O último caso de que a Polícia Judiciária deu conta aconteceu no Sal no passado dia 12 de Abril.
Um homem de 22 anos tinha sido detido por ser suspeito da autoria de quatro crimes de abuso sexual de menor entre Julho do ano passado e Janeiro de 2018. A vítima tem 13 anos e acabou por ficar grávida do abusador.
O detido foi presente às autoridades judiciárias competentes, para o primeiro interrogatório e aplicação de medidas de coacção, tendo sido aplicada a medida mais grave, prisão preventiva.
Outro caso, talvez mais chocante pela idade das vítimas. Duas crianças, uma menina e um menino, de 3 e 5 anos foram abusados sexualmente por dois homens de 19 e 25 anos. Os casos ocorreram em 2014 e 2016 e as vítimas eram vizinhas dos suspeitos. Presentes a Tribunal os dois homens ficaram a aguardar julgamento, sujeitos a Termo de Identidade e Residência e proibidos de deixar o país.
Estes são apenas dois casos que a Polícia Judiciária entregou à Justiça para que os suspeitos sejam julgados. No entanto, o Ministério Público tem em mãos mais de cinco centenas de casos só de abuso sexual de crianças, um número que se explica pela elevada quantidade de processos pendentes e que transitaram do anterior ano judicial (448).
Mas os crimes sexuais assumem diversas formas. E, segundo dados disponibilizados pelo Ministério Público, entre Agosto de 2017 e Janeiro de 2018, deram entrada, na Procuradoria-Geral da República, 271 casos de alegados crimes sexuais.
UNICEF preocupada
“O abuso sexual contra crianças continua a ser uma preocupação porque não conhecemos ainda bem qual é a magnitude do problema. Há denúncias, e isso é bom, mas queremos que as denúncias continuem e que a resposta seja adequada. A justiça tem de ser rápida e muito consistente e coerente”, disse Ulrika Richardson.
A também representante máxima do sistema das Nações Unidas em Cabo Verde falava à agência Lusa no âmbito de uma visita ao Centro de Emergência Infantil do Instituto Cabo-Verdiano da Criança e do Adolescente (ICCA), na cidade da Praia.
Ulrika Richardson considerou positivo o facto de abuso sexual de crianças em Cabo Verde ter deixado, em certa medida, de ser “tabu”, mas considerou serem precisas respostas.
CSMJ nega ligeireza no tratamento dos casos
Em comunicado emitido esta semana, o Conselho Superior de Magistratura Judicial negou que os casos de abuso sexual de menores sejam tratados de forma ligeira.
No texto enviado à comunicação social, o CSMJ esclarece que “a aplicação da prisão preventiva dependerá da comprovada existência de fortes indícios da prática de um crime por parte do suspeito ou do arguido” e que, no caso que motivou esta reacção, o juiz que presidiu ao primeiro interrogatório dos arguidos detidos “concluiu que, face aos elementos de prova carreados para os autos, os indícios eram frágeis, e dado que por princípio não se deve prender para investigar, decidiu aplicar aos arguidos o Termo de Identidade e Residência (TIR) acumulado com a proibição de contactos com a ofendida”.
Ainda segundo o comunicado do CSMJ “o próprio Ministério Público, que tem a direcção da investigação e que deve actuar com respeito aos princípios da imparcialidade e da legalidade (art. 227º, 2 da CRCV) requereu ao juiz que aplicasse aos arguidos as medidas de TIR, proibição de contacto e apresentação periódica, tendo o juiz aplicado as medidas de TIR e proibição de contacto, por serem as adequadas ao quadro factual apresentado no processo e em concomitância com as exigências cautelares patenteadas no caso em tela”.
“Se é verdade que o Tribunal não pode de forma ligeira soltar suspeitos da prática de crimes graves (numa perspectiva vitimológica) não é menos verdade que o Tribunal de igual modo não pode de forma ligeira coartar a liberdade dos cidadãos (numa perspectiva garantística), devendo haver sim a devida ponderação dos valores em pauta, com preponderância, em caso de dúvida, do direito a liberdade (cfr. Art. 29º, 1, 30º,1, 2 e 3 da CRCV)”, reforça o CSMJ.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 855 de 18 de Abril de 2018.