“O que aconteceu, em princípio, é um acidente e vamos aguardar pelo resultado das investigações. No fim poderemos pronunciar-nos melhor sobre esta questão”, declarou esta terça-feira o Director Nacional da Polícia Nacional, Emanuel Estaline, à imprensa no final de um Curso de Comando e Direcção Policial (CCDP), destinado a oficiais da Polícia Nacional.
Para o antigo director nacional da Polícia Nacional, João Santos, a morte de Hamilton Morais faz levantar duas questões. “Se foi ele o autor do disparo colocam-se duas questões essenciais de investigação: foi um tiro negligente ou foi intencional? Ele quis a morte do Hamilton ou ocorreu por imperícia por ter disparado e acertado no seu colega. Bom isso tudo a investigação tem de revelar para se saber se estamos perante um homicídio voluntário ou um homicídio simples”.
A demora na detenção do suspeito é, para João Santos, reveladora de alguma “fragilidade investigatória da Polícia”.
“O facto de terem apresentado, agora, com indícios mais fortes de ter sido este agente, como sendo o autor do disparo que levou à morte do colega, revela que, muito à posteriori, vieram a recolher dados, mais sólidos, que podem levar a uma condenação desse agente”, acrescenta.
Aliás, para João Santos é necessário que a investigação revele se a operação que levou à morte de Hamilton Morais, no final de Outubro, foi realmente acidental ou se “foi ficcionada para atingir um determinado objectivo. Porque o que se pode estar a congeminar é se a instituição policial não estará a ser alvo de uma infiltração de agentes do crime. Isso não é uma coisa que não possa acontecer. Acontece noutras paragens. O espaço é favorecido para os criminosos e é natural que essa linha investigatória possa também fazer sentido”.
Sendo cedo para que “nos pronunciemos num ou noutro sentido”, João Santos defende que “não se pode considerar de somenos importância essa hipótese [de morte não acidental]. O que, a verificar-se, pressupõe que levará a uma investigação mais séria para se saber o que se estará a passar”.
O governo está, como defende este antigo responsável da Polícia Nacional, “perante uma situação que exige os maiores cuidados. A primeira atitude será a de poder explicar que a instituição, não obstante estes acontecimentos, é uma instituição que continua a ser confiável e por outro tem de fazer todo o trabalho no sentido de eliminar o inimigo”.
Quanto à possibilidade de realmente existirem criminosos no seio da Polícia Nacional, João Santos defende que essa é uma possibilidade real no sentido que “nós sabemos que as grandes organizações criminosas existem, também no nosso país e dessas questões não falamos”.
Para Emanuel Estaline Moreno, a morte de Hamilton Morais é um caso “triste”, mas que, no entanto, não mancha a cooperação policial.
Entretanto, informou que vão aguardar, com “serenidade”, que se conclua o processo, que já está sob a alçada do poder judicial.
“Isto de qualquer maneira é uma situação grave, mas não colocará em causa o nosso desempenho, porque a polícia nacional terá de estar sempre disponível e de prontidão para fazer face a qualquer situação a nível nacional”, assegurou.
Mas, segundo várias fontes, já há algum tempo que, no seio da Polícia Nacional circulava “em surdina que tinha sido um agente da própria Polícia Nacional a fazer o disparo”.
Uma versão com que João Santos concorda. “O estranho disto é que já se sabia internamente que o disparo tinha partido de um colega”, aponta acrescentando que “o que é criticável e absolutamente condenável é que a polícia optou por apresentar um alegado autor do disparo, porque já circulava dentro da instituição quem teria sido o autor do disparo”.
Prisão Preventiva
O Tribunal da Comarca da Praia decretou no passado dia 23 de Novembro prisão preventiva como medida de coacção ao agente da Polícia Nacional Eliseu Sousa suspeito de ter assassinado o colega Hamilton Morais, em Outubro último, no bairro de Tira Chapéu, na cidade da Praia.
Segundo informações policiais, o agente em causa, de 37 anos, que foi detido em cumprimento de um mandato de detenção do Ministério Público no dia 22, foi ouvido no mesmo dia, pelo juiz que lhe decretou prisão preventiva.
Contactada pelo Expresso das Ilhas, a Polícia Judiciária esclareceu que o agente da Polícia Nacional, detido pela suspeita da morte de Hamilton Morais, está acusado dos crimes de homicídio simples e disparo de arma de fogo.
Recorde-se que por volta das 00:15 do dia 29 de Outubro, uma terça-feira, o Serviço de Piquete foi chamado, através do Centro de Comando, para intervir junto de dois indivíduos que se encontravam armados e em situação muito suspeita na zona de Tira Chapéu, na Praia.
“No local, ao aperceberem-se da presença policial, os suspeitos puseram-se em fuga e, imediatamente, foram perseguidos, resultando dali disparo de armas de fogo, que terá atingido o agente de primeira classe Hamilton Morais, que foi socorrido imediatamente pelos colegas e transportado para o Hospital Agostinho Neto, onde viria a falecer, momentos depois, referiu na altura a PN em comunicado.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 939 de 27 de Novembro de 2019.