Cabo Verde deve apostar no desenvolvimento do turismo de iates, mas deve igualmente apostar no desenvolvimento de infraestruturas públicas de apoio por forma a tornar-se atractivo para clientes com maior capacidade financeira.
As conclusões estão presentes num estudo do Banco Mundial (BM) a que o Expresso das Ilhas teve acesso.
O documento lembra que no passado, Cabo Verde registou consistentemente chegadas de iates. No entanto, refere o documento, “quando olhamos para destinos com uma taxa de crescimento anual composta (CAGR), torna-se evidente que existe uma oportunidade para Cabo Verde alcançar um crescimento semelhante. Isto pode ser conseguido através de marketing estratégico, ajustes políticos e investimentos em infra-estruturas”.
Os dados históricos, consultados pelo BM e que foram incluídos no estudo, mostram que o crescimento nas chegadas de iates tem sido relativamente estável, “cerca de 15 por cento CAGR” desde 2016 e que, em 2022, o último ano para o qual existem dados, o número total de veleiros que permaneceram pelo menos 24 horas em Cabo Verde foi de 447, dos quais cerca de 300 atravessaram o Atlântico.
O documento, consultado pelo Expresso das Ilhas, aponta que as ilhas do Sal, São Vicente e Santiago são as que melhores condições reúnem para o desenvolvimento deste sector turístico.
Sal
Segundo o relatório do BM, na ilha do Sal, Santa Maria “é um local promissor para o turismo náutico, mas necessita de melhores infra-estruturas de marinas, enquanto o Porto de Palmeira tem limitações”.
“Santa Maria emergiu como um centro turístico primordial, com as suas praias e um conjunto de serviços adaptados aos visitantes”, refere o documento.
A transformação da localidade “num epicentro do turismo de luxo, demonstrada pela presença de hotéis de prestígio, é reveladora do seu potencial”.
Além disso, a proximidade de Santa Maria de pontos nevrálgicos como o Aeroporto Internacional “sublinha a sua importância estratégica”.
No entanto, o estudo defende que há a necessidade de melhorar as infra-estruturas para alcançar o objectivo de capitalizar ainda mais o turismo de iates. “As actuais instalações de ancoragem, embora funcionais, continuam a ser rudimentares, enfatizando a necessidade de marinas bem equipadas”, destaca o BM.
São Vicente
O documento do BM aponta São Vicente como “o centro mais avançado para o turismo de iates”, com espaço para expansão e actualizações de infra-estruturas para atrair mais embarcações e exigindo melhorias fundamentais para um destino de iates mais apelativo.
São Vicente, acrescenta o relatório possui “infra-estruturas para acolher estas embarcações de luxo, embora haja espaço para melhorias em alguns sectores. A marina do Mindelo está a registar um elevado crescimento, mas existe potencial para uma maior expansão e para a modernização das infra-estruturas, de modo a receber ainda mais embarcações, bem como para melhorar os serviços e as comodidades perto da Marina, a fim de incentivar uma maior duração da estadia destas embarcações”.
No lado das limitações, o BM destaca que o Porto Grande “tem sobretudo objectivos comerciais” e embora possa acolher grandes iates a pedido da Marina do Mindelo, a estadia “está limitada a apenas 24 horas”.
Na ilha há potencial para aumentar o número de chegadas de embarcações e capacidade para o fazer durante todo o ano. “No entanto, os serviços locais, as comodidades (passeios e experiências) e a falta de actividades recreativas em terra apresentam desafios para os turistas de iates desenvolverem um itinerário”, refere o estudo que ainda recomenda a realização de melhorias nas infraestruturas como a construção de um quebra-mar e de um TravelLift”, que tornariam Mindelo num destino mais atractivo para iates.
Santiago
Em Santiago, o Banco Mundial aponta dois locais que reúnem as condições ideais para o desenvolvimento do iatismo: Praia e Tarrafal.
“O Tarrafal apresenta potencial turístico, mas necessita de uma avaliação das infra-estruturas para a construção de uma marina; por seu lado, a Praia está bem equipada para as frotas de iates de luxo, mas necessita de mais incentivos para o sector dos serviços e de equipamentos destinados a pessoas de elevado valor”, refere o documento.
O BM destaca que o Tarrafal “tem uma bela praia, vários hotéis de qualidade variável (com um que se destaca como particularmente impressionante). A introdução de uma marina, juntamente com iniciativas de sensibilização da comunidade e formação, poderia impulsionar as suas perspectivas turísticas já promissoras”. No entanto, o BM defende que deve ser feita uma avaliação da capacidade de carga do destino para avaliar se é plausível receber iates ou construir uma marina forte e funcional.
Em alternativa, a Praia está “equipada para acolher frotas de iates de luxo”.
Esta prontidão, diz o Banco Mundial, não vem apenas daqueles que atracam nas suas águas, mas também dos navios que fazem uma pausa antes de rumarem às Caraíbas. O porto é um destino ideal para estas embarcações, oferecendo todas as facilidades essenciais para reabastecimento, reparações e ancoragem. “Para além disso, a cidade alberga um aeroporto internacional que recebe voos das principais cidades europeias”, acrescenta.
No entanto, a falta de equipamentos, de infra-estruturas hoteleiras de luxo ou de uma indústria de serviços constituem obstáculos ao desenvolvimento da Praia como destino turístico de iates. “Actualmente, existe um número limitado de restaurantes, hotéis e centros de entretenimento na Praia que apelariam a um grupo demográfico de elevado valor líquido”, refere o estudo.
Cenários
No documento consultado pelo Expresso das Ilhas, o Banco Mundial desenvolve três cenários diferentes para o desenvolvimento do turismo de iates em Cabo Verde e que poderão conduzir “a um retorno económico significativo para o país”.
No primeiro cenário aborda-se o desenvolvimento de infraestruturas a partir de uma marina existente, a Marina Mindelo, “bem como a implementação de todas as recomendações de políticas e programas a nível nacional descritas neste relatório”.
O estudo defende que, com este cenário, Cabo Verde poderá conseguir uma receita de 62 milhões de dólares por ano. Um valor que, aponta o Banco Mundial, “crescerá ano após ano à medida que o número de embarcações que entram no país aumenta” e cuja implementação terá um custo total entre os 22 e os 25 milhões de dólares.
O segundo cenário envolve o desenvolvimento de infra-estruturas tanto no Mindelo como no Sal, bem como a implementação de todas as recomendações de políticas e programas a nível nacional.
“A receita estimada para este cenário é de 135 milhões de dólares por ano (que crescerá ano após ano à medida que o número de navios que entram no país aumenta), com um custo total de 35-40 milhões de dólares para todas as recomendações”.
O último cenário já envolve o desenvolvimento de infraestruturas no Mindelo, Sal e Santiago, bem como a implementação de todas as recomendações de políticas e programas a nível nacional. “A receita estimada para este cenário é de 146 milhões de dólares por ano (que crescerá ano após ano à medida que o número de navios que entram no país aumenta), com um custo total de 55-60 milhões de dólares para todas as recomendações”.
Concorrentes
O Banco Mundial, no relatório, identifica as Canárias, Granada e a Croácia como sendo exemplos de concorrentes no que respeita ao mercado turístico dos iates.
As “Canárias, devido à proximidade a Cabo Verde e à maturidade do seu mercado de turismo de iates; Granada, devido à sua presença na rota da Europa para as Caraíbas para navios em trânsito; e Croácia, porque poderia ser um exercício útil olhar para este mercado para obter lições valiosas sobre o desenvolvimento de iates”.
O documento defende que Cabo Verde pode retirar valiosos conhecimentos e lições das experiências e realizações destes países em algumas categorias-chave para melhorar a sua própria procura e sector de turismo de iates.
Pegando nestes exemplos, o Banco Mundial aponta as Canárias e a Croácia como sendo exemplos a seguir por Cabo Verde no que respeita ao desenvolvimento de infraestruturas.
“As Canárias e a Croácia expandiram as suas infra-estruturas de iatismo, com numerosas marinas e portos, facilitando a atracagem dos iates e o acesso a serviços essenciais. Cabo Verde deve concentrar-se no desenvolvimento e expansão das suas instalações de marinas em áreas específicas para acomodar mais embarcações, fornecendo serviços como reabastecimento, água e electricidade”.
Quanto a procedimentos aduaneiros e de entrada o BM explica que as Canárias simplificaram os procedimentos alfandegários o que facilitou a entrada e saída de iates da região. “Cabo Verde tem a oportunidade de simplificar os seus processos de entrada e desalfandegamento, digitalizar os seus procedimentos de entrada, reduzir as elevadas taxas de entrada e as normas de registo inconsistentes, que podem ser dissuasoras para os turistas de iates”.
Já no que respeita ao quadro jurídico e regulamentação do sector, “tal como a Croácia, Cabo Verde deve estabelecer um quadro abrangente e claro tanto para as operações de fretamento, entrada e registo de embarcações de uso privado” algo que ajudaria a garantir “a segurança, a protecção e a sustentabilidade das actividades marítimas, bem como a proporcionar clareza aos operadores de iates”.
A nível de marketing e promoção, a campanha “Pure Grenada” organizada por aquele país das Caraíbas e as campanhas de marketing do destino Croácia, incluíram a participação nas principais feiras internacionais de iates e a publicação nas principais revistas de iates e “têm sido bem-sucedidas na promoção das suas regiões como destinos de iates”.
“Cabo Verde deve investir em estratégias de marketing eficazes para aumentar a sensibilização sobre as suas oportunidades e atracções de iatismo”, defende o documento.
Quanto a impostos e incentivos, o Banco Mundial aponta o exemplo de Granada onde as “isenções fiscais e as reduções de direitos aduaneiros de Granada atraíram o turismo, incluindo o turismo de iates”. Dessa forma, o BM defende que Cabo Verde deverá “considerar incentivos semelhantes para tornar o seu destino mais atractivo para os proprietários e operadores de iates”.
Finalmente, no que respeita a infraestruturas para a manutenção de iates: “As reduções de impostos da Croácia para os proprietários de barcos e os incentivos para dormidas em embarcações de turismo náutico impulsionaram o sector. Cabo Verde pode explorar medidas semelhantes para atrair os proprietários de iates e incentivá-los a utilizar os serviços locais para manutenção e reparações”.
Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 1177 de 19 de Junho de 2024.