Os primeiros casos foram registados na segunda semana de setembro de 1856, causando grande temor no seio da população, o que acabou por provocar a sua rápida disseminação na ilha.
“Logo que um foco se declarava numa localidade, imediatamente se dava a debandada das pessoas que podia, indo algumas já contaminadas.”2
Numa nota dirigida ao Governador-geral da Província de Cabo Verde, em 24 de novembro de 1856, o administrador o Concelho da Ilha de São Nicolau, João António Leite, envia o mapa da população da Vila da Ribeira Brava, dando conta da “horrível mortandade que houve nos habitantes da Villa.”3
O referido mapa, mostra-nos que nesse ano, a Vila da Ribeira Brava contava com 2.454 habitantes, dos quais 1.325 foram vítimas da cólera-mórbus.
“A Villa era um vasto cemitério; a maioria das casas foram incendiadas para se queimarem os cadáveres insepultos (…).”4
De entre os falecidos, contaram muitas individualidades notáveis da ilha de São Nicolau, a saber:
Nicolau António Duarte - Comandante Militar.
José Craveiro da Silva Mattoso – escrivão de Direito.
Padre José Soares da Luz – Vigário.
Padre Theotonio Marianno de Faria.
Joaquim Mathias Ramos – Tenente.
Manoel Joaquim de Almeida – Tenente.
Manoel Joaquim Sant’Anna.
Serafim Manoel de Sant’Anna – escrivão da Alfandega.
Silvestre António Rodrigues.
António dos Santos de Brito.
António Joaquim de Brito – Tenente.
António José Joia – Capitão.
Francisco Silvestre – Tenente.
D. Maria Roza da Conceição.
Joaquim dos Santos Dias.
D. Júlia Soares dos Santos.
D. Constância Teixeira Dias.5
Nota-se que, além dosdois únicos párocos que existiam na ilha, faleceram importantes autoridades, como o comandante militar, de modo que São Nicolau ficou exposta a roubos e a pilhagens.
“Não havia regedor e nem cabos de polícia, bem como inspetores de Campo para evitarem roubos.”6
Tendo em conta esta situação, o Governador-geral da Província de Cabo Verde, “fez marchar para ali um destacamento de tropa de linha.”7 Por outro lado, nomeou “o comandante militar de S. Nicolau, Francisco d´Asis da Gama Lobo d´Eça, que em 14 de Outubro desembarcou na costa oeste da ilha e a percorreu até a Villa da Ribeira Brava, tendo visitado a povoação da Praia Branca, onde a cólera tinha feito grande número de vítimas.”8
Para socorrer a população foi solicitada à“ Comissão de Socorros em S. Vicente a remessa de mantimentos ou que estes se adquirissem, por compra, na Casa Visger Miller & C.ª.”9
Mas o caos instalado na ilha dificultava a assistência, particularmente em géneros alimentícios.
“Á Comissão de Socorros tinha roubado os géneros e foi arrombada a alfândega no porto da Preguiça e a casa da Camara que tinham mantimentos, escapando á pilhagem, na alfândega, cinco barricas com farinha de milho, três de trigo e três saccas de arroz (…).”10
Para São Nicolau foi enviado o Dr. Guilherme Maria Mayer que, “ deu por debelada a epidemia em 15 de Outubro.”11
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Notas
Filho, João Lopes (1996). Ilha de São Nicolau. Cabo Verde. Formação da Sociedade e Mudança Cultural, II volume, 1ª edição, Praia: Secretaria-geral- Ministério da Educação, p. 19.
Vieira, Henrique Lubrano de Santa-Rita (1999). História da Medicina em Cabo Verde, Praia: Ministério da Saúde, p.318.
Boletim Official do Governo-geral de Cabo Verde, nº 203, Anno 1856, 20 de Dezembro,p.942.
Barcellos, Christiano José de Senna (1899). Subsídios para a História de Cabo Verde e Guiné, Parte VI, Lisboa: Academia Real de Ciências, p. 58.
Boletim Official do Governo-geral de Cabo Verde, nº 200, Anno 1856, 14 de Novembro, p.921.
Barcellos, Christiano José de Senna (1899). Op. Cit., p. 57.
Idem, p. 58.
Idem, Ibidem.
Idem, Ibidem.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 978 de 26 de Agosto de 2020.