Auditor Renato Fernandes renuncia ao cargo na CMP alegando falta de acção contra irregularidades

PorSheilla Ribeiro,3 fev 2024 5:10

O auditor Renato Fernandes, que ocupava o cargo de director do gabinete de Auditoria Interna (GAI) na Câmara Municipal da Praia (CMP), formalizou a sua demissão numa carta enviada ao edil Francisco Carvalho na qual expõe a falta de acções efectivas contra irregularidades e corrupção.

Na carta endereçada ao presidente da CMP, à qual o Expresso das Ilhas teve acesso, Renato Fernandes inicia relembrando o convite recebido em Novembro de 2021 para assumir o cargo de director do GAI, aceitando o desafio motivado pela crença de contribuir para a melhoria da gestão da CMP. Contudo, destaca que, após a sua chegada em Maio de 2022, as suas propostas para aprimorar a transparência e eficiência não foram implementadas.

Entre as iniciativas apresentadas pelo auditor, destaca-se a criação de um modelo de tratamento de dados no Power BI para controlo de gestão em tempo real, elaboração de planos de actividades para 2023 e proposta de um manual de procedimentos para a Unidade de Gestão das Aquisições Públicas (UGA).

No entanto, Renato Fernandes revela que, até à presente data, nenhuma das propostas foi adoptada. O auditor alega que a falta de medidas estruturantes para combater a corrupção e promover a eficiência, transparência e controlo de gestão levou à sua decisão de renunciar ao cargo.

Na sua carta de demissão, Fernandes detalhou supostas irregularidades relacionadas ao processo de Empréstimo Obrigacionista conduzido pela Secretária Municipal. O auditor refere à ausência de intervenções da Direcção Financeira e do Gabinete Jurídico da CMP no projecto elaborado pelo Instituto Nacional de Previdência Social, ressaltando que os interesses do INPS estão protegidos em detrimento dos da CMP.

Além disso, Fernandes revela que os órgãos municipais e a Bolsa de Valores de Cabo Verde foram enganados por informações falsas e discrepâncias nos documentos apresentados. Também alega que as informações sobre amortização trimestral de capital, receitas correntes para 2023 e indicadores de capacidade de endividamento foram manipuladas.

“A CMP está tecnicamente falida, apresentando uma dívida não financeira, no valor de aproximadamente 900.000.000 ECV, sem contar com o montante pertencente ao Clube de Ténis na posse da CMP. São notórias a pressão de cobrança dos fornecedores sobre a Direção Financeira e a dificuldade mensal que a CMP enfrenta para o pagamento de salários”, escreveu.

Contratação Pública, gestão e terrenos

O auditor apontou também para a simulação de concursos públicos, cancelamentos seguidos de ajustes directos com empresas pré-determinadas e a criação de esquemas envolvendo diferentes sectores da CMP, com “o intuito de favorecer determinadas empresas ou fornecedores”.

Além disso, Fernandes delatou casos de adjudicação de obras directamente a empresas, sem procedimentos transparentes, resultando em acordos envolvendo terrenos ou compensações para as empresas contratadas.

Renato Fernandes denunciou também diversas questões, incluindo contratos com contornos “pouco claros, excesso de zelo para pagamento de facturas de fornecedores em situações duvidosas”, e denúncias da directora financeira, documentadas, sobre actos ilegais e contrários ao interesse público realizados pela Secretária Municipal.

O auditor expôs ainda a falta de um manual de procedimentos para a elaboração do plano de actividades e do orçamento da CMP, resultando em desalinhamento entre documentos orçamentários.

Renato Fernandes fez também denúncias relacionadas à cedência de terrenos e protocolos de parcerias na CMP. As acusações destacam práticas que considera pouco transparentes, prejuízos ao património do município e possíveis violações éticas e legais.

Fernandes criticou a postura dos actuais decisores da CMP, que, segundo diz, classificam a gestão da equipa anterior como corrupta, enquanto, ao mesmo tempo, insinuam que os funcionários de base são corruptos.

“Sabe-se perfeitamente que os actuais decisores são os responsáveis pelo ambiente de corrupção reinante neste momento na CMP e co-responsáveis pela situação de falência técnica em que a mesma se encontra”, afirmou.

Também argumentou que, apesar de reconhecer a participação de empresas e indivíduos em processos de contratação pouco claros, a autarquia criou condições propícias para a prática de corrupção.

O auditor frisou a desorganização da CMP, descrevendo-a como imersa num ambiente de corrupção e enfrentando sérios problemas financeiros e apontou a gestão administrativa, financeira e patrimonial da CMP como direccionada aos interesses de um grupo específico de decisores e operadores económicos.

“Diante desta realidade gestionária, comunicamos a Vossa Excelência que não estamos disponíveis para continuar a colaborar com a CMP no gabinete de auditoria interna”, declarou Fernandes, solicitando o término da requisição a partir de 31 de Dezembro de 2023.

A saída de Renato Fernandes já tinha sido abordada pelos vereadores do Movimento para a Democracia (MpD) na Câmara Municipal da Praia que, mediante um comunicado, acusaram o edil praiense, Francisco Carvalho, de sonegação de informações.

Abordado pela Inforpress, Francisco Carvalho confirmou que Renato Fernandes pediu para sair, mas aconselhou os vereadores a contactar o próprio auditor para esclarecer as motivações da sua saída.

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1157 de 31 de Janeiro de 2024. 

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Autoria:Sheilla Ribeiro,3 fev 2024 5:10

Editado porAntónio Monteiro  em  30 abr 2024 23:28

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