João Carlos Martins da Cruz. Tinha 14, vivia nos EUA e estava de férias na ilha Brava, sua ilha natal. No dia 31 de Julho, pelas 15h, deu entrada no centro de saúde da Brava. De acordo com as autoridades de saúde, estava doente há cinco dias e tinha sido automedicado em casa para dor de garganta e febre. O seu quadro clínico afinal era bem mais grave. Exames laboratoriais revelaram anemia grave. A evacuação foi decidida.
Os procedimentos para a evacuação começaram “com máxima urgência”. De imediato, garante a direcção sanitária regional do Fogo e Brava. O pai do adolescente, porém, em entrevista à TCV, acusa a delegacia de saúde da Brava de falta de agilidade no processo e considera que a evacuação foi deficitária. Essas deficiências, considera, terão contribuído para a morte do adolescente.
A Brava, referem por seu turno o edil e delegado de Saúde costuma ter, por norma, um barco da CV Interilhas que pernoita na ilha. Contudo, com a avaria de três dos navios da empresa, não se encontrava aí. A solução foi recorrer a um bote de pesca. A precária embarcação avariou a meio do caminho atrasando, ainda mais, a chegada ao hospital Regional.
Durante a viagem, Djony, como era conhecido, foi acompanhado por um médico e um enfermeiro. Chegou ao hospital por volta da meia noite de dia 1 de Agosto e faleceu cerca de 22 minutos depois.
O pai, na referida entrevista, critica também o facto de à chegada ao Fogo ter sido transportado não em uma ambulância, mas numa hiace. Todas as falhas à assistência terão sido factores em conta no óbito. Talvez uma transfusão célere pudesse ditar outro desfecho…
Visão diferente tem o delegado de saúde da Brava. “O paciente acabou por falecer não por causa da embarcação que teve problemas. O mesmo até chegou com vida do Hospital Regional do Fogo”, disse à Inforpress o médico Hélder Pires.
No sábado, o ministério da Saúde revelou que os exames hematológicos do Hospital Agostinho Neto confirmavam as suspeitas e a gravidade clínica: o adolescente apresentava um quadro de leucemia aguda e esta foi a causa da sua morte.
Inquérito
O caso de Djony veio pôr em destaque, mais uma vez, a precariedade e deficiências na evacuação de doentes e provocou acesas críticas na sociedade cabo-verdiana. Para 16 de Agosto está inclusive agendada uma manifestação a ter lugar em Nova Sintra e na Praia exigindo mais saúde e transporte permanente para a Brava.
Na segunda-feira, 8, na sua página de Facebook, o Presidente da República, José Maria Neves, apelou à realização de um “inquérito rigoroso” sobre as circunstâncias da evacuação e da morte do adolescente e exortou à tomada de medidas urgentes para “se criar um verdadeiro sistema de evacuação médica no país”. No seu post o Chefe de Estado defende ainda que se deve “auditar o atendimento em todo o sistema nacional de saúde”, face às muitas queixas, “justas ou injustas, de pessoas que se consideram mal atendidas e/ou mal tratadas nos serviços de saúde”.
No mesmo dia, horas mais tarde o Primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva anunciou, na mesma rede social, que o governo vai instaurar um “rigoroso inquérito”, de imediato, sobre as circunstâncias do falecimento, tanto no que toca aos serviços médico-hospitalares prestados, como aos procedimentos adoptados na evacuação.
A equipa de inquérito será constituída por duas médicas e pela gestora do Fundo de Segurança Marítima.
O relatório será apresentado ao Primeiro-ministro-Ministro até ao dia 31 de Agosto.
*com Agências
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1080 de 10 de Agosto de 2022.