russos – agora liderados por Putin – mostrarem ao Mundo que estavam de volta e que teriam de ser levados em conta em quantas situações de crise surgissem. Os Estados Unidos teriam de deixar a farda de polícias do mundo, mormente depois de sinais claros de entendimentos estratégicos entre a Rússia de Putin e a China de Xi Jinping.

A guerra da Ucrânia não é, portanto, um evento de geração espontânea, sendo antes o primeiro capítulo da escaldante guerra fria que, ao que parece, veio para ficar, face aos protagonistas em presença: o provocador Joe Biden (que sonha tornar-se no Presidente que levou mais longe o sonho de uns USA senhores do Mundo); o show-man Volodymyr Zelennsky (que está bem mais preocupado com sua projeção no mundo do show business do que com o bem-estar dos ucranianos); e o peludo Vladimir Putin (que, enroscado no seu atavismo primário, reage às provocações de Biden com um ato impensado – condenável e condenado – qual seja a invasão da Ucrânia).

Se ao ego desmedido destes protagonistas somarmos a necessidade de sobrevivência dos burocratas da NATO e a ganância dos senhores da guerra (mercadores de armas e empresários que ganham a vida reconstruindo cenários destruídos pela guerra, não raramente, financiada por eles) temos a receita para um conflito sem fim à vista e tendendo a sair dos limites territoriais do Leste europeu.

Na guerra não há vencedores. Mas dar-nos-íamos por satisfeitos se os vencidos fossem apenas os beligerantes. Mas, infelizmente, não é o caso da guerra da Ucrânia. Estamos falando de uma região que é uma das maiores produtoras de trigo e de hidrocarbonetos (líquidos e gasosos) do mundo. Sem o gás daquela região os europeus correm o risco de morrerem de frio no Inverno e sem os cereais o mundo todo corre sérios riscos de morrer de desnutrição. E isso são apenas os efeitos diretos. Indiretamente, afeta profundamente, o nosso estilo de vida, por influenciar – e muito – o custo de vida. Combustíveis mais caros se traduzem em transportes mais caros que, por sua vez, significam produtos mais caros; produção de energia mais cara que se traduz na alta generalizada de preços dos produtos manufaturados; enfim, um carrocel de causas-efeitos-causas que ameaçam desestruturar economias dantes bem calibradas.

E não é tudo. Há os caras-de-pau que inflacionam artificialmente o custo de vida, registrando, com um sorriso nos lábios, “é a crise, a guerra da Ucrânia, o senhor sabe…”. Até os proxenetas recorrem à guerra da Ucrânia para justificarem a alta do preço dos programas de suas meninas e seus meninos. É o Ó.

Em Cabo Verde – e um pouco por todo o Mundo - o ano de 2022 foi assim fortemente influenciado pelos impactos da guerra da Ucrânia, pelas manifestações das alterações climáticas (seca por cá e enchentes em outros lados, subida da temperatura global) e pelos altos e baixos nos níveis de afetação da COVID-19. Uma trindade que nos deixa preocupados em relação ao novo ano que aí vem.

Que expectativas para o ano de 2023?

As expectativas para 2023 resultam, ipso facto, sombrias.

Não se vê ainda uma luz ao fundo do túnel em relação à guerra da Ucrânia. Biden continua brincando com o destino do Mundo (conquanto seja eleito apenas com os votos de alguns estadunidenses) e tem dinheiro a rodos para investir em armamento topo de gama para o afilhado Zelensky; Putin, teimoso como é - e contando com aqueles que, como ele, se sentiram humilhados pelas cedências de Gorbatchov – não vai ceder, permitindo a instalação da NATO paredes-meias com o seu território (no que, convenhamos, terá carradas de razão); Zelensky de tão encantado que está com o tempo de antena extra que está tendo; com o novo rótulo com que nunca tinha sonhado (campeão da democracia – é de rir para não chorar); e com os milhões que deve estar amealhando com a sua performance vai querer que o show continue. Emanuel Macron e Xi Jinping poderão fazer algo para desatar este laço? Tenho minhas dúvidas, mas como a esperança é a última que morre…

No que às alterações climáticas diz respeito, as resoluções da última cimeira parece que deixam tudo como dantes no quartel de Abrantes. Se Elon Musk já busca parcerias para infraestruturar um planeta aqui próximo para ser o estepe do planeta azul… desse mato não vai sair coelho. As secas vão se tronando mais severas (chez nous, mesmo que não sejam severas, o efeito da acumulação de ‘n’ anos de seca acaba sendo severíssimo); as enchentes cada vez mais frequentes e mais devastadoras; as temperaturas cada vez mais altas, a fusão das calotas do Ártico mais profundas, a evaporação dos mares e lagos cada vez maior, de tal modo que como dizem os compositores da modinha “Sobradinho” (Sá & Guarabyra) talvez o sertão vire mar e o mar vire sertão. Nada de bom a esperar desse lado.

E quanto à COVID-19 estamos conversados. Se as pessoas continuam se desarmando, acreditando no fim da pandemia estamos tramados. Um pouco por todo o mundo se assiste ao regresso dos medos de 2020. Pode-se estar agradecido a quantos tornaram possível a sintetização de uma vacina em 10 meses e a sua distribuição à escala global, mas não se pode perder de vista que só essas vacinas não fazem tudo. A nossa contribuição é inestimável e indispensável. Ainda mais, quando se sabe que, normalmente, uma vacina leva 10 e mais anos a ser desenvolvida e estas da COVID-19 ficaram prontas em… 10 meses. Otimismo é bom, mas cautela e caldos de galinha nunca mataram ninguém.

Dito isto, resta voltarmos os olhos para os céus e nos abraçarmos, rogando bênçãos que nos tornem sapientes e mais solidários com a desventura do outro e com a sorte do planeta Terra. E esperar que Macron e Xi Jinping possam fazer algo pela PAZ MUNDIAL, afinal o sonho de consumo de meio mundo.

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1100 de 28 de Dezembro de 2022.

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Autoria:António Ludgero Correia,31 dez 2022 8:59

Editado porAndre Amaral  em  2 jan 2023 10:00

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