Quando o professor é vítima de violência nas escolas

PorSheilla Ribeiro,1 abr 2023 8:24

Casos de violência escolar sempre acendem o alerta para a Segurança Pública. Nesta linha, o SINDEP e o SIPROFIS apelam ao reforço de segurança no recinto escolar para que casos de violência contra professores não façam escola no país e não ponham em causa a qualidade do ensino. Já o ministro da Educação garante que as escolas continuam a ser dos lugares mais seguros para crianças e adolescentes.

Na passada segunda-feira, 20, o professor Adilson Medina expôs, no Facebook e na comunicação social, que foi vítima de agressão física e verbal por parte de uma mãe, após ter anulado um teste de uma aluna, apanhada com cábula.

Adilson Medina não é o primeiro a sofrer violência física ou verbal no recinto escolar. Em Outubro de 2022, a directora da Escola Portuguesa de Cabo Verde, Suzana Maximiano apresentou queixa contra uma mãe que a terá agredido e ameaçado por não ter permitido a matrícula do filho, após um ano sem pagar propinas.

Em declarações ao Expresso das Ilhas, a professora Aurísia Lopes, relata que também foi vítima de agressão verbal por parte de uma mãe, após ter impedido que esta ameaçasse os alunos.

“Era uma quinta-feira e estava numa turma do 5º ano, portanto, uma turma com alunos de cerca de 10 anos de idade. Logo que cheguei à sala fui seguida por uma mãe que ali foi ameaçar os alunos porque no dia anterior a filha tinha-se envolvido numa briga e, supostamente, vários colegas a agrediram”, relata.

A mãe, segundo a professora, ameaçou os colegas de turma, o que fez com que ela interviesse e pedisse que ela se retirasse da sala.

“Nisso, quase que ia ser agredida e tive de pedir ajuda de um outro professor para retirar essa mãe da sala. Já com a mãe fora da sala, fechei a porta. Uma vez que me neguei a abrir novamente a porta, essa mãe começou a chamar-me de nomes e todos os meus alunos estavam a escutar os palavrões. Senti muita vergonha”, alega.

Sindicatos apelam ao reforço da segurança nas escolas

Na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1101, de 4 de Janeiro de 2023, foi retratado que a segurança nas escolas é um problema que envolve conflitos entre grupos rivais, agressões físicas e caçobody, relatados pela comunidade educativa.

Porém, a agressão ao professor de História e Geografia de Cabo Verde, Adilson Medina, deu novo fôlego à questão.

Abordado pelo Expresso das Ilhas, o vice-presidente do Sindicato Nacional dos Professores (SINDEP), Jailson Lopes, refere que a agressão deste professor revela, mais uma vez, que é necessário reforçar a segurança no recinto escolar.

“O professor tem o direito, como todo o trabalhador, à segurança no local de trabalho. Da sua residência ao seu local de trabalho. O Governo é quem deve garantir essa segurança. Esse caso mostra, independentemente de quem tem ou não razão, que falta isso da parte do Governo, particularmente, do Ministério da Educação”, entende.

Segundo o SINDEP, há escolas com um nível de segurança “razoável” e outras que nem por isso. Para o sindicalista, o simples facto de um aluno entrar numa escola com arma já coloca a escola e o professor em risco.

“E isso é recorrente no país. Portanto, há situações múltiplas que mostram que, de facto, de forma generalizado, a nível nacional, é necessário e urgente que o Ministério pense no sentido de reforçar a segurança nas escolas, pelo bem dos professores, pelo bem dos alunos e pelo bem de toda a comunidade educativa”, considera.

Por sua vez, o presidente do Sindicato Professores de Santiago (SIPROFIS), Abraão Borges, considera o caso de Medina, um atentado não só contra o professor em causa, mas sim contra todo o sistema educativo.

“É um atentado contra a educação, é um atentado contra a qualidade de educação e é uma violência baseada no género (VBG). Somos contra VBG, somos contra a violência na educação seja por parte de quem for e seja contra quem for”, defende.

Perante esta situação, o SIPROFIS apela à uma cultura de paz na sociedade, tendo em conta “muitos sofrimentos” que os professores vêm sendo sujeitos ao ponto de receberem ameaças de morte, violência verbal e até violência física.

“Apelamos ao Ministério da Educação a assumir uma posição correcta em relação ao professor em causa por questão de prevenção, por questão de segurança do professor, segurança da escola em si e por uma questão de segurança de todas as escolas do país. Para que não se ponha em causa todo o sistema educativo cabo-verdiano”, apela.

No entanto, enfatiza que o programa Escola Segura é o melhor que há, embora o sindicato que preside não seja de acordo com a presença da Polícia na porta dos estabelecimentos de ensino.

“No próximo encontro com o Ministério da Educação vamos tocar nesse assunto e outros aspectos que têm a ver com a violência na escola e outros problemas que afectam os professores”, diz.

Casos de ataque a professores nas escolas desmotivam esses profissionais que poderão não exercer suas funções “em condições”, conforme ressalva. Nesse sentido, mostra-se solidário com Adilson Medina e apela ao maior diálogo entre os educadores e pais ou encarregados de educação.

“Há um conjunto de violência na escola que não abrange somente o professor, mas também os alunos e todo o colectivo. À nossa organização tem chegado informações violência contra professores. São sistemáticos os casos de pais que agridem professores”, sustenta.

Abrão Borges afirma que a violência contra o professor é generalizada e que ocorre em todo o país. Não apenas violência física e verbal, mas também violência psicológica que sofrem há vários anos.

Em termos de violência psicológica, explica que decorre por parte de todo o sistema educativo ao longo dos tempos e tem a ver com o desenvolvimento na carreira.

Quanto ao caso de Medina, Abraão Borges informe que o SIPROFIS denunciou o ocorrido à Confederação Sindical da Educação da CPLP e que aguarda a sua posição. O objectivo é chamar a atenção para que esta situação não faça escola no país.

Aos professores o sindicalista apela a que denunciem todo o tipo de violência que os impede de desenvolver o seu trabalho com dignidade.

Ministro admite ser necessário continuar a dispensar atenção em matéria de segurança nas escolas

No passado sábado, 25, em declarações à imprensa, o ministro da Educação, Amadeu Cruz, que se encontrava na Brava, reconheceu que em matéria de segurança nas escolas há uma noção clara que é necessário continuar a dispensar uma atenção particular.

Nesse sentido, garantiu que a tutela colocou um ponto focal para acompanhar a segurança nas escolas, particularmente na cidade da Praia.

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Conforme informou, o ponto focal está em diálogo permanente com as autoridades ligadas à segurança pública, designadamente, a Polícia Nacional, com o Ministério da Administração Interna, mas também tem estado a fazer visitas às escolas para, em diálogo com as suas direcções, encontrarem soluções para minimizar algum fenómeno da insegurança que possa surgir.

“Nós temos que deixar aqui uma mensagem clara. As escolas são seguras e continuarão a ser seguras. Se calhar, as escolas são, no contexto nacional, os lugares mais seguros para as nossas crianças, para os nossos adolescentes e, portanto, temos é que continuar com essa mensagem pela positiva, sem ignorar que é necessário intervir preventivamente e, se for necessário, coercivamente também para podermos ter um ambiente saudável e seguro nas escolas”, acredita.

No áudio do ministro disponibilizado ao Expresso das Ilhas pela sua assessoria, Amadeu Cruz refere que podem ocorrer uma ou outra situação de violência numa ou outra escola, por se tratar de um fenómeno que o Ministério não consegue controlar.

Ainda assim, assegura que não se pode naturalizar esses casos e que não se pode culpar nem aos pais, nem aos professores.

“Nós valorizamos por um lado, a participação dos pais na gestão das escolas, o acompanhamento dos alunos, pensamos que os pais devem continuar a acompanhar os seus alunos. Mas, nós também valorizamos e defendemos que os professores têm autoridade suficiente em matéria de avaliação das aprendizagens, de aplicação das provas, de correcção das provas, de atribuição das notas”, salienta.

Conforme sublinha, os dirigentes do Ministério não podem interferir naquilo que é a autonomia e a autoridade máxima do professor em sala de aula.

O governante garante que o Ministério da Educação não ignora o caso do professor Adilson Medina, contudo, realça que a tutela não foi comunicada previamente e que não teve uma comunicação directa ou uma denúncia do professor.

“Mas, tomando conhecimento através da comunicação social e das redes sociais nós fizemos aquilo que devemos fazer. Que é abrir um processo para conhecermos melhor os factos, e em função disso, determinar as medidas que devemos determinar”, precisou.

Por outro lado, esclarece que se há uma tentativa de agressão de uma mãe e se tiver acontecido fora do recinto escolar o professor tem legitimidade como cidadão de apresentar queixas às autoridades e também a encarregada de educação tem a legitimidade de se defender.

“Nós aqui ainda não temos uma posição porque não conhecemos os factos, a Inspecção-Geral está a analisar. Determinamos logo na terça-feira um processo inspectivo, estamos a aguardar. Mas, de qualquer das formas eu repito, nós respeitamos a autoridade do professor, é a autoridade máxima em processos de avaliação, nem os dirigentes do Ministério e muito menos os pais têm como interferir nesses processos”, reitera. 

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1113 de 29 de Março de 2023.

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Autoria:Sheilla Ribeiro,1 abr 2023 8:24

Editado porEdisângela Tavares  em  22 dez 2023 23:28

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