Instituído em 2015, o Tribunal Constitucional foi um sonho muitas vezes adiado de toda a comunidade judicial cabo-verdiana.
“Em 1992 a Constituição aprovada nesse mesmo ano acolheu o modelo jurisdicional de fiscalização da constitucionalidade. Contudo, como a criação do Tribunal Constitucional de Cabo Verde só ocorreu com a Lei Constitucional de Revisão nº 1 de 1999, durante esse interregno a jurisdição constitucional foi atribuída ao Supremo Tribunal de Justiça. Mesmo depois de 1999 e até 2015, a legislação do Tribunal Constitucional Autónomo, o Supremo Tribunal de Justiça, em função de uma norma transitória, acumulou funções de Tribunal Constitucional”, recordou José Pina Delgado, Juiz Conselheiro Presidente do Tribunal Constitucional, na intervenção que fez no Fórum Internacional de Justiça que decorre até hoje na Praia.
Os primeiros Juízes efectivos e substitutos tomariam posse a 14 de Maio de 2015 sendo eleito, a 28 de Setembro, o primeiro Presidente do Tribunal Constitucional, “o Venerando Juiz Conselheiro Pinto Semedo”.
O órgão máximo da Justiça cabo-verdiana entraria em funções a 18 de Outubro desse ano após a publicação no Boletim Oficial da declaração solene de instalação no Tribunal Constitucional.
Evolução
“Do ponto de vista quantitativo, desde a sua instalação até ao passado dia 11 de Outubro, o Tribunal Constitucional resolveu um total de 362 processos dos 468 entrados e proferiu 609 decisões. O que não deixa de ser representativo, considerando o número de juízes que dispõe, 3 juízes efectivos e 2 substitutos. Assim sendo, pelo menos a ideia de um Tribunal com meia dúzia de decisões anuais e em períodos eleitorais terá ficado ultrapassada pelos factos”, destacou Pina Delgado.
“Os primeiros anos de funcionamento do Tribunal Constitucional 2015-2018 foram anos de fixação de orientações metodológicas, hermenêuticas, processuais e substantivas em relação a um conjunto de questões centrais e que foram acompanhadas a nossa actuação até ao presente”, recorda Pina Delgado.
As liberdades de expressão, de informação e de imprensa, a de associação política, o direito à privacidade, como os relacionados com a protecção de dados pessoais, a inviolabilidade de correspondência, de comunicações e de domicílio ou a liberdade de constituição de família e a liberdade de se contrair casamento foram áreas em que o Tribunal Constitucional emitiu pronunciamentos ao longo destes nove anos de actividade.
Além de todo este trabalho, Pina Delgado destaca que o Tribunal Constitucional teve de se confrontar com “desafios imprevistos por força do crescente aumento do número de entrada de processos”. O número de processos entrados em 2016 comparado com os de 2023 corresponde a um aumento 160%.
“O Tribunal Constitucional, todavia, não vê a colocação de recursos constitucionais de modo negativo. Muito pelo contrário, preza-os como forma de conferir a tutela quando existirem, efectivamente violações de direitos, liberdades e garantias ou quando se apliquem normas desconformes à lei fundamental”, acrescenta.
Aumento do número de juízes
Questionado pelo Expresso das Ilhas, à margem do Fórum, sobre se há a necessidade de aumentar o número de juízes no Tribunal Constitucional, Pina Delgado defendeu que “a questão de fundo não é propriamente uma questão de alargamento da composição neste momento. A questão que me parece mais crucial é a necessidade de se manter a qualidade em termos de conhecimento jurídico, em termos de capacidade de trabalho e em termos de independência daqueles que exercerem funções no Tribunal Constitucional”.
O Tribunal Constitucional recebe uma média de entradas de cerca de 70 processos ao ano.
“Creio que com a actual composição do Tribunal Constitucional, com o número de três, nós conseguimos dar resposta a este volume processual e a questão, portanto, como eu disse, é de se tentar fazer tudo para manter a qualidade daqueles que integram o Tribunal Constitucional, mais do que se pensar num alargamento da sua composição”, acrescentou.
Quanto ao perfil dos futuros juízes daquele tribunal, Pina Delgado explicou que “deve ser um perfil comum, pessoas com notório saber jurídico, com capacidade de trabalho e pessoas independentes. As origens podem ser as mais diversas e a preocupação que deve presidir a escolha do colectivo é uma preocupação de integração e de complementaridade”, concluiu.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1194 de 16 de Outubro de 2024.