“Este é o ojectivo macro do recenseamento geral da população”, avança Osvaldo Borges ao Expresso das Ilhas. Para o presidente do INE e Coordenador Nacional do RGPH-2021 os resultados deste Censo têm uma importância incomensurável, pois permitem facilitar o diálogo entre as autoridades a nível central e local, assim como entre o Governo e os parceiros de desenvolvimento, sobretudo na formulação, seguimento e avaliação de políticas e estratégias públicas.
O V Recenseamento Nacional começa com um ano de atraso. Qual foi a razão?
De acordo com as orientações nacionais e também com as recomendações internacionais todos os países que fizeram o recenseamento em 2010, deveriam fazê-lo em 2020. Aliás, as recomendações internacionais da comissão de estatística das Nações Unidas diz que nós devemos realizá-lo de 10 em 10 anos. Portanto, desde 2017 que tudo estava preparado para que o Censo aqui em Cabo Verde acontecesse no mês de Junho de 2020. Mas em virtude da pandemia e sobretudo do impacto que ele teve logo no início e também em virtude de um conjunto de restricções que o país tinha na altura, estado de emergência, situação de calamidade, não havia na altura condições para se realizar o Censo. Por isso, juntamente com os parceiros nacionais, sobretudo o governo, mas também com parceiros internacionais discutimos no sentido de adiar o Censo para o ano seguinte. Entretanto, antes do adiamento nós tivemos de ver para a experiência dos outros países. O Brasil, por exemplo, tinha de fazer o Censo em 2020, adiou para um ano depois, assim como muitos outros países para que pudessem ter tempo suficiente para conhecer a evolução da pandemia e reprogramar todas as acções. Foi isso que nós também fizemos e agora vamos realizar de 16 a 30 de Junho o V Recenseamento Geral da População e Habitação (RGPH-21).
Certamente que o INE não podia prever que o Censo iria ser feito num momento que o país vem registando os maiores números de casos de covid-19 desde 2020.
Realmente não era previsível, mas, por outro lado, neste momento há um ganho de experiências e de conhecimento e um conjunto de condições que foram criadas desde o ano passado até este momento. Tendo essa experiência, nós achamos que temos todas as condições para juntamente com o ministério da Saúde realizar o Recenseamento. Para isso tivemos que testar em alguns inquéritos; fizemos um inquérito com cerca de 10 mil pessoas, o qual funcionou normalmente e não tivemos nenhum caso de Covid-19. Fizemos também com empresas e funcionou normalmente. Apoiamos o ministério da Saúde em vários inquéritos: todos os inquéritos de seropositividade foram realizados pelo INE. Houve um ganho de experiência muito grande tanto em relação aos agentes como da parte das famílias, mas também em relação às entidades no que toca à realização do Censo. Por isso, nós consideramos que podemos neste momento realizar o Censo nas condições normais, até porque para cada agregado familiar vai uma única pessoa e já temos tudo previsto para que isto tudo ocorra com normalidade.
O V Recenseamento foi preparado em 3 anos. Quais foram as principais fases desta operação.
Trata-se, de facto, de uma operação complexa porque envolve várias áreas. Só o questionário tem o cruzamento de várias dimensões. Depois há a parte dos custos. Num país arquipelágico como o nosso, a deslocação dos agentes é um bocado complicado. Portanto, a complexidade que é inerente a esta operação faz com que toda ela seja preparada com alguma antecedência. Isto porque desde logo há um conjunto de etapas que têm de ser feitas. Por exemplo, nós temos que fazer a actualização cartográfica, aquilo demora algum tempo. Temos o recenseamento piloto, a formação dos agentes no terreno, recolha de dados no terreno, inquérito pós-censitário, análise e divulgação de dados. Ou seja, é um conjunto de dimensões que têm que ser realizadas com antecedência para que a recolha de dados seja feita com normalidade.
Qual é o objectivo deste V Recenseamento?
O objectivo é recensear e caracterizar toda a população cabo-verdiana e estrangeira que se encontra a viver ou em visita em Cabo Verde num determinado momento que é o momento da recolha dos dados. Permite ainda georreferenciar e caracterizar todos os edifícios, alojamentos e agregados familiares existentes no país. Este é o ojectivo macro do recenseamento geral da população. Basicamente os dados recolhidos têm enorme importância. Desde logo, permite facilitar o diálogo entre as entidades a nível central e local sobretudo neste momento em que nós temos novo governo e novas câmaras municipais eleitas. Com os dados do recenseamento geral da população onde se faz a caracterização de todos os concelhos do país a definição e formulação de políticas será enormemente facilitada. Por outro lado, facilita o diálogo entre o governo e os parceiros de desenvolvimento. Muitos parceiros querem apoiar Cabo Verde, mas querem cada vez mais ter dados actualizados sobre a situação do país para que possam realmente focar naquilo que é importante. Daí que eu diria que os resultados do recenseamento geral da população irão servir para a formulação, seguimento e avaliação de políticas e estratégias públicas, mormente o Plano Estratégico de Desenvolvimento Sustentável (PEDS). Por outro lado, facilita a produção de um conjunto de indicadores que vão responder aos compromissos que nós temos a nível regional e internacional, nomeadamente as Agendas, a Mundial 2030 (Objectivos de Desenvolvimento Sustentável) e a Africana 2063. O Recenseamento tem essa possibilidade de fornecer mais indicadores dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável o que permite dizer que Cabo Verde cumpriu com determinadas percentagens de indicadores a nível nacional, regional e internacional.
Cabo Verde tem um grande défice habitacional. Em que medida esses dados vão servir para a definição e formulação de políticas habitacionais tando a nível local como nacional?
Como todos sabem a habitação é um problema que o país tem e com o Recenseamento Geral iremos fornecer informações actualizadas sobre a situação em todo o país em matéria de habitação. Isto seguramente que irá apoiar as entidades centrais e locais na definição de novas estratégias habitacionais. Nós temos participado na elaboração de vários documentos estratégicos do ministério das Infraestruturas para definição da política de habitação com base nos inquéritos por amostragem. Agora que vamos ter o Recenseamento que é uma operação exaustiva, significa que iremos ter mais informações, mais dados de todo o país para apoiar a formulação desses documentos estratégicos que são muito importantes. Quer dizer que o país passará a dispor de informações mais frescas, mais actualizadas para poder redefinir um conjunto de políticas que foram implementadas anteriormente.
Há alguns anos dizia-se que certos estudos do INE eram para engavetar, pois quando saiam já não tinham validade. Como estão agora as coisas?
Eu penso que a nível do INE temos feito uma política de divulgação muito forte, reforçamos toda a nossa parte de divulgação estatística e o que fazemos hoje é muito diferente daquilo que o INE fazia há dez ou quinze anos. Neste momento temos mais condições em termos de tecnologia, temos colaboradores mais capacitados e ultimamente temos sido até referência no continente africano na parte da divulgação de estatística. Por isso, mesmo havendo essa dificuldade, nós acreditamos que devemos continuar a trabalhar no sentido de reduzir esse problema.
Os recenseamentos gerais são feitos de 10 em 10 anos. Não é um lapso de tempo bastante longo num mundo globalizado onde as coisas acontecem num ritmo cada vez mais acelerado? Em que pressupostos empíricos se baseiam?
Primeiro, porque é uma recomendação das Nações Unidas. Segundo, porque há um conjunto de operações intermédias que decorrem ao longo desse período que permitem actualizar algumas informações. Como eu disse, o Plano Nacional da Habitação foi feito com base em inquéritos anuais que nós realizamos. Isso permite dar outras informações para a formulação de políticas. Nós a nível do INE iremos continuar a trabalhar no sentido de termos operações a meio do percurso. Agora com os dados administrativos sobre nascimentos, óbitos e imigração poderemos actualizar e ter a meio do percurso alguma informação que seja relevante para tomada de decisão. Aliás, isto já está sendo feito em muitos países, ao invés de fazerem até o próprio recenseamento devido aos custos. Portanto, é o procedimento que está sendo seguido, nós neste momento temos como meta fazê-lo num período de cinco anos.
A população cabo-verdiana já está a dar sinais de envelhecimento?
Neste momento está a envelhecer. Há vários trabalhos que estamos a fazer que apontam nesta direcção. Mas esta pergunta será melhor respondida tanto a nível nacional como de cada concelho quando tivermos os dados do senso.
Quando serão divulgados os dados definitivos do V Recenseamento?
Os dados definitivos serão divulgados em 2022, mas antes desta data nós teremos dados provisórios que serão apresentados, no sentido de mostrar qual a situação global. Pretendemos publicar 24 volumes estatísticos com quadros brutos e 16 volumes de análise sobre temas variados.
Este novo governo e as câmaras municipais irão partir de uma posição privilegiada por irem dispor de dados frescos e actualizados em diversos sectores?
Eu penso que todo o país. O governo, as câmaras municipais, os investigadores e toda a sociedade irão ter acesso a novas informações e isso seguramente irá facilitar a definição e formulação de novas políticas nos diversos sectores.
A pouco menos de um mês do início do Recenseamento que apelo faz à população?
Apelamos a toda a população que participe no recenseamento geral e que juntamente com o INE tente sensibilizar os familiares e vizinhos a colaborarem com o Censo, pois é uma operação que traz vantagens a todos, mas só terá sucesso se houver a participação de todos.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1017 de 26 de Maio de 2021.