A Câmara de Comércio de Sotavento não está a assumir uma posição demasiado extrema?
A posição da CCS é uma reacção à forma como temos vindo a ser tratados e é também uma forma de mostrar o nosso descontentamento pela maneira como o Centro Comum de Vistos tem estado a tratar os empresários cabo-verdianos que querem, de uma forma ou de outra, deslocar-se a Portugal.
Pelo que percebi na carta enviada à embaixadora de Portugal, esta situação de bloqueio não é nova.
Claro que não é nova. Nós já tínhamos chegado a um entendimento, aliás, com a intervenção directa da senhora embaixadora, que teve a amabilidade de discutir connosco essa questão. Mas parece que tudo voltou ao normal. Nós temos o mínimo de rigor na selecção das pessoas e depois chegam ao Centro Comum de Vistos e eles aprovam quem querem e reprovam quem querem e não sabemos porquê. Mas os empresários, também individualmente, passam um calvário no CCV para terem um visto, seja de que tipo for, para se deslocarem a Portugal. Já começa a ser um exagero.
O que tinha ficado acordado na reunião de Janeiro do ano passado?
Ficou acordado que o Centro Comum de Vistos tem sempre de fazer o seu trabalho, não é isso que estamos a questionar, mas ficou acordado também que uma primeira selecção devia ser feita pela Câmara de Comércio de Sotavento. Passámos a ser mais rigorosos, por exemplo, não aceitamos empresas que não tenham um mínimo de seis meses como sócios da Câmara do Comércio, já para evitar que pessoas usem as missões só para terem o visto fazendo-se sócios à última da hora. E temos estado a fazer esse papel, mas não entendemos quais são os critérios, não há uma justificação, dão uma explicação que ninguém entende e pronto. Depois da reunião as coisas melhoraram bastante, mas depois com o tempo parece que se esqueceu o que tínhamos acordado e voltou tudo ao mesmo.
Que justificações são dadas para recusar os vistos?
Dizem que são questões que têm a ver com Lisboa. Eles limitam-se a recusar e pronto.
O acordo de mobilidade, assinado entre Cabo Verde e a União Europeia, diz que os empresários é uma das categorias profissionais que beneficia da facilitação de vistos. Nem a lei consegue desbloquear esta situação?
No Centro Comum de Vistos fazem como entendem. Já discutimos essa questão ao nível da CPLP, ao nível da confederação empresarial, já fizemos propostas que pensamos que são aceitáveis para essa questão da mobilidade. Temos de entender uma coisa: a CPLP não existe se não houver a mobilidade, mas parece que isto ultrapassa as posições institucionais, ultrapassa as declarações dos responsáveis políticos porque alguém bloqueia tudo e acabou.
Tentaram voltar a falar com a responsável do CCV?
Não, já chega.
Tiveram alguma reacção da embaixada de Portugal ou do AICEP?
Ainda não.
Ou seja, a situação actual mantém-se, as missões continuam suspensas e os associados são aconselhados a procurarem outros parceiros comerciais?
A nível da Câmara de Comércio de Sotavento a posição é essa mesma. Não vamos organizar mais nenhuma missão empresarial a Portugal enquanto essa situação continuar dessa forma. A situação está a tornar-se insuportável.
Como vê o curto/médio prazo das relações empresariais entre Cabo Verde e Portugal?
Esta relação tem de melhorar. Porque a relação entre Cabo Verde e Portugal não pode ser posta em causa porque alguém decide não fazer as coisas como devia fazer. Estamos convencidos que a relação só pode melhorar e que vai melhorar. Estamos a dar um grito de alerta. Temos estado a reclamar e ninguém reage, as coisas continuam na mesma. Esta nossa posição é um pouco extrema? É. Mas é mais um grito de alerta para que as coisas funcionem como deve ser. Já não é possível continuar assim.
A livre circulação deve ter sido o tópico mais debatido na última Cimeira do Sal. Actualmente quem preside à CPLP é Cabo Verde, tentaram contactar o Presidente da República?
Sobre este assunto não. Na reunião do Sal ficámos de entregar duas propostas sobre a mobilidade. Entregámos uma proposta para os PALOP, onde propomos uma liberdade de circulação incondicional, e entregámos uma proposta para a CPLP, propondo uma liberdade condicionada tendo em conta as reticências de alguns países. Até agora não tivemos qualquer reacção.
Texto originalmente publicado na edição impressa do expresso das ilhas nº 906 de 10 de Abril de 2019.