O documento do Banco Central afirma que os desenvolvimentos económicos recentes e as expectativas em torno das políticas macroeconómicas favoreceram uma revisão em ligeira alta do crescimento económico para 2019. As projecções actuais do Banco de Cabo Verde apontam para um crescimento do PIB em volume na ordem dos cinco por cento, devido à dinâmica de investimentos (público e privado) e ao contínuo, e significativo, aumento do consumo público.
O BCV antecipa igualmente um crescimento maior do crédito à economia, uma recuperação do investimento directo estrangeiro e uma forte execução do programa plurianual de investimentos públicos. O crescimento do consumo privado deverá ser superior ao registado em 2018, por causa do impacto positivo no rendimento disponível das famílias da actualização dos salários (na administração pública, sobretudo) e benefícios sociais, da estabilização das remessas dos emigrantes e da contenção da inflação.
As exportações deverão manter o ritmo de crescimento e perspectiva-se um fortalecimento das receitas de viagens (após o abrandamento ocorrido em 2018), assente na procura turística e no aumento de eventos de cariz regional, continental e mundial no país. As projecções apontam também para um crescimento importante das receitas de serviços de transportes, com a gradual consolidação do negócio do hub aéreo do Sal.
Segundo o BCV, o estímulo orçamental ao crescimento deverá ser maior em 2019, com a implementação de medidas para a promoção do financiamento de micro, pequenas e médias empresas (através de linhas de crédito, bonificação de juros, reforço de fundos próprios e capacitação, etc.); o incentivo fiscal à actividade de determinados nichos empresariais (start-up jovem, shipping e micro-finanças), nomeadamente através do desagravamento da taxa de impostos sobre o rendimento; o reforço das infra-estruturas do sector dos transportes, assim como de infra-estruturas urbanas; e o aumento da pensão social, a atribuição de um rendimento social de inclusão e a actualização salarial e das pensões da administração pública. As boas perspectivas de arrecadação de receitas fiscais e de outras receitas, bem como de forte recuperação dos donativos deverão conter o aumento das necessidades de financiamento do Estado, devendo o défice global incluindo donativos atingir os três por cento do PIB.
Já o crédito à economia deverá crescer em torno de cinco por cento, com o aumento dos empréstimos às empresas públicas e privadas, bem como aos particulares.
A taxa média anual da inflação deverá descer dos 1,3 por cento para 0,9 por cento, em 2019, traduzindo assim a evolução prevista dos preços das matérias-primas energéticas e não energéticas nos mercados internacionais. O FMI projecta para 2019 uma redução dos preços das matérias-primas energéticas e não energéticas em 14,1 e 2,7 por cento, respectivamente, que compara aos aumentos de 19,9 e 1,9 por cento registados em 2018.
No entanto, há riscos potenciais no horizonte. Um eventual aumento das tensões comerciais globais poderá afectar negativamente a procura turística e a tendência dos preços no consumidor no país, com impacto no poder de compra das famílias. Uma execução dos orçamentos de funcionamento e investimento do Estado, aquém do perspectivado pelo Ministério das Finanças, terá impacto importante na tendência do consumo final e da formação bruta de capital fixo. E a persistência de condicionalismos administrativos e financeiros poderão também ter um impacto adverso na realização de investimentos no arquipélago.
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Alteração da Lei orgânica do BCV.
Carlos Burgo fala em fragilização da autonomia do Banco Central
O antigo governador do Banco de Cabo Verde não vê com bons olhos as mudanças propostas na Lei orgânica do BCV, e mostrou-o na sua página do Facebook. Num texto publicado esta terça-feira, o economista escreveu que quaisquer modificações serão “uma inequívoca fragilização do balanço e da autonomia do banco central”.
Em causa está a Proposta de Lei em discussão na Assembleia Nacional, que pretende determinar que os Títulos Consolidados de Mobilização Financeira (TCMF) da carteira do BCV, vencidos desde Agosto do ano passado, sejam substituídos “por Títulos do Tesouro, de renda perpétua, sem quaisquer formalidades que não as de mera troca e consequente registo contabilístico”.
“Em 1999/2000”, refere o antigo governador do Banco Central, “o Governo de então, numa reedição do que acontecera em meados dos anos 90, enveredou por uma gestão expansionista das finanças públicas que resultou numa derrapagem financeira e numa crise da tesouraria do Estado. A acomodação monetária dessa política pelo banco central fez perigar a sustentabilidade do regime de paridade fixa da moeda cabo-verdiana com o Euro, tendo sido efectuados no decurso do ano 2000 três saques no âmbito da Facilidade de Crédito do Acordo de Cooperação Cambial com Portugal que não puderam ser reembolsados no final do ano como exigido”.
Continuando a contextualização, Carlos Burgo sublinha que “face a essa situação, entendeu o Governo saído das eleições de 2001 propor à Assembleia Nacional o reforço do quadro de autonomia do banco central através, designadamente, da clarificação da interdição do financiamento ao Estado. Nesse sentido, na nova Lei Orgânica aprovada pela Lei no. 10/VI/2002, a única situação em que o BCV pode aceitar directamente títulos da dívida pública é para a sua capitalização”.
Em jeito de conclusão, Burgo repete o aviso, “a Assembleia Nacional, que aprovou a Lei Orgânica, é soberana para alterá-la. Todavia, não constituirá boa prática legislar contra a Lei Orgânica em vigor, num aspecto tão essencial”, diz.
Texto originalmente publicado na edição impressa do expresso das ilhas nº 908 de 24 de Abril de 2019.