Praia ê di nôs tudu

PorAntónio Monteiro,27 abr 2019 9:16

​A capital do país assinala pela primeira vez o Dia da Cidade, 29 de Abril, com feriado municipal. 161 anos depois da elevação à categoria de cidade, Praia é hoje uma cidade que alberga uma população de cerca de 171 mil residentes e mais 30 mil ambulantes. Para marcar a efeméride a CMP vai pôr de pé um conjunto de actividades culturais e desportivas à volta do lema “Praia di nôs tudu”. Como explica Óscar Santos, nesse lapso de tempo a Praia tornou-se uma cidade cosmopolita, onde 40 por cento dos residentes não nasceram aqui. Por isso, “a CMP está a convidar um conjunto de grupos culturais de várias ilhas, de Santo Antão à Brava, para fazerem actuações ao longo da Pedonal de Diogo Gomes. A CMP vai também convidar a comunidade de imigrantes para participar”, anuncia o presidente da CMP. Entretanto, como avança o edil praiense, o ponto alto das celebrações vai ser a inauguração das obras de requalificação que irão dar nova pinta e maior mobilidade à parte histórica da cidade.

O Dia da Cidade da Praia passa a ser feriado municipal. É um feriado igual ao 19 de Maio?

Nós temos o dia em que a Praia faz anos que é 29 de Abril, portanto o dia em que a vila da Praia foi elevada à categoria de cidade. Depois temos também o Dia do Município que é festejado no dia 19 de Maio. Acontece que todos os anos os munícipes questionavam porque é que no dia que a Praia faz anos não há celebração. Então tivemos o cuidado de discutir com pessoas para ver se era possível a mudança da data do Dia do Município. Mas a maioria das pessoas disseram-nos que não era aconselhável e seria mais acertado criar um outro dia (29 de Abril) que seria o Dia da Cidade da Praia. No ano passado levámos uma deliberação à Assembleia Municipal e o 29 de Abril foi aprovado por unanimidade como o Dia da Cidade da Praia. No ano passado fizemos uma Sessão Solene e um conjunto de actividades culturais e desportivas para celebrar os 160 anos da Cidade da Praia. Este ano o 29 de Abril vai ser obviamente feriado municipal. O governo vai declarar a data feriado de Estado, mas só no município da Praia. É que não faz sentido o município instituir um feriado municipal e o Estado não alinhar, pois trata-se da capital do país. Isto significa que o dia em que a Cidade da Praia faz anos não pode ser um feriado de segunda categoria. Tem que ser igual aos outros feriados municipais. Aliás, a lei diz que qualquer município pode ter dois feriados.

Uma parte da cidade que tem grande valor económico e que obviamente é tributada financia a outra parte que é menos desenvolvida para que no decorrer dos anos tenhamos uma cidade com um desenvolvimento muito mais equilibrado

Que actividades estão programadas para assinalar este novo feriado municipal?

Para os 161 anos da Cidade da Praia nós vamos ter uma série de actividades culturais e desportivas à volta do lema “Praia di nôs tudu”. Significa que Praia é uma cidade cosmopolita, porque cerca de 40% das pessoas que residem na Praia não nasceram aqui e por isso que é “Praia di nôs tudu”. A CMP está a convidar um conjunto de grupos culturais de várias ilhas, de Santo Antão à Brava, para fazerem actuações ao longo da Pedonal de Diogo Gomes. A CMP vai também convidar a comunidade de imigrantes para participar. O ponto alto das celebrações é a inauguração das obras de requalificação do Platô que vai ser presidida pelo Sr. Primeiro-ministro. Trata-se de uma reabilitação financiada em parte pelo Fundo do Turismo e pela CMP. Estou a falar das obras de asfaltagem perto do Banco de Cabo Verde, da CMP, da Presidência da República, da Pedonal e Miradouro Diogo Gomes; requalificação da zona do Ténis e dos passeios da rua dos Correios. Portanto, uma boa parte é asfaltagem, mas também requalificação de passeios que irá facilitar a mobilidade das pessoas, para poderem andar ao longo da parte Sul do Platô. Como disse, vamos ter também um acto cultural muito forte que vem na sequência do Kriol Jazz Festival e do Atlantic Music Expo.

Este ano vai haver também momentos de reflexão sobre o caminho que a Cidade da Praia tem trilhado nos últimos 161 anos?

Na Sessão Solene vamos falar um pouco do percurso da Cidade da Praia em termos de obras que já foram realizadas directamente pela Câmara Municipal, de outras obras que foram realizadas em parceria público/privada e também de obras do sector privado que estão a acontecer um pouco por toda a cidade. É que se queremos ter uma cidade aberta e competitiva temos que ter condições para atrair investimentos, sobretudo porque o tipo de turismo que queremos para a Cidade da Praia é um turismo mais de negócio do que o all inclusive. É que não estamos a falar só da Cidade da Praia, mas de toda a ilha de Santiago que tem quase 300 mil habitantes e tem uma diversidade paisagístico-cultural muito rica que tem que ser aproveitada. Iremos também falar um pouco das perspectivas para o futuro da cidade. Nós temos que ter a noção que a cidade está a tomar um caminho sobretudo em termos de aumento da população. Se somarmos os 171 mil residentes, mais os 30 mil ambulantes, a Praia tem cerca de 200 mil habitantes. É muita gente e coloca um conjunto de desafios que têm que ser trabalhados agora, nomeadamente em termos de mobilidade urbana para evitar de daqui a 4 ou 5 anos o trânsito na Cidade da Praia seja um elemento de bloqueio ao seu desenvolvimento e expansão. Esta é uma estratégia importante. Para além disso, temos um conjunto de propostas de empreendimentos do sector privado que a CMP tem que estar pronta, nomeadamente com planos detalhados, para guiar este sector no investimento. Aqui a Câmara tem que actuar como facilitador do investimento privado que é fundamental. Nós temos uma cidade que precisa de muitos investimentos e é só com mais investimento privado que se cria riqueza e emprego para os jovens; com isso, a Câmara aumenta a sua capacidade de tributação, aumenta as suas receitas, para poder financiar a outra parte da cidade, nomeadamente a parte Norte e Sul que ainda sofre de carências várias, em termos de ligação de água domiciliária, esgotos, habitação e também de défice de acessibilidades. É só assim que se financia o desenvolvimento. Ou seja, uma parte da cidade que tem grande valor económico e que obviamente é tributada, financia a outra parte que é menos desenvolvida para que no decorrer dos anos tenhamos uma cidade com um desenvolvimento muito mais equilibrado.

No âmbito das celebrações do Dia da Cidade e do Dia do Município realiza-se o Festival da Gamboa. Quando é que se anuncia o cartaz?

O cartaz já está praticamente fechado e será anunciado ainda esta semana em conferência de imprensa. Já temos confirmado Alpha Blondy, mas há outros nomes que o vereador da Cultura irá divulgar esta semana. Posso dizer que vai ser um Gamboa de nível, porque não queremos defraudar os praienses, até porque já temos um historial de bons festivais. O nosso propósito é manter a fasquia e melhorar. Por isso a CMP vai executar directamente o festival. Tivemos a experiência de tercializar, mas a experiência não foi muito boa. Aliás, as pessoas acham, e muito bem, que quando a Câmara executa uma coisa, o resultado é sempre muito melhor. Porque a lógica da Câmara não é o lucro, mas divertir as pessoas num festival que é de todos. Nós vamos receber praticamente 100 mil pessoas na Cidade da Praia e convém que tenhamos uma boa organização.

O Estatuto Especial é uma coisa à parte, não tem nada a ver com regionalização. Eu acho que o governo deve seguir imediatamente com o agendamento do Estatuto Especial

Com o adiamento da Lei da Regionalização como é que fica o Estatuto Administrativo Especial da Cidade da Praia?

A Lei da Regionalização foi agendada, passou na generalidade e foi cancelada, porque não havia votos suficientes para sua aprovação, o que é muito estranho. Acho que nós perdemos uma boa oportunidade de descentralizar, o que significa que muitos serviços desconcentrados do Estado podiam ser executados directamente pelos governos regionais. Facilitaria muitos processos de tomada de decisão e resolveria a longo prazo o problema das assimetrias regionais. O Estatuto Especial é uma coisa à parte, não tem nada a ver com regionalização. Eu acho que o governo deve seguir imediatamente com o agendamento do Estatuto Especial. Trata-se de uma norma da Constituição da República, há 20 anos que a Cidade da Praia está à espera do Estatuto Especial. Tem a ver com os custos da capitalidade, pois estão instalados aqui o Governo, o Corpo Diplomático e as demais instituições. Isto significa que tudo o que é custo da capitalidade tem que ser partilhado entre o município e o Estado. Daí a lógica do Estatuto Especial e o benefício não é só para a Cidade da Praia. As pessoas têm que perceber isso. Como nós recebemos pessoas de todas as ilhas, por isso é que eu disse “Praia di nôs tudu”, significa que a Cidade da Praia tem de estar em condições de receber os visitantes em condições – pessoas de Santo Antão à Brava que queiram visitar a Cidade da Praia, ou que escolheram a Praia para viverem. Por isso a cidade tem que estar à altura para receber bem não só os nacionais, como também os estrangeiros. Acho que não deve haver demagogia sobre o Estatuto Especial. Nesta questão não vale a pena apontar o dedo a fulano ou sicrano, ou a partido A, B, ou C. É votar ou não votar. Este é o momento mais oportuno para se agendar imediatamente o Estatuto Especial.

As obras do Mercado do Côco arrastam-se há 9 anos sem um fim à vista. Quer marcar mais um prazo para a conclusão das obras?

Temos que atentar no seguinte: o Mercado do Sucupira foi construído há mais de 20 anos e hoje não reúne as mínimas condições de venda. Há 20 anos atrás, pensava-se que colocar as pessoas a vender nos passeios no chão o problema já estava resolvido. Hoje o nível de exigência é outro. Nós queremos criar uma outra centralidade, que é o Mercado do Côco, em que as pessoas têm outras condições sanitárias de venda. Claro que um mercado do tipo tem a sua complexidade. Teve a projecção do seu orçamento, depois nós fomos obrigados a revê-lo por causa do terreno que era um pouco movediço e fomos obrigados a fazer investimentos adicionais em sapatas, em fundação para garantir uma obra de qualidade. Temos que evitar aquilo que aconteceu com a ponte da Boa Vista na qual se gastou milhares de contos e pouco tempo depois a obra colapsou. Temos que evitar essas coisas. Claro que estamos conscientes de que se trata de uma obra difícil. Mas, felizmente, e esta é que é a boa nova, já temos financiamento do governo para a conclusão da obra e o concurso já foi lançado. Significa que o júri tem todo o mês de Maio para fechar o processo, entregar o relatório à Câmara para homologar e fazer a adjudicação da obra. Quer dizer que em meados de Junho a obra deve arrancar e tem um prazo de 14 meses para sua conclusão. (Risos). Algumas pessoas podem não gostar, mas em princípio antes das eleições o Mercado do Côco será concluído e terminará a polémica à volta da obra.

Em meados de Junho a obra [do Mercado do Côco] deve arrancar e tem um prazo de 14 meses para sua conclusão

A Cidade da Praia e Cidade Velha foram declaradas Capitais da Cultura da CPLP para o biénio 2018-2020. Que actividades a CMP tem em carteira para o biénio?

A agenda cultural da Cidade da Praia é muito intensa como toda a gente sabe e nós vamos discutir com o Ministério da Cultura e das Indústrias Criativas um plano de actividades para os próximos dois anos. Obviamente que inclui as actividades culturais que a Câmara Municipal realiza todos os anos e outras actividades que vão ser realizadas em parceria com o Ministério da Cultura. No discurso de boas-vindas aos ministros da Cultura da CPLP ficou o nosso firme compromisso de tudo fazer para honrar a declaração da Praia como Capital da Cultura da CPLP.

Com todas essas actividades culturais a Praia irá certamente perder o último resquício que tem de ruralidade.

A Praia já não é uma urbe rural. Praticamente 99 por cento da Praia é urbana. A parte rural da Praia é ínfima. Agora nós recebemos pessoas de todos os quadrantes, não só do interior de Santiago, mas também de Santo Antão, da Brava, do Fogo, etc. E são os hábitos que essas pessoas trazem que entram em conflito com as boas práticas urbanas. Por isso é que temos o Código de Postura Municipal que as pessoas devem seguir. Por exemplo, quando há um mau ano agrícola há uma tendência natural de as pessoas virem à Cidade da Praia para ganhar o seu pão de cada dia e depois voltar. É essa população ambulante de cerca de 30 mil pessoas que vem diariamente à Praia à procura de trabalho que dá a sensação de ruralidade. A Praia é, de facto, uma cidade urbana. Tem que ser, pois senão não teria a dinâmica cultural e desportiva que tem a ponto de ser considerada a segunda cidade mais “Cool” da África. Se é a mais Cool não pode ser rural. (Risos).

Um projecto anunciado pela CMP e que já na fase de socialização está a gerar polémica é a construção do parque de estacionamento subterrâneo no coração do Platô. Há a crítica que é um desperdício de verbas e que podia ser feito noutro sítio. É seguramente de opinião contrária.

O que estamos a fazer é tudo numa lógica de preparar a cidade para o futuro. Um gestor numa capital tem que ter sempre uma visão de longo prazo. Não pode pensar até amanhã, tem que pensar o que a cidade vai ser daqui a 5, 10, 15 anos. Vejamos, os espaços do Platô têm um valor económico muito alto. Se alguém visitar Macau, Canárias, ou outras cidades do mundo, há-de constatar que aquilo que nós estamos a propor não é novidade alguma, porque já foram feitas noutras paragens. O que acontece é que há um grupo reduzido de pessoas que são contra tudo. Nós tivemos a coragem de lançar a ideia, que, aliás, foi avançada há vários anos pelo arquitecto Pedro Martins. Ele disse-me na altura que uma solução para o estacionamento seria a construção de um túnel que entra na rampa de São Januário e desemboca debaixo da Praça Alexandre Albuquerque com uma cave e subcave. Em 2011 tivemos a ideia da construção de um silo perto do Sucupira em parceria com a EMEL [Empresa Municipal de Mobilidade e Estacionamento de Lisboa]. A abjudicação foi inclusive aprovada pela Assembleia Municipal, mas não chegou a avançar porque entretanto Portugal entrou em crise financeira. Temos também em estudo o célebre projecto Praia Towers para a construção de um silo do lado que dá para a Praia Negra. Estamos a falar em dois projectos em terrenos privados. Como se sabe, discutir com o privado é muito mais difícil, porque o privado tem o seu projecto, tem as suas ideias e tem as suas expectativas de lucro. Portanto, negociar com o privado torna as coisas difíceis porque só a indeminização pode tornar inviável a construção de qualquer parque. A CMP tem várias ideias e a construção do parque de estacionamento subterrâneo do Platô é uma ideia; depois temos outra dos silos perto do Sucupira e da Praia Towers. A CMP tem arquitectos que já estão a analisar essas ideias. Aliás, faz parte do Plano Detalhado da Gamboa esses investimentos. A dificuldade está em convencer um operador privado a entrar em parceria com a Câmara Municipal. Mas tudo é possível. Em qualquer das hipóteses, estamos a ver que cedo ou tarde, nós temos que transformar a parte histórica do Platô em ruas pedonais. Estamos perante uma tendência mundial que a Cidade da Praia tem que seguir. Claro que o parque de estacionamento subterrâneo é um projecto que à partida as pessoas pensam ‘vão-se gastar 200 a 400 mil contos, é desperdício’, mas o custo de se ter uma cidade intransitável é muito maior.

Portanto, o parque de estacionamento subterrâneo é ainda apenas um projecto em socialização.

Em relação ao parque de estacionamento subterrâneo na Praça Alexandre Albuquerque há que dizer que estudo já foi encomendado e já avançamos com essa ideia para as pessoas começarem a dar a sua opinião. Depois vamos avançar com os outros dois projectos dos silos. Suponhamos que os silos tornam-se insuficientes para o número de viaturas. Neste caso já teremos a alternativa na Praça Alexandre Albuquerque, ou então o projecto do Sucupira. O mais importante é ter soluções, o pior é não ter nada. Quando não se faz nada, ninguém diz nada. Quando se apresenta uma ideia há sempre duas ou três pessoas que contestam a ideia, mas não apresentam alternativas credíveis.

O que deseja aos capitalinos para o Dia da Cidade da Praia?

Para a Cidade da Praia é um dia especial, é a primeira vez que assinalamos o 29 de Abril com um feriado, mas durante os finais de Abril e Maio vamos ter várias actividades desportivas e culturais no município da Praia que culminará com o Festival da Gamboa que é ansiosamente aguardado por todos os munícipes. Desejo a todos, sobretudo para o Festival da Gamboa que se divirtam em paz e harmonia e façam menos consumo de bebidas alcoólicas, porque acho que o lema “Menos Álcool, mais Vida” é muito bom.

Texto originalmente publicado na edição impressa do expresso das ilhas nº 908 de 24 de Abril de 2019.

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Autoria:António Monteiro,27 abr 2019 9:16

Editado porrendy santos  em  27 jan 2020 23:21

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