Num dia Cabo Verde tinha 12 ministros, no dia seguinte passou a ter 14 ministros e mais seis secretários de estado. O anúncio foi feito há uma semana, pelo Primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, após reunião com o Presidente da República e a tomada de posse dos novos membros está agendada para 5 de Janeiro.
Alexandre Monteiro e Júlio Herbert são os novos ministros que vão integrar a nova orgânica do governo, o primeiro assume a pasta da Indústria, Comércio e Energia, Júlio Herbert assume o cargo de ministro-adjunto do Primeiro-Ministro para a Integração Regional. Olavo Correia, ministro das Finanças passa a acumular a pasta com a da de Vice-primeiro ministro e Fernando Elísio Freire passa a ser Ministro de Estado, da Presidência do Conselho de Ministro e dos Assuntos Parlamentares, continuando também no cargo de Ministro do Desporto.
A nova orgânica do governo contempla ainda a entrada de seis secretários de Estado Adjuntos. Gilberto de Barros vai reforçar a equipa de Olavo Correia como secretário de Estado Adjunto das Finanças. Também para apoiar Olavo Correia, mas enquanto vice-primeiro ministro, entram na equipa governamental Edna Oliveira, como secretária de Estado Adjunta para a Modernização Administrativa, e Pedro Lopes, como secretário de Estado Adjunto para a Inovação e Formação profissional.
O deputado nacional Paulo Lima Veiga vai ser empossado como secretário de Estado Adjunto para a Economia Marítima, Carlos do Canto Monteiro será secretário de Estado Adjunto do Ministro de Estado e Amadeu da Cruz vai reforçar a equipa da Ministra da Educação como secretário de Estado Adjunto da Educação.
Os objectivos desta nova remodelação são, de acordo como o Governo: reforçar a coordenação económica; reforçar a coordenação política e melhorar a eficiência e eficácia governativa. Este reforço do governo tem um impacto financeiro previsto de 32 mil contos.
Uns dias antes o país tinha acordado em choque com a perda da presidência da Comissão da CEDEAO para a Costa do Marfim. Cabo Verde tinha manifestado a intenção de assumir a presidência rotativa da Comissão da CEDEAO, mas, apesar de estatutariamente ser a sua vez, o facto de o país ter dívidas à organização terá pesado na decisão.
Do arquipélago, quatro candidatos tinham manifestado interesse em presidir a Comissão da CEDEAO: Isaías Barreto, que ocupa a função de comissário da CEDEAO na área das Telecomunicações e Tecnologias de Informação desde 2014, Orlando Dias, que é um dos vice-presidentes do Parlamento da CEDEAO desde 2016, o professor universitário nos Estados Unidos Júlio Carvalho, e o consultor jurídico António Andrade Lopes Tavares.
Os dias que se seguiram ao anúncio saído da cimeira de chefes de Estado da organização, que decorreu em Abuja, Nigéria, foram de apontar dedos, críticas e sacudidelas de água do capote. Isaías Barreto, por exemplo, reprovou a forma como o governo geriu o processo da candidatura do país. Numa publicação na rede social Facebook, o actual comissário da CEDEAO sublinhou que é fundamental a preparação atempada deste tipo de processos. “Se procrastinarmos exacerbada-mente a elaboração de uma estratégia e a definição clara de um plano de acção, as coisas podem não correr bem”, escreveu. Já o presidente da UCID considerou a derrota de Cabo Verde uma vergonha e uma humilhação. Para António Monteiro, o país não fez o trabalho de casa antes de iniciar a corrida para a presidência da comissão da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental.
As redes sociais foram o meio também usado pelo antigo Primeiro-ministro José Maria Neves para passar a sua mensagem. “Infelizmente, Cabo Verde não conseguiu a Presidência da CEDEAO. É uma pena. Seria muito importante para o país, do ponto de vista político-diplomático e do ponto de vista da nossa inserção competitiva na região oeste-africana”.
Já o actual Primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, disse que “as condições estavam criadas e a diplomacia funcionou, mas outros argumentos sobrepuseram-se” na escolha do presidente da Comissão da CEDEAO. “Efectivamente, Cabo Verde tem uma dívida que soma cerca de 25 milhões de euros que já vem de há mais de 14 anos, mas nós apresentámos uma proposta que foi aceite”, disse o Chefe do Governo, para quem “arranjos políticos sobrepuseram-se e foram tidos em conta, impedindo que Cabo Verde pudesse aceder a esse cargo de relevo na CEDEAO”
Para a líder do maior partido da oposição, o PAICV, faltou “um tratamento com sentido de Estado” à candidatura de Cabo Verde. Janira Hopffer Almada criticou ainda a falta de envolvimento e mobilização das “forças vivas da Nação”, na preparação da candidatura. “Não se investiu na envolvência de todos – incluindo antigos presidentes da república, antigos primeiros-ministros e antigos ministros de Negócios Estrangeiros – para criar uma corrente única de defesa dos interesses do país, na sua máxima força e aproveitando todas as capacidades, a todos os níveis”.
O Presidente da República de Cabo Verde, Jorge Carlos Fonseca, e o ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Filipe Tavares, repudiaram a forma como a eleição decorreu e atribuíram a derrota do país a “arranjos políticos”. Aliás, segundo o ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Filipe Tavares, foi “uma derrota para a CEDEAO, não para a diplomacia cabo-verdiana nem para Cabo Verde”. Durante a reunião, em Abuja, o Presidente da República de Cabo Verde, Jorge Carlos Fonseca, fez seis intervenções, defendendo o direito do país a assumir a liderança da comunidade em respeito pela ordem alfabética instituída na organização. Com a Costa do Marfim a ser escolhida para assumir a presidência, o Chefe de Estado cabo-verdiano mostrou “o seu repúdio pela forma como a questão foi tratada e considerou inaceitável o não cumprimento de regras estabelecidas”, solicitando o registo da sua posição na acta final da Cimeira.
2017 marca também o fechar de portas do Millennium Challenge Corporation, doze anos, 176 milhões de dólares e dois compactos depois. A agência norte-americana de desenvolvimento termina a sua missão no arquipélago e dá uma nota muito positiva aos resultados alcançados, como disse em entrevista conjunta e exclusiva ao Expresso das Ilhas e Rádio Morabeza, Robert Blau, vice-presidente do MCC. “Estou satisfeito. É a primeira vez que vejo um país que termina não só um compacto, mas sim dois compactos consecutivos. É muito óbvio que os dois compactos tiveram efeitos positivos para as ilhas de Cabo Verde”.
Este segundo compacto esteve baseado em dois grandes projectos, Land e Wash, este último respondeu a algumas necessidades que Cabo Verde ainda tinha em matéria de água e saneamento, enquanto o primeiro foi fundamental para resolver problemas ao nível da gestão do território.
Ainda este ano, Cabo Verde caiu no Índice Ibrahim de Governação Africana 2017, passando para a quarta posição e o Expresso das Ilhas analisou o facto durante uma entrevista com o ex-Presidente da República, Pedro Pires. O Prémio Ibrahim para a Excelência na Liderança Africana de 2011 teceu considerações sobre os indicadores em que Cabo Verde desacelerou nos últimos cinco anos e apelou à humildade e realismo na interpretação desses dados. “O fundamental é que os líderes do país olhem para os números e tirem as suas conclusões”, recomendou.
“Cabo Verde aparece desta vez na quarta posição. Já esteve no segundo lugar, passou para o terceiro e agora está no quarto. Qual a minha leitura disso? O mais importante é que devemos ter em conta que os outros países podem fazer melhor do que nós e que nesta matéria os outros estão evoluindo, estão crescendo, estão mudando e pode ser que até façam melhor do que nós. Portanto, desse lado não deve haver nenhum tipo de admiração ou de qualquer outro sentimento”, sublinhou o antigo Chefe de Estado.
Em Setembro, chegou ao arquipélago a nova embaixadora da União Europeia em Cabo Verde, Sofia Moreira de Sousa, que apontou a parceria para a mobilidade como um “elemento importante” que pretende trabalhar “de forma intensa” com as entidades cabo-verdianas nesta missão.
A nova representante da UE, que se comprometeu também a continuar a consolidar a parceria existente entre a União Europeia e Cabo Verde, avançou que nesta missão tem, ainda, como prioridade de trabalho apoiar o desenvolvimento socioeconómico, o crescimento e a criação de novos postos de trabalho no arquipélago.
A nova embaixadora da União Europeia em Cabo Verde, Sofia Moreira de Sousa, substitui nas funções o diplomata José Manuel Pinto Teixeira, que liderava a delegação em Cabo Verde desde 2012.
No mesmo mês, foi conhecida a solução para a regionalização apresentada pelo MpD: nove ilhas e dez regiões. A ideia é a mesma que o MpD e o seu presidente, Ulisses Correia e Silva, sempre defenderam. A Regionalização deverá levar à criação de uma dezena de regiões administrativas, uma por cada ilha, sendo que Santiago será dividida em duas – Norte e Sul.
Segundo o documento, é atribuição da região tudo o que respeite à administração dos interesses específicos e comuns da população residente no seu território e não seja atribuído por lei ao município ou expressamente à Administração Central. Temas como o planeamento do desenvolvimento económico e social regional e participação obrigatória no planeamento nacional ou a promoção e apoio da actividade económica, do empreendedorismo e da economia social solidária na região, serão parte das funções das regiões administrativas.
2017 foi também o ano dos recados para a administração pública, mensagens que foram passadas diversas vezes, principalmente pelo ministro das Finanças. Olavo Correia chegou a afirmar que a máquina pública não pode ser um veículo para queimar tempo e ainda assim ser remunerado. “Cabo Verde, desde a sua independência, formatou uma administração pública virada para a gestão da dívida, do endividamento e da ajuda pública, para a reciclagem das remessas dos emigrantes e para a atracção passiva do investimento e investidor externo. Este modelo de negócio, se assim podemos caracterizá-lo, está completamente esgotado. Essa fonte de crescimento já deu o que tinha para dar, portanto, precisamos de entrar num quadro novo e de ruptura em relação ao passado”.
E este foi ainda o ano da primeira visita oficial do Presidente da República de Portugal a Cabo Verde, que trouxe na bagagem o estreitar das relações entre os dois países. Diplomacia e afectos, mobilidade e investimento, cooperação e desenvolvimento, vínculos presentes e futuros, foram temas recorrentes nas intervenções do Chefe de Estado português durante a estadia que o levou às ilhas de Santiago, Fogo e São Vicente.
“Os governantes passam, os presidentes passam, os parlamentos passam, os governos passam, mas não passam as relações entre os povos. E os povos não são realidades inorgânicas, são um conjunto de pessoas de carne e osso e foi disso que falámos e é disso que se trata esta visita e todas as visitas que temos feito reciprocamente, é tudo fazer para contribuir para que tudo seja melhor para a vida dos cabo-verdianos e portugueses, povos irmãos que querem construir um futuro de paz, desenvolvimento e justiça”.
A comunidade cabo-verdiana em Portugal foi reconhecida como parte fundamental da construção do país, por Marcelo Rebelo de Sousa, “como temos a noção que a comunidade portuguesa em Cabo Verde é uma componente fundamental da construção deste país”. As certezas deixadas pelo Chefe de Estado português foram que Cabo Verde pode contar com Portugal na relação bilateral, na língua, na educação, na cultura, no investimento, como pode na ciência, na tecnologia, na segurança, no apoio ao sucesso da cimeira da CPLP (que vai decorrer em Cabo Verde no próximo ano), na renovação da parceria entre Cabo Verde e a União Europeia, no relacionamento ao nível das Nações Unidas e no relacionamento crescente com o mundo ibero-americano.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 839 de 27 de Dezembro de 2017.