Segundo os dados da Polícia Nacional (PN) divulgados na passada terça-feira, 11, em 2022, houve 20.524 ocorrências criminais no país, representando uma redução acumulada de 11% no volume de crimes anualmente registados na última década. Em comparação com 2023, o país teve uma diminuição de 10,1% das participações criminais, com menos 2.314 ocorrências.
No entanto, em declaração ao programa Café Central, da Rádio Pública, o especialista em segurança, José Rebelo, afirmou que essa diminuição não se reflecte nos registos do Ministério Público, que apontam um aumento dos crimes denunciados, atingindo 32.200 em 2024.
“A criminalidade não diminuiu. O que houve foi uma redução das ocorrências registadas pela PN. E se o Ministério Público regista mais crimes, é lógico que o número de queixas na PN deveria acompanhar essa tendência e não cair”, explicou.
José Rebelo apontou ainda práticas que podem estar a contribuir para o número reduzido de queixas.
“Muitas pessoas vão apresentar uma ocorrência e recebem respostas como: ‘O sistema está em baixo’, ‘A pessoa responsável não está’, ‘Volte amanhã’ ou ‘Estamos à espera do despacho do Ministério Público para investigar’. Isso gera frustração e faz com que muitos desistam de formalizar as denúncias”, analisou.
Nas suas declarações, o especialista reforçou que a confiança nas instituições também tem diminuído, o que pode inibir as denúncias.
“A perceção de corrupção na Polícia Nacional e no Ministério Público tem impacto directo na participação cidadã na justiça. Muitos deixam de acreditar na eficácia das instituições, e isso leva à inibição de denúncias e à justiça pelas próprias mãos”, alertou.
Para combater a criminalidade de forma eficaz, José Rebelo sugere que os dados sejam analisados de forma cruzada e objectiva.
“Caso contrário, estaremos a tomar decisões com base em diagnósticos errados e a propor soluções ineficazes”, argumentou.
“Estamos tranquilos com esses dados” – MAI
Na sessão plenária do passado dia 13, durante o período de perguntas dos deputados ao Governo, o ministro da Administração Interna, Paulo Rocha, assegurou que a descida dos números reflecte uma evolução positiva e sustentada do combate ao crime no país.
“Os dados divulgados estes dias pela Polícia Nacional demonstram um registo importante de redução do nível da criminalidade, que se traduz não só na diminuição na ordem dos 10,1% do número total das ocorrências, mas sobretudo no facto de se ter registado uma diminuição de ocorrências em 17 dos 22 municípios”, afirmou.
Entre os municípios que registaram quedas, o governante mencionou a Praia, com uma redução de 8%, São Vicente 13,4%, Santa Catarina, São Miguel e Porto Novo, que registaram descidas superiores a 24%.
O ministro referiu ainda a diminuição dos homicídios voluntários consumados, com menos oito ocorrências em 2024 em comparação com 2023.
Crimes como ofensas à integridade física, ameaças, violência baseada no género (VBG), roubos e furtos também registaram decréscimos.
Entretanto, reconheceu que os desafios persistem, especialmente no que diz respeito à delinquência juvenil.
Em relação à subnotificação de crimes, Paulo Rocha minimizou as preocupações, argumentando que os homicídios, por serem crimes públicos, estão sempre sob acção das autoridades.
“Estamos tranquilos relativamente aos dados. É normal que uma pessoa ou outra possa não apresentar queixa. Tratando-se de homicídios, nem há que se falar em queixa, pois as autoridades agem independentemente de haver ou não haver denúncia”, esclareceu.
O ministro comparou ainda a atual taxa de homicídios por 100 mil habitantes, que se situa nos 6,1, com a registada em 2015, que era de 9,4.
“Estamos a falar de uma redução significativa ao longo de dez anos”, apontou.
“Precisamos ainda garantir uma sustentada redução das ocorrências criminais, e esse é o nosso foco, com ações, sobretudo, de prevenção criminal”, sustentou.
De referir que o Expresso das Ilhas tentou obter uma reação da PN sobre as declarações de José Rebelo, mas até ao fecho desta edição não obteve respostas.
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Em 2024, a redução da criminalidade foi generalizada em todas as ilhas, excepto no Sal. Relativamente às tipologias criminais, tanto os crimes contra pessoas quanto os crimes contra o património apresentaram redução.
Houve 9.180 crimes contra pessoas, uma queda de 8,21%, sendo que houve uma redução de 7,5% nas ofensas à integridade física, 11,2% nos casos de Violência Baseada no Género (VBG) e 14,8% nas agressões sexuais.
Os homicídios voluntários consumados caíram 20,5%, com menos oito mortes em comparação com 2023. Já os crimes contra o património diminuíram 11,63%, totalizando 11.344 ocorrências, sendo que furtos e roubos caíram 13,4% e 12,5%, respectivamente. O índice de homicídios voluntários consumados por 100 mil habitantes foi de 6,1 em 2024, uma redução de 35% face a 2015, segundo a PN.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1216 de 19 de Março de 2025.