Banco de Cabo Verde não mexe na livre circulação de capitais

PorJorge Montezinho,11 abr 2020 9:26

As economias emergentes estão a sofrer um efeito colateral com a crise da Covid-19, uma fuga de capitais em massa. de acordo com os cálculos do Instituto de Finanças Internacionais, as perdas já ultrapassam os 29,3 mil milhões de dólares. Em Cabo Verde, diz o Banco Central ao Expresso das Ilhas, não se nota este efeito, e não estão previstas quaisquer alterações ou restrições ao regime de movimentação de capitais em vigor.

Na resposta enviada ao Expresso das Ilhas, o Banco Central cabo-verdiano diz que “a análise das operações cambiais e transações com o exterior realizadas e intermediadas pelos bancos nacionais continua a não sugerir alterações significativas no comportamento nem das empresas, nem dos particulares, desde finais de julho de 2018”, altura em que entrou em vigor o normativo que liberaliza integralmente as operações cambiais e as transações económicas e financeiras com o exterior [Decreto legislativo nº 3/2018, de 22 de junho].

Ainda segundo o BCV, “o pacote excepcional de medidas de estímulo monetário e de flexibilização prudencial, adotado recentemente pelo BCV, tem como objetivo fundamental mitigar o impacto do novo coronavírus na economia nacional, não prevendo essas medidas quaisquer alterações ou restrições ao regime de movimentação de capitais em vigor, que permanece tal como previsto no Decreto legislativo”.

Cabo Verde está, assim, em contra-ciclo ao que tem acontecido a nível global nas economias emergentes, onde os governos têm adoptado políticas para tentar conter a saída de capitais, fuga que já ronda os 30 mil milhões de dólares.

A própria agência de notação financeira Fitch considerou, no final do mês passado, que o surto do novo coronavírus, aliado à descida dos preços do petróleo, poderia originar uma fuga de capitais de África, onde os governos enfrentam dificuldades económicas.

“O sentimento sombrio não afecta apenas o financiamento nos mercados internacionais, também pode levar à saída de investimentos e de capitais em locais onde há investimentos em moeda local”, disse o analista Mahmoud Harb à agência de informação financeira Bloomberg, no dia em que a agência de rating enviou um relatório sobre os efeitos do surto e da descida dos preços do petróleo em África e no Médio Oriente.

Os principais exportadores na África subsaariana (Nigéria e Angola) estão especialmente vulneráveis, assinalou o analista.

Ainda em Março, os investidores estrangeiros venderam 1,2 mil milhões de dólares de títulos de dívida da África do Sul, e ao contrário da crise de 2014, que empurrou os produtores de matérias-primas para uma recessão, agora os países africanos estão sem espaço para aumentar a despesa pública.

Para além da elevada dívida pública que afeta boa parte dos países africanos, os governos desta região “têm um limitado espaço orçamental e almofadas externas, no sentido em que não têm ativos disponíveis para usar de forma contracíclica, como grandes fundos soberanos bem apetrechados”, alertou Mahmoud Harb.

Esta saída de capitais o maior número já registado, muito superior ao da crise financeira de 2008 e às turbulências nos mercados financeiros chineses em 2015. Nessa altura, cerca de um mês e meio depois do início de cada uma das crises, as fugas não chegavam a 20 e 15 mil milhões de dólares, respectivamente. “Estamos a meio da pior fuga [de capitais] já registrada”, disse ao EL PAÍS, o responsável pela estatística e economista do Instituto de Finanças Internacionais, Jonathan Fortun Vargas.

Os números do Instituto de Finanças Internacionais incorporam e consolidam dados de uma vintena de países, entre eles a China e a Coreia do Sul (dois dos países mais afectados pelo vírus) além da Índia, Brasil, México, Colômbia e África do Sul, entre outros. É uma imagem global bem fidedigna do bloco no seu conjunto. “A nossa amostra cobre 85% a 90% dos fluxos dos países emergentes”, diz Jonathan Fortun Vargas, que aponta a América Latina como uma das grandes prejudicadas pela fuga de capitais.

Em Cabo Verde, para já, o cenário é diferente. Segundo o BCV, “decorridos mais de um ano desde a entrada em pleno da livre circulação de capitais, os sinais não indicam alterações relevantes no padrão das saídas. Pelo contrário, as transações económicas e financeiras com exterior determinaram um aumento excecional do stock de reservas externas do país em 2019, em cerca de 133 milhões de euros, atingindo cerca de 661 milhões de euros, permitindo cobrir 6,9 meses de importações de bens e serviços, um nível considerado confortável para o país”.

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 958 de 8 de Abril de 2020. 

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Autoria:Jorge Montezinho,11 abr 2020 9:26

Editado porDulcina Mendes  em  18 jan 2021 23:21

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