30 Anos da Constituição: PR defende profundas mudanças e PM entende que revisão não é urgente

PorSheilla Ribeiro,15 out 2022 9:00

Para o Presidente da República (PR) é tempo de fazer profundas mudanças e cumprir a Constituição da República de Cabo Verde (CRCV), nomeadamente no que diz respeito à língua cabo-verdiana. Por seu turno, o Primeiro-ministro (PM) apontou que poderá haver algum ajustamento constitucional sempre que haja necessidade de fazer a revisão, mas que não se trata de algo urgente.

Durante a sua intervenção na Sessão Solene comemorativa do 30º Aniversário da Constituição da República de Cabo Verde, o Chefe do Estado reportou que não se pode persistir na gestão do status quo e de pequenos e eventuais passos em frente. Nessa linha, acredita, que há riscos de perdas ou de regressão e que por isso é preciso “ousar”.

A celebração dos 30 anos da CRCV é, do ponto de vista de Neves, uma oportunidade para perceber “que é chegado o tempo para profundas mudanças”.

O PR apelou à “construção de uma nova e ousada relação” com a diáspora e apontou que a emigração dos jovens tem de acontecer por opção destes e não pela inexistência das oportunidades ou perda de esperança no país.

“Claramente não estamos a cumprir a Constituição no atinente à língua cabo-verdiana… persistimos, enquanto poderes públicos, por acção ou omissão, nesta afronta aos direitos linguísticos desta nação crioula que, na verdade, deu a crioulidade ao mundo. Algo não está bem, convenhamos. Algo precisa ser corrigido”, afirmou ainda.

José Maria Neves questionou também o cumprimento da CRCV no que tange à saúde, educação e acesso à Justiça.

À margem da cerimónia, em declarações à imprensa, o PM, por seu turno, referiu que poderá haver algum ajustamento constitucional sempre que haja necessidade de fazer a revisão, mas que não se trata de algo urgente.

Para o Chefe do Governo, os principais direitos salvaguardados na CRCV estão a ser cumpridos e mencionou que a liberdade, a democracia, a dignidade da pessoa humana e um regime político que garante estabilidade no país são os grandes ganhos.

“Para além daquilo que é o núcleo essencial, que tem a ver com a liberdade, com a dignidade, há direitos que têm a ver com a situação económica social das pessoas do país e que vão se realizando. Estou a falar, por exemplo, de um grande desafio que é a habitação condigna”, reconheceu.

Isto, disse, é algo que não se consegue resolver de uma só vez porque requer avultados recursos, mas que o caminho certo é continuar a investir, em boa parceria entre o Estado, Governo, os municípios e famílias.

Constituição da República é actual, estável e altamente consensual- PAN

O presidente da Assembleia Nacional, Austelino Correia, afirmou que a Constituição da República é actual, estável e altamente consensual, mas que não se trata de uma “obra acabada”, perfeita e com ‘soluções prontas’ para tudo.

“A sua maturidade ganhará cada vez mais consciência, quanto maior for a prática e cultura constitucional dos cidadãos, particularmente daqueles a quem cabe a tarefa maior de concretizá-la, defendê-la e protegê-la”, argumentou na sessão comemorativa.

Líderes partidários

No seu discurso, o líder parlamentar do PAICV, João Baptista Pereira, referiu que apesar de ganhos notáveis durante os 30 anos de vigência da Constituição da República de 1992, Cabo Verde continua sendo um país vulnerável, com constrangimentos e situações de deficit democrático e perversões do sistema.

“Desde logo, existe um mal-estar latente em Cabo Verde sobre a qualidade do sistema democrático, que se traduz, nomeadamente, na desconfiança com que os cabo-verdianos olham para as instituições democráticas e na sensação difusa de degradação da vida política”, discursou.

Como exemplo, apontou o facto de nas últimas eleições nacionais a abstenção ter atingido 42,2%, nas legislativas, e 52%, nas presidenciais.

Violência policial, situação das prisões, acesso às funções públicas em condições de igualdade, pobreza, aumento da litigância são alguns exemplos apontados pelo líder da oposição, como sendo um embaraço do sistema democrático nacional, bem como a queda de Cabo Verde no ranking da liberdade de imprensa.

Já para o representante da UCID, António Monteiro, nestes 30 anos, “muitas e na maioria das vezes” colocou-se o interesse do Estado em primeiro lugar, contrariando a essência da CRCV, de colocar a dignidade do cidadão cabo-verdiano acima de tudo.

“Ainda temos muito a percorrer para cumprir a CR de Cabo Verde. Enquanto representante da UCID, devo dizer a todos que ainda temos muito trabalho pela frente para fazermos os cidadãos sentirem que, na realidade, essa carta magna é o chapéu maior que garante os nossos direitos, liberdades e garantias, e que nós todos temos de lutar por ele, independentemente de estarmos a agradar a A, B ou C”, considerou.

António Monteiro pediu aos governantes, aos parlamentares, à sociedade civil cabo-verdiana, que juntem forças e capacidades ao serviço da Constituição de modo a ter um país unitário, coeso e um país em que o cidadão tem esperança no dia do amanhã.

Por sua vez, o líder parlamentar do MpD, Paulo Veiga, assegurou que o partido não pode e não deve contentar-se com a mera existência da CRCV e como se encontra actualmente formulada.

“Doze anos depois, num quadro de desejável estabilidade, parece ser tempo de a Constituição – embora consensual na sua matriz e identidade – ser avaliada na sua aplicação e impacto, e quiçá corrigida onde se justificar. Porque, como a Democracia, a Constituição nunca é uma obra imutável, acabada e perfeita”, defendeu.

As revisões pontuais ordinárias são, conforme Paulo Veiga, momentos de actualização para garantir a estabilidade e tendencial perenidade do essencial da Constituição. Por isso, prosseguiu, participar activamente nas suas revisões é um dos mais eficientes modos de defender a Lei Fundamental. 

Texto publicado originalmente na edição nº1089 do Expresso das Ilhas de 12 de Outubro

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Autoria:Sheilla Ribeiro,15 out 2022 9:00

Editado porJorge Montezinho  em  5 jul 2023 23:28

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