José Maria Neves discursou esta manhã, em Sevilha, na sessão plenária da IV Conferência Internacional sobre o Financiamento para o Desenvolvimento.
No seu discurso, o Chefe de Estado alertou que o actual défice anual de 4 biliões de dólares no financiamento dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) constitui um sinal de alarme global e um reflexo das profundas desigualdades do sistema financeiro internacional, que continua a penalizar os países mais vulneráveis.
“Vivemos num tempo de exigência histórica. Cabo Verde conhece bem essas limitações. Temos reformado as finanças públicas, ampliado a base tributária com justiça, digitalizado processos e alinhado políticas fiscais e orçamentais com os ODS. Contudo, nenhuma prudência interna compensa os constrangimentos sistémicos de um sistema que permanece pouco acessível, pouco justo e pouco responsivo às nossas realidades”, afirmou.
O Presidente da República identificou três grandes desafios estruturais enfrentados pelos SIDS: o peso da dívida, a fragilidade económica face a choques externos e as limitações institucionais na gestão da despesa pública. No caso específico de Cabo Verde, sublinhou a vulnerabilidade perante os efeitos das alterações climáticas, apesar da ínfima contribuição do país para as emissões globais.
“Com menos de 0,003% das emissões globais, Cabo Verde enfrenta impactos desproporcionais da crise climática, com recursos escassos para responder e reconstruir”, lembrou, reforçando o apelo a “financiamento climático adicional, previsível e direccionado à adaptação”, em áreas como as energias renováveis, a protecção costeira, a gestão da água e a sustentabilidade dos oceanos.
Durante a sua intervenção, José Maria Neves reafirmou o apoio de Cabo Verde à Agenda de Antígua e Barbuda para os SIDS (ABAS), advertindo, porém, que, sem financiamento adequado, a sua implementação corre o risco de não sair do papel.
“Os compromissos assumidos precisam de ser acompanhados por instrumentos eficazes e acessíveis — desde fundos azuis e verdes até à troca de dívida por investimentos sustentáveis, bem como ao reforço do apoio técnico aos países mais vulneráveis.”
O Chefe de Estado saudou ainda a adopção do Índice de Vulnerabilidade Multidimensional (MVI) pelas Nações Unidas e apelou a que este passe a ser utilizado pelas instituições financeiras internacionais como critério adicional ao PIB per capita na definição do acesso a financiamento e cooperação.
“O MVI é essencial para que a arquitectura financeira internacional seja mais sensível, mais justa e mais adaptada”, afirmou, acrescentando que é também necessária uma maior presença dos SIDS nas instâncias de decisão económica e financeira globais.
Para José Maria Neves, é imperioso reforçar a mobilização de recursos internos com sistemas fiscais modernos e progressivos, apoiados por políticas públicas que fomentem o sector privado, as pequenas e médias empresas e o empreendedorismo jovem.
“A FFD4 não pode ser mais uma promessa adiada. Deve assinalar o início de um novo ciclo de coerência, corresponsabilidade e solidariedade global — em que o financiamento deixe de ser privilégio e passe a ser instrumento de justiça intergeracional e vector de prosperidade partilhada. Cabo Verde está pronto para assumir esse compromisso, com voz firme e contributo construtivo. Porque, sem justiça fiscal, não há equidade global. Sem financiamento justo, não há transformação real. E, sem inclusão, o desenvolvimento será sempre incompleto.”