Parque Eólico de Santiago ganha nova vida e impulsiona metas renováveis do país

PorAndré Amaral,6 dez 2025 9:20

A Cabeólica e o Governo de Cabo Verde assinalaram, a 27 de Novembro, no Parque Eólico de Monte São Filipe, na cidade da Praia, a cerimónia oficial de inauguração do Novo Projecto de Expansão do Parque Eólico de Santiago.

O momento marcou não apenas a entrada em operação das novas infraestruturas na maior ilha do país, mas também o arranque formal de um ciclo de investimentos que se estende às ilhas de São Vicente, Sal e Boa Vista, representando um dos maiores projectos energéticos realizados em Cabo Verde nesta década.

O investimento total, que ronda os 40 milhões de euros, foi concebido para reforçar de forma estrutural a capacidade de produção de energia renovável e a estabilidade do sistema eléctrico nacional. A dimensão e complexidade do projecto exigiram um modelo de financiamento articulado: inicialmente suportado através de um financiamento intercalar assegurado pelo accionista maioritário, a Africa Finance Corporation, e posteriormente garantido por um financiamento de longo prazo concedido pelo Banco Europeu de Investimento e pelo Banco Africano de Desenvolvimento. Esta combinação permitiu acelerar o ritmo dos trabalhos e assegurar liquidez imediata para a execução, garantindo que a expansão pudesse avançar antes da conclusão das tradicionais etapas de financiamento. Como resultado, o projecto foi concluído dentro do orçamento e antes dos prazos previstos, tendo o primeiro kWh sido produzido em Santiago em Outubro de 2025, apenas um ano após a assinatura dos contratos.

Maior resiliência

O primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, destacou que a expansão do Parque Eólico de Santiago representa um investimento estruturante de 40 milhões de euros, responsável por aumentar de forma significativa a capacidade eólica instalada na ilha, que passou de 9,5 para 23 megawatts. Este reforço permitirá duplicar a contribuição das energias renováveis no consumo eléctrico de Santiago, ultrapassando os 30%. Ulisses Correia e Silva sublinhou ainda que o projecto introduziu novas turbinas de última geração e a primeira bateria de armazenamento na ilha, assegurando maior estabilidade, eficiência e resiliência da rede nacional.

O chefe do Governo afirmou que este investimento permitirá poupar quase um milhão de contos por ano na importação de combustíveis fósseis e criará condições para diminuir a factura energética das famílias e empresas, dado que a electricidade produzida a partir do vento é muito mais barata do que a produzida com combustíveis fósseis. O projecto contribui ainda para a acção climática, reduzindo mais de 50 mil toneladas de emissões de carbono por ano.

Ulisses Correia e Silva enquadrou esta expansão no Plano Director do Sector Eléctrico 2018/2040, que estabelece metas ambiciosas de penetração renovável - mais de 30% até 2026, mais de 50% até 2030 e mais de 80% até 2040 - e define acções estruturantes como novas baterias, parques solares, modernização tecnológica e projectos de armazenamento hídrico. O primeiro-ministro reforçou também o compromisso com a formação profissional no sector e a criação de empregos qualificados, destacando o papel do CERMI nessa estratégia.

Apesar dos períodos recentes de instabilidade no fornecimento eléctrico, sobretudo na Praia, o primeiro-ministro assegurou que a situação foi estabilizada, mas lembrou que a modernização e resiliência do sistema continuam a ser prioridades centrais.

Take or pay

Ayotunde Anjorin, PCA da Cabeólica, em entrevista ao Expresso das Ilhas, lembrou que quando se fez o primeiro investimento no sector da energia eólica em Cabo Verde, o país tornou-se a primeira nação africana a produzir energia eléctrica desta forma.

“Naquela época, fomos capazes de fazer 25,5 megawatts de energia, mas desde então, estamos a tentar ver se há outras oportunidades para a Cabeólica, em Cabo Verde”, referiu.

A oportunidade surgiu agora com o projecto de expansão que ajuda, igualmente, a atingir a taxa de penetração de 50% de energias renováveis até 2050.

Questionado sobre se o modelo de contrato entre o Estado e a Cabeólica se vai manter na modalidade de Take or Pay, Ayotunde Anjorin não fecha a porta à possibilidade de revisão.

“Há sempre oportunidades de revisão, mas acredito que o que temos actualmente funciona para o governo e os investidores. Não podemos esquecer que estamos tentando catalisar e mobilizar investimentos estrangeiros no país”, apontou.

Quanto a novos projectos, Ayotunde Anjorin disse que “há um novo projecto em discussão”, mas que como ainda está numa fase inicial não quis revelar detalhes.

Mais captura de energia

A cerimónia contou com responsáveis governamentais, técnicos do sector energético, parceiros internacionais e comunidades locais, que testemunharam a entrada em operação das novas turbinas Vestas V150 de 4,5 MW — equipamentos considerados entre os mais modernos e eficientes do mundo no segmento eólico. Estes aerogeradores, significativamente mais altos e com pás de grande envergadura, permitem aumentar a captura de energia mesmo em condições de vento variável, o que se traduz num salto qualitativo para a matriz energética cabo-verdiana. Com a instalação destas turbinas, a potência eólica instalada no arquipélago ascende agora a cerca de 40 MW. Quando a expansão nas restantes ilhas estiver concluída, no início de 2026, a produção anual da Cabeólica poderá ultrapassar os 150 GWh, reforçando de forma determinante o peso das energias limpas no sistema eléctrico do país.

Segundo dados disponibilizados durante a inauguração, só as turbinas agora instaladas em Santiago poderão adicionar até 60 GWh de produção anual ao sistema nacional. Esta energia, disponibilizada a partir de uma fonte renovável, contribuirá para reduzir significativamente a dependência de combustíveis fósseis, historicamente um dos maiores desafios de Cabo Verde devido à sua condição insular e à necessidade de importação total desses recursos. A expansão representa, portanto, uma medida concreta de soberania energética, com impacto directo na economia e na sustentabilidade ambiental.

Outro eixo central destacado durante a cerimónia foi o reforço da estabilidade e resiliência da rede eléctrica nacional. A expansão inclui a instalação de sistemas avançados de armazenamento de energia em baterias (BESS), sendo que, em Santiago, entrou em funcionamento um sistema com cerca de 6 MW/6 MWh de capacidade. Quando integrados os sistemas das demais ilhas, a capacidade total instalada atingirá os 26 MW/26 MWh. Estes sistemas são fundamentais para mitigar as flutuações típicas das energias renováveis, permitir uma gestão mais eficiente da produção e facilitar a integração simultânea de fontes eólicas e solares, abrindo espaço para um grau de penetração renovável sem precedentes no país.

Além de melhorar a qualidade e regularidade do fornecimento eléctrico, estes sistemas permitirão também aumentar a segurança do abastecimento, reduzindo a frequência de interrupções e o recurso à produção térmica de emergência. A modernização tecnológica introduzida por esta componente de armazenamento coloca Cabo Verde entre os países africanos com soluções mais avançadas de gestão de redes eléctricas baseadas em energias renováveis.

Do ponto de vista ambiental, os ganhos apresentados são expressivos. A expansão deverá permitir a redução anual de cerca de 50 mil toneladas de emissões de CO2, contribuindo para os compromissos internacionais assumidos por Cabo Verde no âmbito da acção climática e para o cumprimento dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável, nomeadamente os que se referem à energia limpa, à inovação e às medidas de combate às alterações climáticas. Durante a inauguração, foi sublinhado que a expansão foi planeada de forma a minimizar o impacto ambiental, recorrendo ao aproveitamento de infraestruturas já existentes e implementando medidas de mitigação adequadas, incluindo monitorização ambiental contínua.

Os benefícios económicos foram amplamente destacados, sobretudo num país onde a factura energética representa uma parcela significativa do custo de vida e da estrutura de custos das empresas. Com a nova capacidade instalada, a Cabeólica estima que será possível evitar a importação de mais de 30 mil toneladas de combustíveis fósseis por ano, um valor equivalente a cerca de 3 milhões de contos. Esta poupança resulta não apenas da substituição directa da produção térmica, mas também da maior eficiência operacional permitida pelos sistemas de armazenamento e pela complementaridade com a energia solar fotovoltaica, cuja integração será agora facilitada. A energia produzida a partir do vento e do sol tem um custo muito inferior ao da geração térmica, o que representa um potencial efeito positivo sobre a estabilidade tarifária a médio e longo prazo.

A inauguração foi igualmente um momento simbólico para reafirmar o papel pioneiro da Cabeólica no sector das energias renováveis em Cabo Verde. Desde a sua criação, a empresa tem sido uma referência na produção de energia eólica nas ilhas de Santiago, São Vicente, Sal e Boa Vista, contribuindo de forma estruturante para a transição energética do país. Com a expansão agora inaugurada e com os trabalhos em curso nas restantes ilhas, a empresa reforça o seu posicionamento como actor essencial num modelo energético mais sustentável, resiliente e alinhado com os desafios globais.

O projecto contribui directamente para as metas definidas pelo Governo de alcançar mais de 30% de penetração de energias renováveis até 2026 e 50% até 2030. Os responsáveis presentes na cerimónia destacaram que estas metas, antes vistas como ambiciosas, tornam-se agora mais tangíveis graças ao reforço da infraestrutura e à integração tecnológica que está a ser implementada. A expansão do Parque Eólico de Santiago, agora oficialmente inaugurada, é, por isso, mais do que um avanço técnico: é um passo estratégico para transformar o futuro energético de Cabo Verde e consolidar o país como um exemplo de transição energética em pequenas nações insulares.

Energia mais barata?

A presidente do conselho de administração da ARME, Leonilde Santos, questionada pelo Expresso das Ilhas afirmou que a aposta que Cabo Verde está a fazer nas energias renováveis tem um impacto directo e positivo na estabilidade e na evolução da tarifa de electricidade. Questionada sobre se esta expansão das renováveis resultará em electricidade mais barata para o consumidor, a responsável começou por contextualizar que a introdução crescente de energia limpa no sistema nacional reduz, antes de mais, a dependência do país dos combustíveis fósseis.

Segundo explicou, Cabo Verde importa praticamente toda a energia produzida a partir de combustíveis fósseis, o que torna o preço final da electricidade altamente sensível às flutuações internacionais, tanto do custo do petróleo como da variação cambial, especialmente do dólar. Com a maior injecção de energias renováveis na rede, esses factores externos tornam-se menos determinantes e o país ganha maior estabilidade e previsibilidade nos custos de produção. Essa estabilidade reflecte-se de forma positiva na tarifa, que já registou reduções precisamente devido à contribuição das renováveis.

Leonilde Santos sublinhou, porém, que a diminuição da tarifa não é automaticamente proporcional ao volume de energia renovável injectada na rede. A definição da tarifa depende de vários critérios regulatórios, de investimentos realizados no sector e de outros elementos estruturais que precisam de ser considerados no cálculo final. A PCA da ARME lembrou que a tarifa segue ciclos de actualização, como aconteceu durante o período da pandemia da Covid-19, quando foi necessário proceder a reajustes.

Ainda assim, reforçou que o efeito das energias renováveis é inequivocamente positivo, tanto na estabilidade do preço como na sustentabilidade do sistema. Para além dos benefícios ambientais, sublinhou que a previsibilidade trazida pelas renováveis permite reduzir riscos, melhorar o planeamento e criar condições mais favoráveis para a redução tarifária. Concluiu afirmando que, embora seja necessário ter em conta todas as variáveis que influenciam o preço final da electricidade, já houve reduções mensuráveis directamente associadas à maior presença de energia renovável na rede nacional.

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Quatro perguntas ao Ministro da Indústria Comércio e Energia

Qual o preço do KW/h produzido pela energia fotovoltaica?

Varia entre 4,99 ECV/kWh no Sal e 5,99 ECV/kWh em Ribeira Grande Santiago

Qual o preço do KW/h produzido pela energia eólica?

Valor medio do parque antigo à volta dos 15,7 ECV/kWh. Agora o custo com o novo projeto expansão 7,5 ECV/kWh

Qual o preço da energia produzida através de Fuel?

Cerca de 17 ECV/kWh apenas de custo evitado de consumo de combustível ao qual deve ser acrescido os custos fixos de investimento e manutenção das centrais térmicas estimativa grosseira de mais cerca de 8 ECV/kWh, totalizando cerca de 25 ECV/Kwh.

Qual o preço da energia produzida a Gasóleo?

Cerca de 28 ECV/kWh apenas de custo evitado de consumo de combustível ao qual deve ser acrescido os custos fixos de investimento e manutenção das centrais térmicas estimativa grosseira de mais cerca de 6 ECV/kWh, totalizando cerca de 34 ECV/Kwh.

Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1253 de 03 de Dezembro de 2025.

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Autoria:André Amaral,6 dez 2025 9:20

Editado porJorge Montezinho  em  6 dez 2025 15:19

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