Compositor, cantor e multi-instrumentista de enorme talento, Norberto não apenas enriqueceu o panorama musical de Cabo Verde, como também usou a música como veículo para transmitir mensagens de transformação social e orgulho identitário.
As raízes e o início da carreira
Desde jovem, Norberto demonstrou uma grande paixão pela música, moldada pelas vivências culturais do interior de Santiago. Em 1975, ao emigrar para Lisboa, deu início à sua carreira como membro do grupo Black Power, com o qual gravou vários álbuns. A sua capacidade artística destacou-se desde cedo, culminando no lançamento do disco Vôlta Pâ Fônti, em 1979, que obteve sucesso imediato em Cabo Verde.
No entanto, foi nos Estados Unidos, para onde emigrou mais tarde, que a sua carreira atingiu outro patamar. Fundou o grupo Tropical Power, uma referência na diáspora cabo-verdiana, particularmente nas décadas de 80 e 90. Com este grupo, Norberto consolidou o seu legado artístico, lançando álbuns que capturaram a essência da cultura cabo-verdiana e conquistaram reconhecimento entre comunidades em diferentes partes do mundo.
Norberto Tavares: um músico e activista
A música de Norberto Tavares vai muito além do entretenimento. As suas composições eram instrumentos de análise crítica e reflexão sobre a sociedade cabo-verdiana, destacando temas como a pobreza, a emigração, a desigualdade social e a busca por justiça. Em cada melodia, em cada verso, transparecia um compromisso inabalável com os valores da justiça, união e dignidade.
Num período marcado pela emigração em massa de cabo-verdianos em busca de melhores condições de vida, Norberto tornou-se a voz da diáspora. Através das suas músicas, ele expressava as emoções de saudade, orgulho e resiliência vividas por aqueles que, mesmo distantes, mantinham um profundo vínculo com a terra natal. Álbuns como Vôlta Pâ Fônti (1979), Hino di Unificaçon (1991) e Maria (1998) simbolizam a sua visão de um Cabo Verde unido, justo e culturalmente vibrante.
A ligação inquebrantável às origens
Apesar do reconhecimento internacional, Norberto Tavares nunca perdeu as suas raízes. Retornava frequentemente a Cabo Verde, onde participava em eventos culturais, promovia iniciativas locais e partilhava a sua visão de um futuro melhor para o país. A sua ligação com a terra natal transcendeu o plano artístico, revelando um compromisso genuíno com o desenvolvimento social e cultural do arquipélago.
A obra manuscrita: uma herança cultural
A importância de Norberto Tavares não se restringe às gravações e apresentações. O livro Norberto Tavares – Músicas de Sperança pa Cabo Verde é uma coletânea de 50 composições manuscritas selecionadas de um acervo mais amplo, preservado pela Fundação Norberto Tavares. Esta obra oferece uma visão íntima do processo criativo do artista, revelando a meticulosidade e o significado por trás de cada letra e melodia.
Organizado em oito secções temáticas — Activista Social, Conselhos, Cultura e Quotidiano, Desabafos, Lamentos, Romance, Visão Apocalíptica, Espiritualidade e Despedida —, o livro é um testemunho da capacidade de Norberto Tavares em transformar a sua experiência pessoal e a realidade do seu povo em arte universal. As suas composições abordam questões profundas e atemporais, oferecendo às gerações futuras uma fonte de inspiração e identidade cultural.
O legado de Norberto Tavares
O impacto de Norberto Tavares transcende a música. Deixou um legado de esperança, determinação e orgulho cabo-verdiano, que continua a inspirar novas gerações a valorizarem as suas raízes e a lutarem por justiça e dignidade. A sua obra é um elo entre o passado e o futuro, um reflexo das lutas e aspirações de Cabo Verde, e uma celebração da identidade cultural do arquipélago.
Ao celebrarmos Norberto Tavares, enaltecemos a essência de Cabo Verde e o poder transformador da música na construção de sociedades mais unidas e conscientes. O seu legado é um verdadeiro tesouro cultural, uma herança que enriquece a alma do povo cabo-verdiano e perpetua valores de união, perseverança e esperança para as gerações vindouras.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1200 de 27 de Novembro de 2024.