Cabo-verdiano Joseph Martial Ribeiro foi o escolhido: As ideias do novo Vice-director do BAD para a África Ocidental

PorJorge Montezinho,16 jan 2021 8:05

O cargo “oferece inúmeras oportunidades para implementar os High 5 de forma sustentável e eficaz”, disse Joseph Martial Ribeiro, numa primeira reacção à nomeação para Vice-director para a África Ocidental, assumindo assim o seu compromisso com as prioridades (os High 5) enumeradas pelo presidente do Banco Africano para o Desenvolvimento, Akinwumi Adesina, para o mandato.

Joseph Martial Ribeiro é o escolhido pelo presidente do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) para ser o Vice-director geral da região da África Ocidental. A mudança dos líderes dos escritórios regionais é a primeira grande reforma desde que Akinwumi Adesina foi reeleito, unanimemente, presidente do banco, no final do ano passado, e serve para preparar o envolvimento do banco na recuperação das economias africanas a seguir à pandemia.

“O Joseph tem conseguido, com sucesso, representar o banco em três países lusófonos, para além de ser um profissional realizado com grande experiência política e capacidade de gestão”, disse Adesina, citado no site do BAD.

Joseph Ribeiro era até agora o representante residente do BAD em Angola, acumulando também as funções de elo de ligação com São Tomé e Príncipe. “A sua experiência no terreno e o seu profundo conhecimento dos projectos de desenvolvimento públicos e das parceiras público-privadas vão contribuir enormemente para o sucesso das operações do Banco na África Ocidental”, acrescentou o CEO do BAD.

Em declarações no site do BAD, Joseph Martial Ribeiro declarou estar “muito honrado com a confiança que o Presidente Adesina depositou em mim através desta nomeação de prestígio. Estou muito satisfeito por assumir esta responsabilidade”.

Modelos de desenvolvimento

Confesso admirador do modelo económico asiático, Martial Ribeiro defende um processo de desenvolvimento semelhante para o continente africano, como foi escrevendo nos vários artigos de opinião que publicou, nos últimos anos, no Expresso das Ilhas. Um dos casos emblemáticos que apontou é o de Singapura, o exemplo de país pequeno, sem recursos naturais e sem mercado doméstico significativo que conseguiu desenvolver-se ao ponto de ser considerada a segunda economia mais competitiva do mundo, apenas atrás dos EUA.

O progresso económico de Singapura aconteceu por cinco fases, a primeira, durante os anos 60, estabeleceu indústrias de alta intensidade de mão-de-obra, a segunda, a partir dos anos 70, diversificou a economia apostando em quatro sectores industriais estratégicos – eletrónica, engenharia de precisão, química e ciências biomédicas – na terceira (anos 80), na quarta (anos 90) e na quinta (a partir de 2000), fomentou investimentos de grande envergadura e adoptou políticas encorajadoras do uso intensivo da tecnologia e das atividades de pesquisa e inovação.

Apesar de reconhecer que a industrialização será o motor do desenvolvimento de África, Martial Ribeiro considera que falta ainda uma abordagem faseada e firme por parte de muitos países africanos. Por outro lado, escreveu, a inovação e a modernização passam pela aposta constante em recursos humanos qualificados.

Mas além destes dois temas, há dois aspectos particulares que o economista quer ver trabalhados, porque condicionam fortemente a capacidade dos países em se desenvolverem: em primeiro lugar, a qualidade das Instituições, e em segundo lugar, a aposta no crescimento da produtividade das empresas nacionais.

“Conforta observar que não obstante o cenário pouco animador na África subsariana há boas notícias com o posicionamento do Ruanda logo na 19ª posição mundial no que respeita a eficiência do sistema legal nacional em resolver litígios (classificação liderada por Singapura) e na 5ª posição mundial no que respeita a eficiência na administração territorial (classificação também liderada por Singapura). Este dois aspetos são fundamentais para a atracção do investimento direito estrangeiro e o propiciamento de investimento imobiliário pelos próprios cidadãos que assim contribuem para a urbanização mais célere do território e para a criação de empregos na indústria da construção, como se verifica sobremaneira neste país da África de leste”, escreveu Martial Ribeiro no Expresso das Ilhas.

Para o economista, a qualidade das instituições e a produtividade das empresas nacionais é fulcral para qualquer país atingir a meta de crescimento sustentável. Já os incentivos fiscais, muitas vezes concedidos pelos países africanos para atraírem investimento estrangeiro, considera Joseph Ribeiro, nem sempre surtem os efeitos económicos pretendidos, “uma vez que induzem custos de oportunidade significativos” além que, refere, “a maior parte dos investidores investiriam mesmo não havendo isenções fiscais por valorizarem mais outros factores tais a estabilidade jurídica e macroeconómica, e o custo acessível das matérias-primas”. Daí, defende, a necessidade de repensar as estratégias desenvolvimentistas para a África subsariana e de por em prática novos paradigmas.

Aposta nas infra-estruturas

A infra-estruturação do continente tem sido outra das pedras de toque de Martial Ribeiro. Como escreveu o agora Vice-director do BAD para a África Ocidental, uma das causas fundamentais do atraso económico do continente, principalmente da região subsariana, reside na inadequação, quantitativa e qualitativa, das infra-estruturas que devem “imperativamente ser tornadas modernas e produtivas, particularmente no que diz respeito aos sistemas dos transportes, eletricidade e água potável e saneamento”.

No entanto, tem avisado igualmente, que convém reconhecer que o progresso em matéria de infra-estruturação em África, em especial a subsaariana, tem sido escasso. Daí a necessidade de refletir sobre “esta disparidade marcante entre, por um lado, a vontade política expressa, e por outro, o fraco êxito que se tem observado no terreno”.

Em resumo, os factores de produção, que são a terra e toda a natureza, o trabalho, o capital financeiro, o empreendedorismo e, acessoriamente, o conhecimento, só podem ser combinados de forma a gerar maiores proveitos, num contexto de infra-estruturas suficientes e fiáveis e o papel crucial das infra-estruturas “não dispensa os efeitos catalíticos fundamentais gerados por uma administração pública eficiente e transparente e de um ambiente de negócio propício”, realçou Martial Ribeiro.

Para uma boa infra-estruturação, defende Martial Ribeiro, os governos africanos devem procurar envolver sistematicamente a perícia nacional na concepção e gestão de grandes projetos de infra-estruturas, através do desenvolvimento de uma “pipeline” de projectos de infra-estruturas eficazes em termos de custos e que respondam às necessidades, actuais e futuras, da população, por exemplo, num horizonte temporal de 25 anos. “Especificamente”, escreveu, “é necessário ter planos estratégicos para cada subsector de infra-estruturas (Transportes, Energia, Telecomunicações, Água e saneamento) e planos diretores devidamente estudados com consultas aos membros da sociedade civil. Estes planos irão definir os programas e projectos de desenvolvimento a serem implementados. Num contexto de crescimento constante da dívida pública, os países africanos não podem dar-se o luxo de financiar infra-estruturas cuja produtividade e rentabilidade não sejam demonstradas; os projetos devem ser objecto de um plano de negócios detalhado e abrangente antes do fecho de qualquer financiamento”.

Por outro lado, avisa, os governos africanos devem tomar medidas apropriadas para combater a corrupção em projectos de infra-estruturas que, muitas vezes, envolvem orçamentos substanciais e são alvo de práticas ilícitas, complacência e desvios. “Essas más práticas são um factor-chave no alarmante ciclo de reendividamento em que África subsaariana se encontra, colocando em risco a qualidade de vida das gerações presentes e futuras”.

Uma outra preocupação do economista, reiteradamente referida, é que mesmo com planos de infra-estruturas firmados e validados, os projetos individuais devem ser preparados adequadamente no sentido de determinar os custos e ganhos que irão proporcionar e daí demonstrar a sua viabilidade económica e financeira. “A preparação dos projectos inclui todos os estudos de identificação, previsibilidade, viabilidade, engenharia detalhada e documentos do concurso que levam a uma definição completa dos projectos e à especificação das suas exigências em termos de orçamento e prazos de realização”.

A mensagem que Martial Ribeiro tem feito passar, no fundo, é que uma forte competência administrativa é necessária para realizar, ou acompanhar, todos os pré-requisitos para a implementação de projetos infra-estruturantes das economias. Esta boa implementação dos projectos de infra-estruturas requer a observância de requisitos de qualidade técnica e de desempenho, custo e prazo de realização, o que se alcança por via de processos de contratação concorrenciais e transparentes e de fiscalização competente. E sem a rentabilidade financeira, é impossível explorar de forma sustentável as grandes infra-estruturas.

Os High 5, ou as prioridades do BAD para África

No seu discurso inaugural, a 1 de Setembro de 2015, o oitavo presidente eleito do Grupo do Banco Africano de Desenvolvimento, Akinwumi Adesina, estabeleceu uma nova agenda para o Grupo, com base na Estratégia 2013-2022, anteriormente estabelecida. Nessa intervenção, Adesina delineou as cinco prioridades de desenvolvimento da instituição, os High 5: iluminar, alimentar, industrializar, integrar e melhorar a qualidade de vida das pessoas. Estas áreas são consideradas essenciais para transformar a vida dos povos africanos e, como é lógico, são consistentes com a agenda das Nações Unidas para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

Dois anos antes, em 2013, o Conselho do Banco Africano de Desenvolvimento tinha aprovado uma Estratégia de Dez Anos, intitulada no Centro da Transformação de África (TYS, na sigla em inglês, “At the Center of Africa’s Transformation”). Os objetivos gémeos do TYS são a conquista do crescimento inclusivo e a transição para o crescimento verde através de cinco prioridades operacionais: desenvolvimento de infra-estruturas, integração económica regional, desenvolvimento do sector privado, governança e responsabilidade, e capacitação e tecnologia. Além disso, o TYS destaca três áreas de destaque especial: género, estados frágeis e agricultura e segurança alimentar.

Estas cinco áreas prioritárias não são apenas centrais para o TYS, mas também estão intrinsecamente ligadas aos ODS e aos compromissos globais assumidos sobre as mudanças climáticas, que foram adoptados após a aprovação do TYS. Estas cinco prioridades também foram destacadas como prioridades críticas na Agenda 2063 para África, desenvolvida em parceria com a União Africana.

Embora o continente tenha experimentado um crescimento consistente na última década, 120 milhões de africanos continuam sem trabalho, 42 por cento da população ainda vive abaixo da linha de pobreza (1 dólar e 25 por dia) e cerca de uma em cada quatro pessoas na África Subsariana permanece subnutrida. A desigualdade também é alta: seis dos dez países mais desiguais do mundo são africanos, afectando principalmente as mulheres e os jovens. Embora seja reconhecido que África é o continente que menos contribui para as emissões de carbono globalmente, o continente também é o mais vulnerável à variabilidade e às mudanças climáticas.

Conseguir crescimento inclusivo exigirá o aumento do acesso a oportunidades económicas para mais pessoas, países e regiões, e ajudar o continente a gerar empregos produtivos tão necessários, protegendo ao mesmo tempo os vulneráveis. Apoiar a transição para o crescimento verde exigirá a integração de iniciativas de desenvolvimento sustentável por meio de investimentos em energia limpa e renovável, agricultura inteligente para o clima e gestão sustentável de recursos hídricos.

O Banco Africano de Desenvolvimento pretende aumentar as operações nas 5 áreas de alta prioridade, os High 5, de acordo com os objetivos do TYS. 

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 998 de 13 de Janeiro de 2021.

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Autoria:Jorge Montezinho,16 jan 2021 8:05

Editado porFretson Rocha  em  14 out 2021 23:21

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