“O Governo planeia vender o resto das acções da TACV (Cabo Verde Airlines) e privatizar outras empresas públicas, mas acreditamos que esta intenção pode ser prejudicada pela existência de um pequeno mercado interno e limitado interesse dos investidores estrangeiros”, escrevem os analistas da Fitch num relatório sobre os ‘ratings’ na África subsaariana.
No documento, enviado aos clientes e a que a Lusa teve acesso, a Fitch lembra que o Governo vendeu 51% da transportadora em Março e que, apesar de ainda ter 105 milhões de euros de dívida antiga da companhia, pode reduzir o montante das transferências futuras.
As empresas públicas, de resto, são apresentadas como um dos maiores perigos à estabilidade financeira do arquipélago, com as dívidas destas empresas a representarem 26% do PIB, dos quais 7% são garantidos pelo Estado.
A agência de notação financeira atribui uma nota B, com Perspectiva de Evolução Estável, destacando que “o ‘rating’ equilibra a elevada dívida pública e endividamento externo, as vulnerabilidades das grandes empresas públicas e a grande dependência do turismo, face a uma governação forte, maturidades longas e um serviço da dívida baixo relativamente à dívida pública externa”.
Cabo Verde é um dos países com um rácio da dívida pública face ao PIB mais elevado, representando 123% no final do ano, o dobro da média de 58% registada pelos países com um ‘rating’ de B pela Fitch, mas os analistas apontam que “o rácio deve descer para menos de 100% do PIB em 2025 se o governo aderir à estratégia de consolidação orçamental e controlar os custos das empresas públicas”.
Em termos de crescimento económico, a Fitch estima uma expansão da economia na ordem dos 5% entre este ano e 2021, ligeiramente abaixo dos 5,5% registados no ano passado, e salienta que “investimentos importantes na conectividade marítima e aérea podem aumentar ainda mais o potencial de crescimento” do arquipélago.
No documento, a Fitch escreve ainda que apesar de a dívida externa representar 41% no final do ano passado, um valor considerado “elevado”, os riscos são mitigados por serem empréstimos concessionais, pelo câmbio fixo do escudo face ao euro e por reservas robustas em moeda estrangeira.
“Diminuir a concessionalidade [empréstimos abaixo das taxas de juro praticadas pelos bancos comerciais] vai levar a um aumento gradual do serviço da dívida”, avisam.
No relatório, a Fitch afirma, a nível regional, que a dívida pública na África subsaariana deverá estabilizar nos 56% este ano, o que compara com a previsão de 83,8% para Angola, 123% para Cabo Verde e de 100,7% para Moçambique, os três países lusófonos analisados pela Fitch Ratings.
“A subida da dívida combinada com um recurso crescente à dívida comercial e a emissões de dívida fez com que os gastos dos países da África subsaariana em juros da dívida tenham subido, para uma média de 13% em 2019, com cinco dos 19 países analisados com um rácio superior a 20%, o que sugere que há uma margem limitada em caso de choque”, alertam os analistas.
Entre os 19 países analisados pela Fitch, três têm uma Perspectiva de Evolução Negativa, um está com Perspectiva de Evolução Positiva e todos os outros têm uma Perspectiva de Evolução Estável.
A Fitch espera um crescimento de 4,1% este ano, ligeiramente acima dos 4% de 2018, e espera um crescimento um pouco maior em 2020, estimando que as duas maiores economias africanas, a Nigéria e África do Sul, tenham um crescimento em linha com o do ano passado, e antecipam que Angola “consiga simplesmente evitar uma nova contracção do PIB em 2020”, com o resto da região a dividir-se entre importadores de matérias-primas, que terão um crescimento rápido, e um grupo de exportadores destes materiais que ainda estão a recuperar do choque.