Santo Antão não ganhou com o novo serviço de transporte marítimo inter-ilhas

PorAntónio Monteiro,31 ago 2019 6:33

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O serviço de transporte marítimo inter-ilhas que entrou em operação no dia 15 de Agosto é um grande objectivo conseguido por este governo, mas Santo Antão foi penalizado com o novo serviço. Quem o diz é o presidente da Câmara Municipal do Porto Novo.

Aníbal Fonseca queixa-se de longas horas de espera para a emissão de bilhetes para a rota São Vicente/Porto Novo e a retirada de dois navios desta mesma rota que passa agora a contar com uma única embarcação. “A nível da emissão dos bilhetes celeridade é o que se quer e o aumento de pelo menos mais uma embarcação na linha São Vicente/Porto Novo”, requer o edil portonovense. Nesta entrevista realizada nas vésperas do Dia do Município que se assinala no próximo dia 2 de Setembro, Aníbal Fonseca fala da melhoria dos indicadores no concelho do Porto Novo relativos ao desemprego, habitação, acesso à água, saúde, energia e educação.

Para começar. As chuvas estão atrasadas e o mês de Agosto já vai no fim. Que expectativas para o novo ano agrícola?

De facto, a estação dazáguas está atrasada e como sabe, estamos a finalizar um ciclo de dois anos de seca terrível aqui ni município do Porto Novo. Este fim-de-semana caiu entretanto alguma chuva mansa e muito bendita. Em média temos uma precipitação à volta de 35mm. São dados provisórios fornecidos na segunda-feira pelo ministério da Agricultura. Já traz algum alento, mas ainda não garante nada em termos de condições para sementeira. Portanto, vamos esperar que nos próximos dias tenhamos mais chuvas, aí a coisa muda de figura. Mas no momento actual ainda precisamos de mais chuva para que os homens do campo e também da cidade possam começar a sementeira. Entretanto gostaria de acrescentar que no Porto Novo não se trata apenas da agricultura de sequeiro. Temos um número elevado de pessoas que se dedicam à criação de animais, essencialmente caprinos, que passaram por muitas dificuldades nestes dois anos e que foram socorridos pelo Estado através dos programas de mitigação da seca. Tiveram que vender bom número de cabeças de gado e neste momento estão também a aguardar. Portanto, a chuva será muito bem-vinda para os criadores de animais particularmente para os criadores da cintura da cidade, onde chove menos e onde temos o maior efectivo de caprinos. Como disse, já há um primeiro sinal, a chuva caiu mansinha nas zonas altas e nos vales e estamos à espera de mais chuvas.

O Dia do Município do Porto Novo passa normalmente despercebido, já que as actividades são geralmente concentradas nas festas do santo padroeiro, no mês de Junho. Como vai ser assinalada a efeméride este ano?

Porto Novo foi elevado à categoria de concelho a 2 de Setembro de 1962, mas os porto-novenses tradicionalmente comemoram a efeméride no dia 24 de Junho, diade São João Baptista, o santo padroeiro que nos identifica e que faz unir todos os portonovenses. Mesmo a partir de 1992 quando o Dia do Município passou a ser comemorado a 2 de Setembro, continuou-se a concentrar as actividades no dia 24 de Junho. Daí que no dia 2 de Setembro, que é o dia oficial da criação do município do Porto Novo e da elevação da então vila do Porto Novo à categoria de cidade, comemora-se o evento com uma sessão solene da Assembleia Municipal, fazemos algumas actividades desportivas, recreativas, culturais, políticas e sociais para assinalar o dia e também para reflectirmos sobre o nosso município, de tal modo que há tempos lançamos um debate sobre esta questão. É que se a população do Porto Novo e todos os munícipes se identificam com o seu santo padroeiro São João Baptista, porque não reflectirmos sobre a possibilidade de termos como dia do município o dia 24 de Junho que é considerado por todos os portonovenses como o dia do município.

Assim os portonovenses perderiam um feriado.

Não seria bem perder um feriado. Seria termos o 2 de Setembro como dia de referência e termos o 24 de Junho como Dia do Município. Esta proposta teria naturalmente que passar pela Assembleia Municipal que tem competência para se pronunciar sobre o assunto, pois todos reconhecem que o dia do Porto Novo é o dia 24 de Junho.

Há dois anos disse a este semanário que 90 por cento das habitações em todo o concelho estavam em fase de degradação. A situação melhorou de então para cá? E qual é actualmente o maior problema do município?

O maior problema do Porto Povo prende-se com a questão da criação de actividades económicas para gerar empregos e rendimentos para as pessoas para que possam ter a sua vida de forma autónoma. E a habitação é um problema que deriva do facto de termos um município em que os níveis de rendimento das pessoas são fracos. Daí que foram construindo as suas casinhas, mas sem muitas condições. Confirmamos que temos elevada taxa de habitações em péssimas condições, mas efectivamente a partir do momento em que assumimos a Câmara Municipal inscrevemos no nosso programa um ponto que diz claramente que devemos reabilitar por ano duzentas habitações. No início assumimos esse compromisso e foi cumprido. Efectivamente nos dois primeiros anos, em 2017 e em 2018, conseguimos ajudar a melhorar as condições de habitação em 550 casas. Algumas foram reabilitadas de raiz e outras foram melhoradas. Isto, um bocado com recursos da Câmara Municipal, no âmbito do nosso programa para habitação social “Jedá konpô bô kasa”. Como sabe, com o governo de Cabo Verde temos uma boa parceria no âmbito do PRRA [Programa de Reabilitação, Requalificação e Acessibilidades] e definimos entre 2019 e 2020 reabilitar no mínimo 210 habitações. No âmbito do PRRA já reabilitamos cerca de 70 casas e neste momento estamos a reabilitar mais 66 casas. Portanto, até final deste ano teremos reabilitado cerca de 130 casas. Continuamos a executar o nosso programa municipal “Jedá konpô bô kasa” e a meta é, até o final deste mandato, reabilitar 800 habitações em Porto Novo. Trata-se de um grande contributo, embora fiquem muito mais habitações para reabilitar. Devo dizer que além da reabilitação em si esse programa ajuda muito bem na dinamização da actividade económica local. As obras são executadas por empreiteiros com os quais contratualizamos e elas permitem empregar um número razoável de pessoas na construção civil e gerar assim alguma actividade económica para a localidade.

Ao que parece com o programa PRRA governar um município tornou-se agora mais fácil.

Não é nada fácil. Governar um município é uma tarefa honrosa e muito exigente. É verdade que temos agora uma grande parceria e uma relação de lealdade muito forte com o governo de Cabo Verde, o que não aconteceu com o anterior governo. Sou autarca e sei do que estou a falar. O actual governo relaciona-se de forma aberta e sincera com todas as câmaras municipais; isso é uma grande vantagem que nós temos, mas também as exigências são muito maiores. Governar um município requer muita entrega e dedicação. Nós temos uma grande equipa focalizada nos grandes objectivos do nosso município que é trabalhar para melhorar as condições de vida dos nossos munícipes. É melhor trabalhar com este governo que apoia as câmaras municipais, mas constitui sempre um desafio muito grande ser autarca em Cabo Verde por causa dos grandes desafios que temos pela frente e dos parcos recursos que nós temos, apesar de terem melhorado significativamente, não são ainda suficientes, pelo menos no caso de Porto Novo, face aos grandes desafios que temos para os nossos municípios.

No início do seu actual mandato disse que Porto Novo enfrentava problemas sociais preocupantes por causa do desemprego e da pobreza que abrangem 42 por cento da população. Houve evolução desses dados?

Temos que ter em conta o seguinte: estamos a ter três anos de governação municipal marcados, em 2016, pelos estragos causados pelas chuvas e 2017 e 2018 vividos sob o espectro das secas. Essas situações criaram problemas muito sérios, pois não houve produção de cereais; os criadores de gado também tiveram problemas com a escassez de água e pasto para os animais. Em boa hora o governo em parceria com as câmaras municipais executou um programa de cooperação e dois programas de mitigação da seca. E esses programas ajudaram não só a mitigar os efeitos da seca nestes dois últimos anos, como também criaram certa resiliência nas comunidades. Por exemplo, aqui no Porto Novo digno de realce é o facto de nós termos nos meios rurais um bom número de furos para prospecção de água e termos criado condições para disponibilizar parcelas agrícolas às comunidades rurais. Isso ajudou bastante, para além de termos recuperado algumas nascentes e reservatórios. Com essas obras contribuímos para a criação de alguma actividade económica geradora de rendimento no meio rural. Este é o efeito positivo dos programas de mitigação. Por outro lado, este programa contribuiu para criar mais de mil empregos públicos e de certa forma debelar os efeitos da seca. Falando no município no seu todo, como sabe temos um território muito grande e disperso e temos uma cidade já com dez mil habitantes, mas com uma actividade económica ainda incipiente. Entretanto, esta câmara municipal e o governo estão a trabalhar juntamente com as comunidades e com os privados. A forte aposta desta câmara municipal é no sector privado para a criação de actividade económica tanto na cidade como nas zonas do interior. Como disse atrás, no interior atribuímos parcelas agrícolas com furos e equipamentos para as pessoas se tornarem autónomas; na cidade temos feito um esforço grande no sentido de atrair alguns investimentos. Portanto, há esse grande desafio de termos ainda um município com um nível de actividade económica não satisfatório, e um nível de pobreza, mas os indicadores que nós temos, dizem-nos que as condições melhoraram de 2016 para 2018. Temos um quadro claramente melhorado em relação ao acesso à água, à saúde, à energia, à educação, etc. O desemprego passou para menos de dois dígitos em 2018 e vamos receber agora os dados de 2019 que são referentes a 2018 para comparar. Mas a situação está a melhorar, há mais ânimo nas pessoas, há mais confiança, há também projectos públicos e de privados que vão sendo implementados. De maneira que estamos a contribuir para, de facto, melhorarmos as condições de vida dos munícipes através da criação de mais emprego e rendimentos. Para além de outros programas sociais do governo, a criação de empregos públicos, projectos de infraestruturação que estão em curso.

Que balanço faz dos dez primeiros 10 dias de operação da Cabo Verde Inter-ilhas, a nova empresa concessionária do transporte marítimo de passageiros? O que melhorou, o que piorou na perspectiva do concelho do Porto Novo?

A interligação das ilhas via marítima é um grande objectivo conseguido e temos que reconhecer este mérito ao governo. Agora, há, de facto, neste momento algum constrangimento. Constrangimentos, sobretudo o maior, que do nosso ponto de vista até não tem razão de ser. Porquê? Porque o maior problema que temos neste momento é uma fila muito grande de pessoas que esperam muito tempo para adquirirem o seu bilhete de passagem. Isto não faz sentido e temos de trabalhar com os operadores para podermos agilizar esse processo. A nível de Santo Antão temos que dizer que tivemos sempre aqui nos últimos tempos três embarcações que faziam seis ligações diárias Porto Novo/São Vicente que era o maior tráfego marítimo que tínhamos no país. Agora ficamos com um único navio, porque o Armas está parado e o Liberdade está agora ao serviço da concessionária. Por mais que queiramos, temos que dizer que a nível de Santo Antão as condições não melhoraram e estamos a ser penalizados. Nós estávamos habituados a um serviço eficiente, rápido e de qualidade e queremos manter essa eficácia que neste momento, de certo modo, está em causa, sobretudo pelo tempo de espera para a emissão do bilhete de passagem. Se como dizem os armadores, não vamos ter aumento de custos dos transportes marítimos, há, entretanto, que corrigir as falhas que, creio, são operacionais neste momento. A nível da emissão dos bilhetes celeridade é o que se quer e o aumento de pelo menos mais uma embarcação na linha São Vicente/Porto Novo.

Portanto, Santo Antão não ganhou muito com o novo serviço?

De imediato não, sobretudo tendo em conta que estamos na época alta que é a época dos emigrantes e das férias. Então há muita gente a solicitar esses serviços e há, de facto, neste momento constrangimentos, não só na emissão dos bilhetes, o que não é normal, como também na diminuição de números de navios à disposição da ilha de Santo Antão.

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Texto originalmente publicado na edição impressa do expresso das ilhas nº 926 de 28 de Agosto de 2019. 

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Autoria:António Monteiro,31 ago 2019 6:33

Editado porSara Almeida  em  23 mai 2020 23:21

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