A decisão foi tomada em sessão ordinária, de Conferência, no dia 10 de Outubro.
De recordar que na passada terça-feira, dia 8, a Presidência da República pediu a nulidade do relatório do Tribunal de Contas dizendo que o documento deve ser considerado nulo porque a deliberação, datada de 26 de Setembro, “foi subscrita pelo Juiz Conselheiro e pelos demais Juízes Conselheiros da mesma secção que se mantêm em funções depois do decurso do prazo de cinco anos sobre a data em que foram empossados pelo Presidente da República”.
Assim, acrescenta a Presidência, “uma vez que teve o seu início no dia 13 de Novembro de 2018, o mandato de cada um dos excelentíssimos senhores juízes conselheiros do Tribunal de Contas expirou às 24 horas do dia 13 de Novembro de 2023”.
Acrescentando que o Tribunal de Contas é um Órgão de soberania, a Presidência da República alega que este tribunal “não pode, no exercício das suas funções, aplicar normas contrárias à Constituição ou aos princípios nela consignados, conforme preceitua a norma constante do nº 3 do artigo 211º da CRCV”.
“Resumindo e concluindo, a permanência em funções dos Juízes Conselheiros do Tribunal de Contas, incluindo os que intervieram na deliberação cuja nulidade se argui, baseia-se na norma constante do artigo 17º, nº 2” da lei que regula a composição, a competência, o processo e o funcionamento do Tribunal de Contas.
Juízes postos em causa
Esta segunda-feira, no programa Opinião Pública, da RCV, o jurista Olavo Freire disse que o pedido de nulidade interposto pela Presidência da República pôs “em causa a legitimidade dos juízes” do Tribunal de Contas.
O jurista aponta igualmente para o art. 17 da Lei do Tribunal de Contas que explica que “o termo de mandato de cada um dos juízes do Tribunal de Contas, é independente do termo de mandato dos restantes juízes e verifica-se com a posse do novo titular”. Portanto, prossegue Olavo Freire, “nós não podemos ter de forma nenhuma um hiato. Portanto, o juiz terminou, mas as instituições têm que funcionar e justamente por isso o legislador colocou no artigo 17º, que não obstante o término se verifica e as instituições têm que continuar e as decisões têm que ser proferidas”.
O caso português
Em Portugal, em Julho de 2023, o Tribunal Constitucional viu-se confrontado com uma situação idêntica. Dois juízes daquela instância tinham o seu mandato expirado, o que serviu de base para que algumas das decisões do Tribunal Constitucional fossem alvo de pedidos de impugnação.
No Acórdão nº505/2023, publicado no site do Tribunal Constitucional português, é anunciado o indeferimento dos pedidos de impugnação e inconstitucionalidade e “reafirma-se a ausência de qualquer esgotamento do poder jurisdicional, detendo todos os Senhores Juízes Conselheiros que intervieram nos presentes autos, por inteiro, jurisdição e competência no âmbito do processo em apreço, não havendo qualquer nulidade ou inexistência essencial da decisão reclamada a considerar”.
“A tese dos recorrentes não colhe”, refere ainda o tribunal português que acrescenta que “o modelo de sucessão dos mandatos dos juízes é domínio que a Constituição expressamente remeteu à Assembleia da República”.
Jorge Bacelar Gouveia, constitucionalista português, que esteve presente esta segunda-feira nas Jornadas Internacionais da Justiça recorda o caso e lembra que o que está em causa, e presente na Constituição Portuguesa, é “o princípio da continuidade da função do Estado”.
No entanto, o constitucionalista dá o exemplo do caso do Tribunal Constitucional italiano em que, no que respeita ao Tribunal Constitucional daquele país, “o mandato cessa automaticamente terminado de prazo de 9 anos. Acabou-se.Não fica à espera”.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1194 de 16 de Outubro de 2024.